40. Perturbação de Processo Licitatório (Art. 337-I)

Perturbação de processo licitatório Art. 337-I. Impedir, perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de processo licitatório: Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 3 (três) anos, e multa. 40.1.Considerações iniciais O crime de perturbação de processo licitatório , inserido no Código Penal pela nova Lei de Licitações (Lei nº 14.133/2021), é reprodução quase exata do anterior art. 93 da Lei nº 8.666/1993 . A única mudança foi redacional, substituindo-se a palavra “procedimento ” por “processo ”, preciosismo que nada muda em relação ao alcance da incriminação. Em raro momento no tratamento penal das licitações e dos contratos administrativos, a pena do crime previsto na lei anterior foi mantida pelo novo diploma (isso somente se deu no presente caso e no crime de violação de sigilo de licitação , art. 337-J. Nos demais casos, as penas foram exacerbadas). 40.2.Objetividade jurídica O bem jurídico tutelado concerne às funções públicas , no sentido do regular exercício das atividades públicas (crime simples). Na presente incriminação, particularmente, encontra-se em jogo a probidade administrativa, vulnerada pela conduta irregular que afeta o processo licitatório apto às contratações administrativas. 40.3.Sujeitos do delito Sujeito ativo do delito é qualquer pessoa (crime comum). Tanto o funcionário público como o particular podem perturbar os atos da licitação. Neste último caso, ou seja, o extraneus , não precisa ser necessariamente o licitante. Caso o sujeito ativo seja funcionário público , que atua em violação a seu dever, incidirá a agravante genérica prevista no art. 61, II, g , do Código Penal. Sujeitos passivos são, em primeiro lugar, o Estado, bem como o licitante eventualmente prejudicado pela conduta criminosa 1 . 40.4.Tipicidade objetiva e subjetiva A figura delitiva insculpida no caput do art. 337-I do Codex estabelece: “impedir, perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de processo licitatório ”. Cuida-se de tipo misto alternativo , ou de conteúdo variado, também denominado de crime de ação múltipla, o que significa que a prática de mais de um dos comportamentos vedados, em um mesmo contexto fático, caracteriza crime único. Impedir é sinônimo de obstar, impossibilitar, frustrar. Nessa hipótese, o ato licitatório não ocorre (e.g ., não publicação do edital). Perturbar significa atrapalhar, prejudicar, desestabilizar (v.g ., realizar propositadamente diligência desnecessária para aferir exequibilidade da proposta com intuito de prejudicar licitante). Fraudar consiste em enganar, utilizar de meio inidôneo para levar a erro (por exemplo, substituir a proposta efetuada por licitante por outra falsa com valor maior). Objeto material da infração é o ato do processo licitatório, o que abarca qualquer de suas fases (preparatória; divulgação do edital de licitação; apresentação de propostas e lances, se for o caso; julgamento; habilitação; recursos e homologação). O Superior Tribunal de Justiça (STJ) 2 possuía uma tese consolidada relativa ao tipo penal insculpido no art. 93 da Lei nº 8.666/1993 , que se aplica à nova figura delitiva do art. 337-I do Código Penal: “O delito do art. 93 da Lei n. 8.666/1993 somente se tipifica se as condutas nele previstas forem praticadas no curso do procedimento licitatório ” 3 . Desse modo, caso o certame já tiver sido encerrado, não responderá o agente pelo presente crime, mas sim por figura diversa. Elemento subjetivo do tipo é o dolo, vontade livre e consciente de prática do comportamento vedado. Inexiste previsão de um especial fim de agir (elemento subjetivo especial do tipo). Não se admite modalidade culposa. Por conseguinte, e.g ., uma perturbação causada de modo não intencional mostra-se atípica. Caso o comportamento delitivo ocorra juntamente com a prática de corrupção , haverá concurso de crimes 4 . 40.5.Consumação e tentativa O crime se consuma com o efetivo impedimento, perturbação ou realização de fraude no curso de processo licitatório. As modalidades de impedir e fraudar são materiais , ou de resultado, admitindo tentativa . Já o comportamento de perturbar é formal , não comportando o conatus . 40.6.Pena e ação penal O crime de perturbação de processo licitatório é sancionado com pena de detenção, de seis meses a três anos, e multa (art. 337-I). A ação penal é pública incondicionada . É cabível suspensão condicional do processo (art. 89 da Lei nº 9.099/1995). Preenchidos os requisitos do art. 28-A do Código de Processo Penal, é cabível o acordo de não persecução penal . QUADRO ESQUEMÁTICO Nomen iuris Perturbação de processo licitatório (art. 337-I) Objeto jurídico Funções públicas, isto é, o regular funcionamento das atividades públicas Objeto material O ato do processo licitatório Sujeito ativo Qualquer pessoa (crime comum ) Sujeito passivo o Estado, bem como o licitante eventualmente prejudicado pela conduta criminosa Tipicidade objetiva Impedir, perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de processo licitatório Tipicidade subjetiva Dolo Consumação Com o efetivo impedimento, perturbação ou realização de fraude no curso de processo licitatório Tentativa As modalidades de impedir e fraudar são materiais, ou de resultado, admitindo tentativa. Já o comportamento de perturbar é formal, não comportando o conatus Pena • tipo básico : detenção, de 6 meses a 3 anos, e multa • Vide art. 337-P Ação penal Pública incondicionada Competência Justiça Comum Estadual ou Federal (art. 109, IV, da Constituição Federal) Acordo de não persecução penal É possível .Bitencourt, v.g ., entende o oposto, cf. BITENCOURT, Cezar Roberto. Direito penal das licitações . São Paulo: Saraiva, 2012, p. 264. Contudo, como se trata de crime contra a administração pública, não se pode concordar com referido posicionamento. O interesse maior em jogo pertence ao Poder Público. .Conforme divulgado na ferramenta da Corte denominada “Jurisprudência em Teses ”, edição nº 134, em outubro de 2019. . HC XXXXX/RN , Relª. Minª. Maria Thereza De Assis Moura, Sexta Turma, j. 07/04/2016, DJe 19/04/2016. .Em sentido similar, na doutrina italiana, cf. ROMANO, Mario. I delitti contro la pubblica amministrazione : i delitti dei privati – le qualifiche soggettive pubblicistiche. Milano: Giuffrè, 2015, p. 254.

40.1.Considerações iniciais

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