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Sumário:
Daniel Granado
O processo civil brasileiro, em sua concepção clássica, reuniu seus fundamentos teóricos sob a vigência da ideologia liberalista, razão pela qual se consagrou ao refletir valores tipicamente individuais, de modo a tutelar a lesão ou a ameaça de lesão tão somente na esfera singular do titular de direitos.
Dessa feita, os litígios tradicionais constituíam-se em face de uma pretensão resistida entre dois sujeitos, 1 estando a discussão limitada aos direitos e deveres subjetivos dos autores e réus envolvidos na demanda, é dizer, a natureza individualista do processo previa a sua aplicação somente no âmbito privativo de cada sujeito.
Sob essa ótica, a tutela jurisdicional dos direitos e interesses metaindividuais, transindividuais ou coletivos lato sensu , 2 como tais entendidos os direitos difusos, coletivos e os individuais homogêneos, não era sequer identificada no âmbito do processo civil tradicional, ficando, desse modo, alheia à sistemática jurídica ante a falta de ferramentas processuais hábeis à resolução de demandas de caráter coletivo.
Dessarte, à guisa de ilustração, importa destacar que o Código de Processo Civil de 1973, 3 - 4 conforme leciona Teori Zavascki, 5 “foi moldado para atender à prestação da tutela jurisdicional em casos de lesões a direitos subjetivos individuais, mediante demandas promovidas pelo próprio lesado”. Portanto, as bases individualistas do processo civil acabaram por deixar em segundo plano a tutela dos direitos coletivos lato sensu , os quais hodiernamente recebem ampla proteção e amparo legal.
A partir da segunda metade do século XVIII, principalmente tendo em vista o desenvolvimento do modelo de produção industrial e o processo de urbanização e concentração da população nas grandes cidades, o desenvolvimento de uma sociedade de massa 6 - 7 ganhou cada vez mais destaque, haja vista novos anseios sociais e situações que, consequentemente, demandaram uma reformulação do paradigma de tutela jurisdicional puramente individual, o qual se revelou demasiadamente insuficiente diante da complexidade das relações sociais.
Sobre a temática, observa Cândido Rangel Dinamarco: 8
O direito moderno, por imposição da aglutinação de interesses supraindividuais na sociedade de massa, tende a ser um direito da coletividade e não mais apenas direito dos indivíduos, como nos moldes tradicionais. É das últimas décadas do século XX a intensa legislação de apoio aos valores do meio ambiente, da cultura e da história, de proteção aos consumidores como grupo em que se concentram interesses homogêneos etc. – tudo se reconduzindo ao conceito amplo de direito e interesses transindividuais.
É dizer, com a evolução da sociedade, surgiu a necessidade de se tutelar direitos de outras dimensões, para além dos direitos individuais e sociais clássicos, passando-se a proteger os interesses metaindividuais como resultado da postura ativa exigida do Estado a partir do declínio da concepção liberal. Nesse contexto, a tutela coletiva de direitos revelou-se fundamental e inafastável, como instrumento apto a garantir, judicial ou extrajudicialmente, a efetivação dos direitos transindividuais.
Sobre o assunto, Rodolfo de Camargo Mancuso 9 aduz que:
O limiar do terceiro milênio exibe uma sociedade massificada, competitiva, espraiada por um mundo globalizado, o que acarreta alterações profundas no tripé do Direito Processual – ação, jurisdição e processo – e, de outro lado, vai tornando defasadas antigas concepções ligadas a outro tempo, que se diria de um processo civil romântico, simbolizado no clássico embate entre Tício e Caio, podendo, no máximo, estender-se a alguns Tícios em face de alguns Caios, nas figuras litisconsorciais.
Desse modo, notório concluir que a evolução dos institutos processuais no sentido de instrumentalizar a tutela coletiva de direitos decorre da própria necessidade de acompanhar as transformações do Estado e da sociedade como um todo, haja vista que o processo, como instrumento que é, deve se adaptar constantemente à nova realidade social e aos conflitos que pretende solucionar.
O primeiro diploma normativo a expressamente mencionar o vocábulo “ação civil pública”, foi a Lei Orgânica do Ministério Público de 1981 (Lei Complementar nº 40), o qual, em seu art. 3º, inciso III, determina ser função institucional do Ministério Público a promoção da ação civil pública, nos termos da lei. É possível observar, de início, que a lei em apreço, ao descrever a ação civil pública, tem por escopo tão somente a sua distinção da ação de objeto penal proposta pelo Ministério Público, tratando-se de enfoque nitidamente subjetivo, lastreado na titularidade ativa de qualquer ação civil, sem destaque específico, o qual caberia a lei posterior definir.
Somente quatro anos depois, por intermédio da Lei nº 7.347/85 , Lei da Ação Civil Pública, é que a expressão ganhou significado, de modo a contemplar, inicialmente, a defesa do meio ambiente, do consumidor e dos valores culturais. 10 Ao tutelar direitos e interesses metaindividuais, a Lei da Ação Civil Pública se antecipou à Constituição Federal de 1988, como se verá a seguir, tratando do processamento da tutela coletiva de maneira específica.
Para Teori Zavascki, 11 a Lei nº 7.347/85 veio preencher uma importante lacuna do sistema de processo civil, que, ressalvado o âmbito da ação popular, 12 só dispunha, até então, de meios para tutelar direitos subjetivos individuais. Mais do que disciplinar um novo procedimento qualquer, a supramencionada lei veio inaugurar um autêntico “subsistema de processo, voltado para a tutela de uma também original espécie de direito material: a dos direitos metaindividuais, caracterizados por se situarem em domínio jurídico não de uma pessoa ou de pessoas determinadas, mas sim de uma coletividade”.
Ato contínuo, a Constituição Federal de 1988, por meio de seu art. 129, inciso III, 13 conferiu status constitucional à ação civil pública, consolidando definitivamente como uma das funções institucionais do Ministério Público a promoção da ação civil pública para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos.
Ademais, foram positivados outros direitos de natureza …
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