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1 O FUNCIONÁRIO PÚBLICO E O DIREITO DE GREVE
(NOTAS DE ESTUDO)
A. NOGUEIRA DE SÁ
Advogado do Departamento Jurídico do Estado
Revista dos Tribunais • RT 178/495 • mar./1949
Do fato de haver sido reconhecida a greve como um direito pela Constituição Federal vigente (art. 158) seria possível concluir que esse direito se estende aos funcionários públicos?
É interessante e oportuno considerar o assunto.
Em primeiro lugar, não nos parece que mesmo em relação àqueles a quem se dirige a norma, isto é, os que estão vinculados à relação de trabalho ( Consolidação das Leis do Trabalho, arts. 1 a 12) se aplique, desde logo, o preceito constitucional. É claro o texto: “É reconhecido o direito de greve, cujo exercício a lei regulará.” (Art. 158 da Constituição.)
Enquanto não for promulgada, portanto, a lei própria à qual compete regular o exercício desse direito, a faculdade que ele envolve, na hipótese de omissão do decreto-lei n. 9.070, de XXXXX-3-1946, ou normas legais semelhantes, existiria, apenas, potencialmente, pois é o próprio assento constitucional que subordinou o exercício dele à disciplina da lei ordinária. Não é, consequentemente, auto-aplicável o preceito. Demanda lei que o complete. Verificado que fosse o fato no interregno de espectativa da lei, isto é, não havendo norma legal alguma, com a provocação dos órgãos judicantes suscitar-se-ia problema jurídico dos mais tormentosos. A convivência humana, porém, pode impor aos membros do agregado social certos limites de ação. Esses limites seriam, no caso, considerados pelo poder competente.
É verdade que as garantias e os direitos firmados na Constituição independem, em princípio, do legislativo ordinário. Assim por exemplo, no caso do § 36 do art. 141 da mesma Constituição, não se vai sustentar que sem a lei “acenada não se haverá como líquida e certa, é o caso, a obtenção das certidões requeridas para defesa de direito.
Mas, nessa hipótese, entendemos ainda – e é um entendimento ao nosso ver irrecusável – que o legislador constituinte o que visou foi que tal matéria não ficasse aos azares de atos administrativos formais, embora normativos. Enquanto não votada, pois, a lei, nem por isso deixam de vigir os preceitos constitucionais que pràticamente já assegurem as garantias decorrentes deles. As normas que preexistirem, pois, e que acaso já cuidem da matéria, até à edição da lei especial, continuarão a ser aplicadas se facilitarem a completa realização da finalidade objetivada por aqueles preceitos constitucionais. E se acontecesse haver omissão delas, nem por isso, é claro, encontraria fundamento constitucional a recusa das certidões requeridas para defesa de direito. Legitimado o pedido, não há como denegá-lo. Enfim, o preceito não submeteu, pròpriamente, o exercício dessa garantia, à disciplina da lei ordinária.
Bem diverso é o que ocorre com o art. 158 da citada Constituição. Neste dispositivo se reconhece o direito de greve – é uma declaração – e se condiciona, pràticamente, os efeitos dela à promulgação de lei ordinária que regulará o exercício do direito que foi declarado.
E há, até, disposições expressas de lei que proíbem aos funcionários tanto sindicalizarem-se como fazerem greve.
E quanto aos efeitos criminais?
Não temos dúvida de que subsiste o art. 200 do Código Penal. O ilícito criminal da paralisação do trabalho não se configura pela simples paralisação pacífica do trabalho, mas seguida de violência ou perturbação da ordem. A abstenção pura e simples de trabalhar não justificaria a repressão penal, 1 salva a hipótese do art. 201 do Código Penal.
Ora, a declaração de liceidade da greve não podendo, evidentemente, compreender a violência ou a perturbação da ordem, mas a greve pacífica, que o Código Penal não pune, subsistirão as duas normas, a constitucional e a penal, por haver compatibilidade entre uma e outra. Demais, esse entendimento é o que se coaduna, perfeitamente, com o decreto-lei n. 9.070, de 5-3-1946, lei de indiscutível sabedoria política e da melhor técnica.
Consultando-se o elemento histórico, verifica-se que, se de uma parte, não se preordenaram, no texto, limitações formais ao direito de greve, aceitando-se, porém, como solução de rigor …
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