AGU aposta em inteligência artificial e automação de processos para agilizar trabalhos jurídicos

A Advocacia-Geral da União (AGU) tem apostado em inteligência artificial e procedimentos automatizados para agilizar o trabalho que é desenvolvido por procuradores os estados de São Paulo, Mato Grosso, bem como nos estados que compõem a região sul.

O Sistema de Automação Processual (SAP), também conhecido como "robozinho", distribui processos e cadastra tarefas no Sistema Integrado de Controle das Ações da União (Sicau) em segundos. A expectativa é que ele atinja a marca de um milhão de registros no mês de março. Já o Sistema de Apoio à Procuradoria Inteligente (Sapiens) vai além, lê o processo e indica a melhor peça jurídica a ser usada.

O aperfeiçoamento da rotina permite que os procuradores utilizem o tempo para um estudo mais detalhado da ação. Ambos os casos são projetos pilotos em análise pela Procuradoria-Regional Federal da 3ª Região (PRF3) e pela Procuradoria-Regional Federal da 4ª Região (PRF4). Há previsão para estender essas ferramentas para outas unidades do Brasil.

Desde a criação da ferramenta SAP, desenvolvida pela PRF3, já foram cadastradas e distribuídas mais de 760.000 tarefas. Para ativar o procedimento basta inserir os números das intimações recebidas. A partir deste ponto o Sistema distribui o processo, insere no Sistema Integrado de Controle das Ações da União (Sicau) e ainda busca as peças relacionadas ao assunto nos bancos de dados dos Tribunais. Assim como acontece no Tribunal Regional Federal da 3ª Região, o sistema recupera todos os arquivos vinculados a determinada ação, gera um número de protocolo na AGU e distribui para o procurador responsável com os documentos necessários.

Todo o processo dura menos de um minuto. Para se ter uma ideia, o programa consegue inserir uma carga de 300 processos dos Tribunais em uma tarde. Antes eram necessários três dias de trabalho para atingir o mesmo resultado, além da demanda de pessoal para executar a tarefa.

De acordo com a PRF3, a vantagem do serviço é a melhoria da velocidade, confiabilidade e qualidade de dados. Cabe destacar que o SAP utiliza "software livre" o que não gera custos para a AGU.

Sapiens

Da evolução e aperfeiçoamento do SAP foi desenvolvido o Sapiens. O projeto executa as mesmas informações do "robozinho" e ainda implementa rotinas de inteligência, por meio de técnicas de análise de similaridade, que permite que o computador "leia" um acórdão e sugira a melhor peça jurídica a ser utilizada.

O procurador federal Mauro Lucio Baioneta Nogueira, um dos desenvolvedores do Sapiens, concedeu entrevista para esclarecer como funciona esse projeto. Confira abaixo.

O que é o Sapiens?

Sistema web completo de apoio à produção de conteúdo jurídico e controle de fluxos administrativos, focado na integração com os sistemas informatizados do Poder Judiciário e do Poder Executivo.

O sistema atua em várias frentes, e procura, em todas elas, simplificar rotinas e expedientes. Auxilia, na elaboração da defesa judicial, com a sugestão de modelos e teses e com a possibilidade de manipulação facilitada de elementos textuais (inclusão e ordenação de teses, migração automática dos metadados do processo para o modelo, etc.), com foco na padronização da identidade visual das peças processuais. Realiza, através de um módulo de inteligência artificial, a triagem dos processos e a indicação de teses potencialmente cabíveis no caso concreto, auxiliando no processo de tomada de decisão e na elaboração da peça processual.

Unifica e relaciona os elementos constantes do dossiê administrativo eletrônico e do dossiê judicial, permitindo a migração seletiva e controlada de peças do primeiro para o último. Promove a orquestração dos vários sistemas informatizados da administração pública (Sicau, sistemas da Justiça Estadual e Federal, Plenus, CNIS, Siape, etc.), de forma transparente para o usuário. Gerencia e oportuniza a adoção de modelos e teses de direito padronizadas em âmbito nacional, de forma a tornar coesa a atuação dos advogados públicos federais em todo o território nacional e em todas as instâncias.

Fornece dados de gestão qualificada, pela medição do sucesso das teses jurídicas adotadas nacionalmente. Realiza o controle de carga e movimentação de autos físicos, e a supervisão quanto a pedido de subsídios e cumprimento de decisões judiciais. Fornece uma interface exclusiva de acesso a estagiários, para elaboração de minutas de peças judiciais, ofícios e pedidos de cumprimento, que serão, todos eles, eletronicamente submetidos ao prévio crivo do Procurador responsável. Possibilita a migração e distribuição automatizada de tarefas, físicas ou eletrônicas (a depender do grau de integração da Justiça da qual derivem).

2.Como e por quem ele foi desenvolvido?

O sistema Sapiens foi desenvolvido pelos procuradores federais Eduardo Alexandre Lang e Mauro Lucio Baioneta Nogueira, utilizando apenas tecnologias abertas e licenças de domínio comum. A linguagem escolhida para o desenvolvimento do sistema foi PHP sobre uma plataforma Apache/MySQL.

3.Qual o objetivo da ferramenta?

Facilitar o trabalho do procurador, tornando mais rápida e simplificada a produção de peças, automatizando e eliminando a necessidade de registro manual da produção jurídica, auxiliando e fortalecendo os controles de requisições (cargas, cumprimento de tutelas e decisões, pedido de subsídios, etc).

4.Como ele funciona?

O sistema é dividido em dois módulos distintos: O primeiro módulo (Módulo Administrativo) é responsável pela integração do Sapiens com os demais sistemas informatizados existentes (Sicau, Tribunais, etc.). O Módulo Administrativo é uma ferramenta de auxílio exclusivo da equipe de apoio administrativo da Procuradoria, sendo por esta equipe operado. Ele realiza a migração automática das intimações eletrônicas da Justiça, em um primeiro instante, para o sistema Sapiens, e, após, para o Sicau. Neste processo, ele recupera informações completas do processo (autor, réu, partes,etc.). Ele também é responsável pela sincronização das bases de tarefas do Sicau e Sapiens, realizando a migração e o eventual encerramento das mesmas quando necessário.

O segundo módulo (Módulo Judicial) constitui ferramenta de auxílio ao trabalho desenvolvido pelo procurador. Ele auxilia no controle de prazos, na produção da peça jurídica (com a indicação de prováveis modelos para o caso em análise e controle do fluxo de produção de minutas de peças por estagiários), na sistematização do serviço de natureza jurídica (com a prévia de quais processos seriam prioritários, quais conteriam pedido de cumprimento de tutela, etc.), no controle e acompanhamento de pedidos de cumprimento de decisões judiciais, no controle e acompanhamento dos pedidos de carga.

5.Quanto tempo ele demora para fazer o processamento de cada inserção?

Em frações de segundo uma intimação é recuperada do sistema da Justiça e uma tarefa correspondente é aberta no sistema Sapiens, já contendo informações completas sobre partes, assuntos, classe, fases, etc. Na sequencia, são recuperados e armazenados localmente, para acesso rápido e facilitado, todos os documentos e decisões do processo. O tempo para o "download" de todos os documentos do processo depende, por certo, do volume e tamanho destes documentos, e também, em larga medida, do horário de acesso e da sobrecarga do servidor da Justiça. O sistema Sapiens, no entanto, a fim de evitar latência e retardo na recuperação de tais informações, realiza as consultas durante o período noturno. Quando o procurador vai trabalhar, no turno da manhã, todas os documentos e informações relativos ao processo já se encontra disponível para acesso local.

6.Quando ele começou a funcionar? Quantas tarefas ele já distribuiu e analisou?

Quase 7.000 tarefas em apenas pouco mais de dois meses.

7.Quais as vantagens práticas de um sistema como esse para a Advocacia-Geral da União?

Não há no âmbito da AGU um sistema de apoio direto às atividades do procurador. O sistema hoje em uso (Sicau) opera apenas como sistema de cadastro, e não auxilia, entre outras, na fase de elaboração da defesa, na pesquisa de peças anteriormente produzidas, no cumprimento de decisões judiciais, nos pedidos de subsídios às Autarquias e demais entes e órgãos, nas tarefas de secretaria, etc.

8.O programa lê as decisões judiciais e chega a indicar a melhor peça a ser usada no caso? Qual tem sido o número de acerto?

Sim. Possui uma elevada taxa de acerto, que varia de acordo com o grau de padronização da decisão judicial. Se a decisão se refere a um processo de massa, e é, portanto, repetitiva, as taxas de acerto passam da casa dos 95%.

9.Ele errou alguma vez?

O Sapiens é um sistema heurístico e, existe, por certo, a possibilidade de erro. O sistema apenas indica prováveis peças, para o caso em apreço, com uma alta probabilidade de sucesso. No entanto, a decisão de as usar ou não é da responsabilidade exclusiva do procurador. O sistema, por trabalhar com pesquisas e estatísticas, não é capaz de `compreender` uma decisão judicial. Ele se limita a indicar um modelo com base na sua frequência de uso em contextos similares. Ele é uma ferramenta muito sofisticada de pesquisa. Nada além. Caberá sempre ao procurador realizar o juízo crítico para uma atuação acertada, corrigindo, inclusive, o sistema quando a indicação não for a correta. Tal correção balizará o sistema, que poderá, a partir de tal feedback, propor um modelo diferente.

10.O sistema foi programado como inteligência artificial?

O sistema trabalha com o conceito de inteligência social, que reúne e combina o apoio fornecido por ferramentas de inteligência artificial com o feedback humano.

11.Há intenção de expandí-lo para as demais unidades da AGU?

Sim. O sistema já funciona na PRF4 e sua expansão estará sob a responsabilidade da Departamento de Tecnologia da Informação.

12.O programa está sendo melhorado? Como o senhor vê o Sapiens daqui há 5 anos?

Sim. É difícil prever, mas se houver um acerto no processo de tomadas de decisões, e prioridades corretas forem estabelecidas ao longo destes anos, a AGU terá a chance de se destacar, sem sombra dúvidas, como um dos mais inovadores escritórios de advocacia (aí inclusos públicos e privados) de que se tem referência.

13.Quem batizou o programa de Sapiens? Como foi feita a escolha do nome?

O procurador Eduardo Alexandre Lang. Sapiens significa Sistema de Apoio à Procuradoria Inteligente. Essa é a origem do nome.

Uyara Kamayurá