Página 2111 da Judicial - 1ª Instância - Capital do Diário de Justiça do Estado de São Paulo (DJSP) de 16 de Abril de 2014

ordinária de obrigação de fazer, com pedido de antecipação de tutela, contra o MUNICÍPIO DE SÃO PAULO visando à matrícula em unidade de ensino infantil (creche). Alegou previsão constitucional, como fundamento, e a relevância do ensino infantil no processo de aprendizagem, em local próximo da residência. A tutela antecipada foi concedida. A Municipalidade foi citada e apresentou contestação, na qual sustentou a improcedência do pedido. Manifestou-se o representante do Ministério Público pela procedência da ação. D E C I D O. Trata-se de hipótese de julgamento antecipado da lide, pois a matéria de fato encontrase fartamente documentada nos autos. No mérito, a procedência da demanda é de rigor. O direito à educação foi consagrado na Constituição Federal dentro da categoria dos Direitos Sociais (art. 6º), como direito público subjetivo de todo e qualquer cidadão, pois visa à formação do indivíduo enquanto membro participativo dentro da sociedade. O artigo 208 da Constituição Federal, ao especificar a forma de concretização do direito fundamental à educação, garante, de forma expressa, o atendimento em creche ou pré-escola a todas as crianças entre zero e cinco anos, in verbis: “O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de: IV atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a cinco anos de idade;” A educação infantil, como etapa inicial da educação básica, assegura o desenvolvimento da criança, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade, nos termos do artigo 29 da Lei 9394/96. Dada a relevância atribuída a tal direito, o legislador constituinte, soberanamente, estabeleceu a obrigação da prestação educacional de forma irrestrita e incondicionada, sem qualquer subordinação a juízos de conveniência ou oportunidade. O texto impõe ao Poder Público a obrigação de prestar o serviço de forma incondicional. Tal norma possui eficácia plena, pois o direito nela posto independe de regulamentações para ser exercido. A obrigação do Estado está objetivamente concretizada na Constituição Federal que, por um lado, assegura a todos, como direito social, o acesso à educação e, por outro, determina que ele se efetive, dentre outras maneiras, pela instituição de creches ou pré-escolas para os menores de cinco anos. Não há, portanto, que se falar em discricionariedade do administrador na realização desses preceitos. A obrigação que resulta da conjugação desses dois artigos constitucionais (6º e 208) é plenamente eficaz e não admite juízo de conveniência e/ou oportunidade. Ademais, frise-se que a própria Constituição Federal, em seu artigo 227, caput e o Estatuto da Criança e do Adolescente, no artigo , estabelecem a prioridade absoluta no atendimento das crianças e adolescentes. Assim, de um lado resta claro o direito público subjetivo dos menores de cinco anos de possuírem o acesso à creche e de outro lado está o dever do Município de prestá-lo, de forma irrestrita e incondicional. O próprio Supremo Tribunal Federal asseverou: “A educação infantil representa prerrogativa constitucional indisponível, que, deferida às crianças, a estas assegura, para efeito do seu desenvolvimento integral, e como primeira etapa do processo de educação básica, o atendimento em creche e o acesso à pré-escola (CF, art. 208, IV). Essa prerrogativa jurídica, em consequência, impõe ao Estado, por efeito de alta significação social de que se reveste a educação infantil, a obrigação constitucional de criar condições objetivas que possibilitem, de maneira concreta, em favor das ‘crianças de zero a seis anos de idade’(CF, art. 208, IV) o efetivo acesso e atendimento em creches e unidades de pré-escola, sob pena de configurar-se inaceitável omissão governamental, apta a frustrar, injustamente, por inércia, o integral adimplemento, pelo Poder Público, de pretensão estatal que lhe impôs o próprio texto da Constituição Federal” (RE 410715 AgR/SP 2 ª Turma, Rel. Min. Celso de Mello DJ 03.02.06). A Administração Pública deve pautar-se, sobretudo, pelo princípio da legalidade, uma vez que sua atuação encontra sempre determinação e fundamento nas espécies legislativas. Em regra, o administrador público não goza de qualquer liberdade para escolher ou determinar suas condutas. Nesse sentido, a discricionariedade, segundo Celso Antônio Bandeira de Mello, permite ao administrador “eleger, segundo critérios consistentes de razoabilidade, um, dentre dois comportamentos cabíveis, perante cada caso concreto”. No caso, existe apenas a obrigação constitucional de prestar a educação na forma estabelecida pelo constituinte. Não resta possibilidade de escolha ao Município, que deve dar cumprimento às normas e preceitos estabelecidos na Carta Magna. Apesar de se reconhecerem os enormes esforços do Município em atender a sempre crescente demanda por vagas em instituições de ensino infantil, não se pode concluir que este esforço seja suficiente para tornar legal a negativa de prestação de ensino para quem necessita. A justificativa de ausência de recursos, por si, não exclui a ilegalidade do ato, pois o exercício do direito subjetivo do impetrante não se sujeita a qualquer condição. Justifica-se, nesse mesmo sentido, a atuação do Poder Judiciário, sem que se configure ingerência entre os Poderes. A atividade jurisdicional apenas reconhece o direito fundamental à pré-escola e a ilegalidade na conduta do administrador ao não atendê-lo. A obrigação de fazer, consistente na determinação da matrícula em creche, decorre de tais fundamentos. Ingerência haveria se o Poder Judiciário atuasse na ausência de ilegalidade ou no exercício de funções típicas do Poder Executivo, o que não ocorre. A repercussão da decisão judicial na esfera financeira, ou seja, no orçamento do Município, não é suficiente para caracterizar ingerência. O próprio Superior Tribunal de Justiça, de forma pacífica, reconheceu que não há qualquer ingerência do Poder Judiciário na esfera administrativa, pois não se trata de atividade discricionária e sim vinculada, conferida pelo Poder Constituinte, de forma clara e cristalina, ao reconhecer o direito à educação a todas as crianças e com primazia de atendimento, como preceituado. A norma constitucional, cujos conceitos foram repetidos na legislação infraconstitucional (como no Estatuto da Criança e do Adolescente), não permite negar o direito à educação também aos menores de seis anos. Dentre os julgados recentes do STJ sobre o assunto, destaco: “A educação infantil representa prerrogativa constitucional indisponível, que, deferida às crianças, a estas assegura, para efeito de seu desenvolvimento integral, e como primeira etapa do processo de educação básica, o atendimento em creche e o acesso à pré-escola (CF, art. 208, IV). Essa prerrogativa jurídica, em conseqüência, impõe, ao Estado, por efeito da alta significação social de que se reveste a educação infantil, a obrigação constitucional de criar condições objetivas que possibilitem, de maneira concreta, em favor das ‘crianças de zero a seis anos de idade’ (CF, art. 208, IV), o efetivo acesso e atendimento em creches e unidades de pré-escola, sob pena de configurar-se inaceitável omissão governamental, apta a frustrar, injustamente, por inércia, o integral adimplemento, pelo Poder Público, de prestação estatal que lhe impôs o próprio texto da Constituição Federal. A educação infantil, por qualificar-se como direito fundamental de toda criança, não se expõe, em seu processo de concretização, a avaliações meramente discricionárias da Administração Pública, nem se subordina a razões de puro pragmatismo governamental. Os Municípios - que atuarão, prioritariamente, no ensino fundamental e na educação infantil (CF, art. 211, § 2º)- não poderão demitir-se do mandato constitucional, juridicamente vinculante, que lhes foi outorgado pelo art. 208, IV, da Lei Fundamental da República, e que representa fator de limitação da discricionariedade político-administrativa dos entes municipais, cujas opções, tratando-se do atendimento das crianças em creche (CF, art. 208, IV), não podem ser exercidas de modo a comprometer, com apoio em juízo de simples conveniência ou de mera oportunidade, a eficácia desse direito básico de índole social. Embora resida, primariamente, nos Poderes Legislativo e Executivo, a prerrogativa de formular e executar políticas públicas revela-se possível, no entanto, ao Poder Judiciário, determinar, ainda que em bases excepcionais, especialmente nas hipóteses de políticas públicas definidas pela própria Constituição, sejam estas implementadas pelos órgãos estatais inadimplentes, cuja omissão - por importar em descumprimento dos encargos políticojurídicos que sobre eles incidem em caráter mandatório - mostra-se apta a comprometer a eficácia e a integridade de direitos sociais e culturais impregnados de estatura constitucional. A questão pertinente à ‘reserva do possível’. (Resp 485969 / SP; Relator Ministro José Delgado; Primeira Seção; DJ 11.09.2006 p. 220). A possível alegação de que a decisão judicial determinando o cumprimento do direito inscrito na Constituição Federal feriria a isonomia, ao ocasionar um desrespeito à ordem

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