Página 3452 da Judicial - 1ª Instância - Capital do Diário de Justiça do Estado de São Paulo (DJSP) de 16 de Agosto de 2018

consequências do eventual inadimplemento, o que torna inviável a revisão contratual, em decorrência da absoluta previsibilidade das condições pactuadas. Assim, sequer se vislumbra qualquer desrespeito ao disposto no artigo 46 do Código de Defesa do Consumidor ou ausência de boa-fé objetiva no contrato tratado nos autos. Vale consignar, por analogia: “Cobrança Adiantamento a depositante Dívida demonstrada nos extratos de movimentação da conta corrente contrato de adesão que, por si só, não caracteriza pactuação abusiva, tendo sido firmado livremente pelo devedor, dele se beneficiando.” (TJSP, RT 726/212). “Contrato bancário de adesão, com o qual concordou livremente o devedor, e dele se beneficiou, não caracteriza pactuação abusiva por parte do credor”. (RT 726/212). Destarte, o referido princípio “pacta sunt servanda”, tem incidência ampla, não incumbindo ao Juiz, ao seu próprio talante, aplicá-lo simplesmente quando lhe convier. Assim, não sendo caso de nulidade, imprevisão e outras exceções taxativas e limitadas, o contrato faz lei entre as partes e deve ser respeitado e cumprido. Além disso, segundo decidido pelo Superior Tribunal de Justiça: “É válida a cláusula que autoriza o desconto, na folha de pagamento do empregado ou servidor, da prestação do empréstimo contratado, a qual não pode ser suprimida por vontade unilateral do devedor, eis que da essência da avença celebrada em condições de juros e prazo vantajosos com o usuário” (REsp. 738.563-RS 2ª Seção 08/06/05 Min. Aldir Passarinho Jr). Confira-se ainda: “Conquanto a origem do dinheiro depositado seja o pagamento de salários do agravado, disso não se pode concluir, por ora, com ofensa ao artigo , LIV, da Constituição, ou artigo 649, IV, do CPC. A privação de bens a que se refere o inciso LII do art. da Constituição é aquela que decorre de ato de força do Estado, e não se confunde com a livre disponibilidade, por parte de seu titular, como parece que é o que se dá, no caso concreto. Por outro lado, não se trata de penhora de salário de funcionário público. Finalmente, não se vê ofensa às normas do CDC, na prática de desconto autorizado do débito, por parte do Banco depositário, sobre a disponibilidade do devedor em sua conta corrente” (JTACSP- LEX 205/104). Por isso, e em princípio, correta se mostra a retenção de quantias, ainda que advindas de verba salarial. No entanto, conquanto ajustadas, as cláusulas que preveem lançamentos a débito, seja em conta corrente ou em folha de pagamento de funcionário público, dos valores integrais de prestações decorrentes de contrato de mútuo, importa em exagerada vantagem ao Banco, acarretando desequilíbrio entre os contratantes, tanto que se presta a alcançar significativa parcela dos proventos do tomador dos empréstimos, que, como se sabe, constitui verba alimentar. Por isso, deve prevalecer o entendimento da Superior Instância, em que cabível o desconto em folha para quitação de empréstimo, desde que limitado a 30% dos vencimentos do mutuário, a fim de que não abranja a totalidade do salário do devedor, evitando-se, assim, risco à sua subsistência e de sua própria família. No caso, ao que se vê, os empréstimos foram realizados ajustando-se os descontos diretamente na folha de pagamento da autora, professora estadual, com inequívoca retenção de vencimentos em parcelas superiores ao percentual acima mencionado (30%), tomando-se praticamente todo o salário, o que compromete sobremaneira a sua subsistência. É desta forma que o E. Tribunal de Justiça vem entendendo, com precedentes, assim como o C. Superior Tribunal de Justiça, como se vê dos seguintes julgados assim ementados (grifos nossos): “AGRAVO REGIMENTAL - AGRAVO DE INSTRUMENTO - CONTRATO DE MÚTUO BANCÁRIO - DÉBITO EM CONTA CORRENTE - LIMITAÇÃO DO DESCONTO -DECISÃO AGRAVADA MANTIDA - IMPROVIMENTO. I - “Ante a natureza alimentar do salário e do princípio da razoabilidade, os empréstimos com desconto em folha de pagamento (consignação facultativa/voluntária) devem limitar-se a 30% (trinta por cento) dos vencimentos do trabalhador” (REsp 1.186.965/RS, Rel. Min. MASSAMI UYEDA, DJe 03.02.2011). II - O Agravante não trouxe nenhum argumento capaz de modificar a conclusão do julgado, a qual se mantém por seus próprios fundamentos. Agravo Regimental improvido”. (AgRg no Ag 1381307 / DF, Ministro SIDNEI BENETI, 3ª Turma, j. 12/04/2011, DJe 27/04/2011). “RECURSO ESPECIAL - NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL ALEGAÇÃO GENÉRICA - APLICAÇÃO, POR ANALOGIA, DA SÚMULA N. 284/STF - EMPRÉSTIMO - DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO/CONSIGNADO - LIMITAÇÃO EM 30% DA REMUNERAÇÃO RECEBIDA RECURSO PROVIDO. 1. A admissibilidade do recurso especial exige a clara indicação dos dispositivos supostamente violados, assim como em que medida teria o acórdão recorrido afrontado a cada um dos artigos impugnados. 2. Ante a natureza alimentar do salário e do princípio da razoabilidade, os empréstimos com desconto em folha de pagamento (consignação facultativa/voluntária) devem limitar-se a 30% (trinta por cento) dos vencimentos do trabalhador. 3. Recurso provido.”(REsp 1186965/RS, Ministro MASSAMI UYEDA, 3ª Turma, 07/12/2010, DJe 03/02/2011) “Tutela antecipada Liminar Cobrança de dívidas de empréstimo, cheque especial e demais encargos debitados na conta bancária em que o devedor percebe seus benefícios previdenciários Completa absorção destes pelas dívidas Inadmissibilidade Desconto abusivo Presença, entretanto, de empréstimos e contribuições consignados em folha que devem permanecer, desde que não ultrapassem o limite de 30% dos benefícios (cf. Lei 10.820/2003) Recurso provido em parte, por maioria”. (AI 7.080.036-1, Rel. Rui Cascaldi, j. 09/08/2006). “CONTRATO BANCÁRIO Empréstimos bancários. Funcionário público. Pedido de cessação dos descontos das prestações de mútuos em folha de pagamento e em conta corrente, ou, subsidiariamente, a limitação dos encargos a 30% de seus rendimentos líquidos Hipótese em que os empréstimos foram obtidos mediante condições especiais, justamente em função da garantia propiciada ao credor pelos descontos em conta corrente bancária e retenção em folha de pagamento Admissibilidade da preservação dos descontos das parcelas dos contratos, mas limitados a montante nunca superior a trinta por cento dos proventos líquidos do mutuário Concessão, em parte, da tutela antecipada postulada - Recurso provido, em parte.” (Agravo de Instrumento nº 990.10.197892-0, Relator João Camillo de Almeida Prado Costa, 19ª Câmara de Direito Privado, j. 18/05/2010). “MÚTUO Contratos de empréstimo Desconto das parcelas em conta corrente Natureza alimentar do montante depositado Apropriação integral dos salários. Abusividade Caráter alimentar dos vencimentos Limitação dos descontos a 30% do crédito em conta corrente Manutenção da liminar parcialmente concedida Agravo de instrumento não provido.” (AGRV. Nº 990.09.369396-8, 19ª Câmara de Direito Privado, Relator Ricardo Negrão, j. 16/06/2010). “DECLARATÓRIA - Contratos bancários (empréstimos) - Descontos em folha de pagamento - Limitação - Possibilidade - Natureza alimentar - Decisão mantida.” (Apelação nº 990.10.146387-3, 19ª Câmara de Direito Privado, Relator Sebastião Junqueira, j. 22/06/2010). “DECLARATÓRIA - CONTRATOS DE EMPRÉSTIMOS - Descontos na folha de pagamento e na conta corrente do autor, funcionário público estadual - Possibilidade, desde que respeitado o teto determinado pelo Decreto estadual n.º 51.314/06 - Limitação de 30% dos vencimentos líquidos do autor - Sentença mantida - Recursos improvidos.” (Apelação nº 990101379767, 21ª Câmara de Direito Privado, Relator Silveira Paulilo, j. 09/06/2010). “Empréstimo bancário. Desconto automático em conta corrente. Inadmissibilidade. Incidência do artigo 649, inciso IV do CPC. Cláusula autorizadora de débitos que deve ser considerada tão somente como autorização outorgada pelo correntista, mas suscetível de suspensão de continuidade no curso do tempo. Antecipação da tutela jurisdicional deferida para determinar a cessação dos descontos. Recurso provido.” (Apelação nº 990102180891, Relator Luis Carlos de Barros, 20ª Câmara de Direito Privado, j. 31/05/2010). Assim, a pretensão irresignativa deve ser atendida para limitar os descontos totais dos empréstimos realizados pela autora, seja em sua conta corrente ou em sua folha de pagamento, a 30% do seu salário líquido mensal, limite que deverá ser observado para a somatória de todos os descontos. Ante o exposto, e por tudo o mais que dos autos consta, JULGO PROCEDENTE o pedido inicial para limitar os débitos dos valores mutuados em sua folha de pagamento a 30% de seu salário líquido, mas incidindo sobre a diferença apurada a cada operação, ainda devida, correção monetária pela tabela do TJSP e juros moratórios de 1% ao mês, para oportuno e automático débito em folha de pagamento, conforme forem as dívidas se liquidando e, assim, for abrindo espaço para pagamento dentro do limite de 30% estabelecido,

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