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3 de Maio de 2024

Política se debate!

Uma reflexão sobre os debates - e as discussões - que transcendem as questões políticas e abalam as relações pessoais.

há 10 anos

Em tempos de emoções afloradas devido ao segundo turno das eleições presidenciais, onde estão sendo instalados muitos conflitos, é comum ouvir na roda de amigos, nas redes sociais, nos grupos de Whatsapp, nos ambientes de trabalho e em tantos outros locais a velha máxima: “Política não se discute!”. A expressão é empregada para tentar acalmar os ânimos. Concordo - em partes - com a afirmação. E direi nestas breves linhas os meus porquês.

Enraizamos o verbo “discutir” como um sinônimo de “brigar”, ou seja, de um confronto verbal propriamente dito, onde a estratégia é tão somente desconstruir o que o (suposto) oponente tem a apresentar. Apesar de “discutir” ter um significado mais amplo, é este sentido que geralmente empregamos no uso comum da linguagem. Na discussão, sentido senso comum, não adianta: a ideia é fixa, e não há interesse das partes em adquirir pensamentos expostos pelo seu “opositor”. Há interesse apenas de desmoralizar a pessoa, ainda que suas ideias sejam boas e interessantes.

Mas o debate de ideias é diferente. E neste sentido, sim, digo que política se debate. E naquele debate de nível, dos bons. O debate, por sua vez, evidencia a disposição em confrontar ideias - e apenas no plano das ideias - não fazendo o debatedor a avaliação pessoal de com quem está debatendo. Confrontam-se as ideias, e não as pessoas. Debate-se o que cada um pensa, por exemplo, sobre economia, saúde, segurança, educação, meio ambiente e tantos outros temas. Abre-se espaço para uma construção de conhecimento.

Neste acalorado processo eleitoral, assistimos a um festival de discussões. Aparentemente, prefere-se levar para o lado pessoal questões que nos dizem respeito apenas enquanto cidadãos partes de um todo, de uma sociedade, e não como pessoas individualmente consideradas, com poder individual de mudança. Não adianta, por exemplo, brigar por posições distintas a respeito da crise internacional quando nenhum dos dois pode, por si só, resolvê-la. Adianta, sim, enriquecer o conhecimento levando à pauta um debate sobre os porquês da crise, ajudando na construção do conhecimento coletivo.

Voltando à corrida presidencial, de nítido temos apenas que as duas candidaturas apresentadas são distintas. Cada uma delas tem uma forma de enxergar o Brasil, de considerar os problemas existentes e de apontar soluções para o futuro. Qual delas está certa? Talvez as duas, talvez nenhuma, talvez apenas uma. O juízo quem faz é o eleitor, o que não significa que não possam ser debatidas as ideias de quem já fez sua escolha, desde que haja interesse. Erra-se muito, por exemplo, ao negar qualquer erro de sua candidatura. Negar estes erros seria admitir uma candidatura perfeita, o que não existe.

Reconhecer virtudes e abrir-se ao diálogo não significa enfraquecimento das ideias defendidas. Significa disposição intelectual para aprender mais, saber mais e, de repente, tomar os argumentos distintos dos seus como uma forma de defender ainda mais sua posição, elaborando um bom contra-argumento.

Além disso, não adianta pensarmos que todos os partidários da candidatura derrotada irão abandonar suas ideias. Não! Quem vota em Aécio tem ideias alinhadas com as apresentadas por Aécio e pelo PSDB. Quem vota em Dilma, tem ideias alinhadas com as de Dilma e do PT. E quem realmente detém seus ideais, defenderá suas concepções, pratique-as quem praticar. Portanto, também considero nociva encarar uma derrota de uma candidatura como uma derrota do defensor dela.

A reflexão saudável envolve uma posição definida, uma disposição à conversa e um debate apenas de ideias. Respeito é bom e todos gostam. O que seria da política sem o debate? Um nocivo conjunto de programas e ideias fechadas, sem disposição ao diálogo. Uma ditadura de projetos engessados e controlados, que assim permanecerão se também não houver o debate na base da sociedade. Cada um pensaria de uma forma e assim permaneceria por toda a vida.

Portanto, caros amigos, mais amor e menos ódio. Mais debates de ideias e menos discussões de pessoas. As eleições passam, mas ficam as ideias e as amizades. Consideremos que uma ideia pode ser defendida de maneira extremamente consistente sem que isso implique em desrespeito à ideia contrária. Em qualquer lugar devemos debater política, devemos enriquecer nosso conhecimento e nos permitir uma tomada de decisões mais sábia quando estivermos na urna. O Brasil precisa de debates que aprimorem ideias, não de discussões que destruam relações pessoais.

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