Página 3564 da Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte III do Diário de Justiça do Estado de São Paulo (DJSP) de 29 de Maio de 2020

outro voo; que agiu em conformidade com o art. 27 da Resolução n. 400 da ANAC; que não houve extravio de bagagens, mas sim atraso em sua entrega, uma vez que foi devolvida sem danos; que a bagagem foi entregue no dia seguinte à sua chegada em Milão; que não há comprovação dos danos materiais a serem reparados; que não houve a ocorrência de danos morais, uma vez que a situação somente acarretou aborrecimento cotidiano; que devem ser aplicadas as disposições contidas na Convenção de Montreal; que houve o ressarcimento de R$2.431,00. Manifestou-se a autora em réplica (fls.197/205), alegando: que, embora o terceiro voo tenha sido realizado pela empresa TAP Airlines, as passagens foram adquiridas com a empresa requerida; que ao chegarem em Milão foram informados que a bagagem havia sido extraviada, sendo-lhes entregue somente um dia depois; que a Convenção de Montreal não pode ser aplicada em casos que tratem de danos morais. O feito foi saneado (fls.206/207), com distribuição do ônus da prova. As partes se manifestaram, não sendo requeridas outras provas. Com esse RELATÓRIO, FUNDAMENTO e DECIDO. O feito já comporta julgamento no estado em que se encontra, anotando o desinteresse das partes pela produção de outras provas. Sem preliminares/prejudiciais a serem apreciadas, passo à análise do mérito, sendo hipótese de PROCEDÊNCIA PARCIAL da pretensão. O despacho saneador já havia antecipado as questões incontroversas: atraso nos três voos contratados e na entrega da bagagem. Os alegados danos materiais são justificados: pelo atraso na entrega da bagagem em Milão em um dia; e pela perda de conexão do voo entre Lisboa e São Paulo, com novo atraso na entrega da bagagem (fls.8), o que obrigou os autores a gastarem com hospedagem, alimentação, transporte e produtos de higiene (fls.107), cujas despesas estão comprovadas pelos documentos de fls. 37/44. Pois bem. Inicialmente, anoto que por força do deliberado no RE 636331 e no ARE 766.618, em julgados do Eg. STF, sob a sistemática da repercussão geral, passa-se a adotar a orientação de que são aplicáveis as Convenções de Varsóvia e/ou Montreal, que regulam regras de unificação de transporte aéreo internacional e têm prevalência em relação ao Código de Defesa de Consumidor, em ações que têm por objeto contrato de transporte aéreo internacional, realizado na vigência DF 5.910/2012, que promulgou a Convenção de Montreal, de 28.05.1999, sendo certo que seus limites indenizatórios abarcam apenas a reparação por danos materiais para as hipóteses ali preestabelecidas, e não em relação ao pedido de indenização por danos morais. (Neste sentido: Apelação Cível nº 102XXXX-53.2018.8.26.0003; Rel. REBELLO PINHO; Data do Julgamento: 06/05/2020). Neste contexto, para o que interessa aos autos, devem ser observados o disposto nos artigos 19 e 22 do Decreto nº 5.910, de 27 de setembro de 2006, que promulga a Convenção para a Unificação de Certas Regras Relativas ao Transporte Aéreo Internacional, celebrada em Montreal, em 28 de maio de 1999, que definem a responsabilidade do transportador por atrasos no transporte aéreo de passageiros, bagagem ou carga, e o limite indenizatório. Neste contexto, respeitado o limite definido no dispositivo apontado, e comprovadas as despesas e o liame subjetivo entre estas e a conduta da ré, subsiste o dever de indenizar. Neste sentido: “(...) Configurado o extravio temporário das bagagens dos autores passageiros, durante viagem internacional, e não configurada nenhuma excludente de responsabilidade, de rigor, a condenação da ré na obrigação de indenizar os passageiros autores pelos danos decorrentes do ilícito em questão. (...) Gastos com aquisição de bens de primeira necessidade, como roupas e itens de higiene pessoal, pelos passageiros autores, em razão do defeito de serviço de transporte, consistente em atraso na entrega das bagagens, constituem dano material indenizável, por implicar em despesas desnecessárias e, consequentemente, diminuição do patrimônio.” (Apelação Cível nº 102XXXX-53.2018.8.26.0003; Rel. REBELLO PINHO; Data do Julgamento: 06/05/2020). Vale destacar que as despesas com os artigos de vestuário, itens de higiene, acomodações, deslocamentos e outras, decorrentes dos atrasos indicados na inicial, tanto no que toca ao voo como em relação à restituição das bagagens, foram comprovadas (fls. 37/44), e não impugnadas com especificidade pela parte requerida. É incontroverso que houve atraso na entrega das bagagens e, quanto à avaria alegada na mala dos autores, a ré se limitou a afirmar que foi entregue incólume. Mas, não faz qualquer prova quanto a esse fato, o que se contrapõe à fotografia juntada aos autos pelos autores (fls.36), na qual se verifica a evidente danificação, o que aparentemente torna insegura a sua utilização. Os gastos elencados na planilha de fls.107/108 e comprovados pelos documentos (fls.109/122) são condizentes com a narrativa dos autos, e não especificamente impugnados, como acima já destacado. Tais despesas decorreram da conduta ilícita da ré, valendo anotar, no que toca ao atraso nos voos, que as indicadas “questões técnicas” e os “problemas climáticos” alegados pela ré (fls.175) para justificar o cancelamento dos voos LH280 (Frankfurt-Milão) e LH257 (Milão-Frankfurt), respectivamente, não afastam a sua responsabilidade pelos danos decorrentes, até porque, sequer há comprovação das alegações lançadas. Também não se sustenta o argumento de que a requerida não teria responsabilidade por danos decorrentes de atraso do voo TP573 (Frankfurt-Lisboa), por ter sido operado pela empresa Tap Airlines, pois os requerentes foram realocados para este voo por providência da ré, em decorrência do atraso do voo que havia vendido aos requerentes, originariamente. Nesse contexto, a ré deve ser responsabilizada pelos danos materiais identificados, no total de R$ 10.451,57, com dedução do que já fora pago, no importe de R$ 2.146,00, a resultar na quantia de R$ 8.367,57, ressaltando que o importe indenizatório está inserido nos limites definidos pela Convenção de Montreal, da qual o Brasil é signatário, destacando-se para tanto o artigo 22, itens I e II do Decreto n. 5910/06, que ratificou a Convenção de Montreal. Tais circunstâncias foram consideradas pela autora em réplica. Na sequência, passo à apreciação do pedido de indenização por danos morais. O histórico narrado pelos autores faz denotar uma situação de excepcionalidade que vai muito além do mero dissabor, do mero aborrecimento ou transtorno. Houve, efetivamente, ofensas a direito da personalidade (dignidade), a começar pelo atraso na entrega da bagagem durante a ida de uma viagem programada para comemorar o aniversário de casamento dos requerentes, além da incerteza acerca do recebimento de seus pertences pessoais e da necessidade de despender tempo e energia para adquirir novos pertences. Na volta, os requerentes enfrentaram problemas novamente, com novo atraso na entrega de suas bagagens e necessidade de adiamento da data de retorno ao Brasil em dois dias, o que modificou todos os planos e causou transtornos aos reclamantes. Foram situações extremamente desconfortáveis vividas em meio a condições que superam qualquer expectativa dentro do que se poderia ter como razoável, inexistindo a identificação de situação de exclusão de responsabilidade da requerida. Destaco os julgados: “Transporte aéreo internacional de passageiro. Ação de reparação de danos. Atraso de voo, com perda de conexão. Falha mecânica na aeronave, exigindo manutenção. Fortuito interno. Falha na prestação do serviço. Falhas mecânicas apresentadas na aeronave não podem ser consideradas fato imprevisível. O atraso do voo em razão de manutenção da aeronave caracteriza fortuito interno. Chegada ao destino final com vinte e quatro horas de atraso. Dano moral configurado. montante da reparação arbitrado com razoabilidade. O atraso de vinte e quatro horas não pode ser considerado mero transtorno, configurando, sim, dano moral passível de reparação. Os incômodos sofridos, as atribulações, as expectativas desfeitas de uma viagem prazerosa, o sentimento de impotência diante do atraso do voo, a sensação de se encontrar a contragosto em terra estrangeira, os revezes, o estresse, extrapolam o mero dissabor do cotidiano, não restando dúvida da existência do propalado dano moral. (...)” (TJSP - Apelação n. 100XXXX-50.2017.8.26.0358; Rel: Sandra Galhardo Esteves; 12ª Câmara de Direito Privado; j: 05/04/2019) “Apelação Ação indenizatória Transporte aéreo internacional de passageiros Atraso que ultrapassou um dia Pedido procedente Companhia aérea condenada ao pagamento do montante de R$ 10.000,00, a título de danos morais Pleito de reforma da r. decisão Impossibilidade Vínculo entre as partes inserido no âmbito das relações de consumo Responsabilidade objetiva da empresa ré Alegação de problemas técnicos na aeronave a ensejar manutenção Fortuito interno - Voo remarcado para o dia seguinte seguido de novo cancelamento e realocação da autora em voo

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