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17 de Junho de 2024
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    Artigo: Estava lá e vi

    há 7 anos

    Por Homero Mafra, presidente da OAB-ES

    "Sua cara é lua cheia" canta o Renato Teixeira, e eu lembro dela com a cara grande, seus olhos claros e lembro do MPB-4 cantando "ela tem olhar de cobra que toda hora paralisa o meu" e quero é falar de beleza, de amor, de poesia.

    Do meu Botafogo, o único carioca que continua na Libertadores - até quando, não sei -, ver o jogo domingo, fazer preguiça com ela, jantar, um bom vinho, música. No sábado passar na loja de discos é de regra e era isso que eu queria fazer nesse sábado, mas estou num voo da Avianca, indo pra Brasilia via São Paulo - e isso é uma história comprida que começa num voo da Gol com overbooking e na aceitação de uma proposta que não cumpriram -, Colégio de Presidentes e reunião do Pleno do Conselho Federal da OAB, conjunta, conjuntura braba, que não nos deixa outra opção. Vou com a posição da Seccional, que passou a ser minha, de votar pelo impedimento do Presidente e pela sucessão na forma da Constituição, e digo pro Conselheiro Henrique Tavares, meu companheiro de viagem, que a sessão vai ser longa e foi, terminou já no comecinho do domingo. Queria mesmo era estar ao lado dela, curtindo meu sábado, mas "ja me voy", "a mi deber cumplir" e ela sabe de onde vem essa citação, e vamos nós para o Conselho Federal, cabeça cheia de interrogações, dúvidas, perplexidades e algumas certezas, uma delas, apontada pelo Conselho Seccional, de votar pelo impedimento. Sabendo da reunião no Conselho Federal, os advogados do Presidente da República, ele próprio um advogado, sempre atencioso com a Ordem e com a advocacia, um dos artífices da inserção do art. 133 na Constituição, vão ao Conselho Federal e pedem prazo para apresentar defesa, e a defesa sempre foi e é tão importante para nós, mas a questão agora é de verificar se as condições para o impedimento se fazem presentes, o tema domina grande parte das discussões, grande parte do tempo, os Presidentes de Seccionais em sua grande maioria pelo desacolhimento do pedido de adiamento, incerteza quanto ao resultado, se a votação ia ser adiada ou não. Nós ali, no olho do furacão, e as posições contra e a favor do adiamento sendo expostas, argumentos respeitáveis dos dois lados, vamos votar: ampla maioria contra o adiamento, discussão que seguiu noite adentro e vamos votar se vamos propor o impedimento ou não. E o Espírito Santo, pelo Conselho Seccional, tinha claramente sinalizado que era a favor da propositura do pedido. Ah, mas a fita tem edições, existiu armação, em nenhum momento o presidente concordou com o pagamento a Eduardo Cunha, dirão os defensores do presidente Temer. E a defesa do presidente se apega a esses pontos e faz deles o ponto central de sua tese. Assisti as falas do presidente na televisão. E não vi, em nenhum momento, o presidente dizer que interrompeu o hoje delator diante dos graves fatos que ouvia, como, por exemplo, a notícia dada pelo até então empresário, de que tinha subornado um Procurador da República (que aliás foi preso). Não vi, também, o presidente desmentir que tivesse combinado outros encontros com o empresário que depois passou a ser chamado de ladrão, sempre fora da agenda e sem a identificação do visitante e sempre de noite, no Palácio do Jaburu. Não fosse a delação, se tudo estivesse dentro da anormal "normalidade" dessas conversas, e os encontros entre o presidente e o empresário investigado (e que só depois da delação o presidente passou a chamar de bandido) continuaram a acontecer, sabe-se lá com que finalidade. Esses fatos todos me convencem do acerto da decisão do Conselho Federal e da necessidade de afastamento do presidente Temer. Disse e repito: "não pode continuar na presidência quem conversa com investigado e ouve confissão de crime com a mesma tranquilidade com que conversa com a família no almoço de domingo." Se houve, ou não, a concordância com os acertos com o deputado cassado Eduardo Cunha, isso passa a ser irrelevante, tantos e tão graves são os outros fatos que o áudio e a delação revelam. Saí da sessão convencido do acerto da decisão do Conselho Federal da OAB. O comportamento do presidente ultrapassa, em muito, os limites do decoro e se traduz em prática, sim, de crime de responsabilidade. Receber um investigado em sua residência, de noite, sem registro de entrada desse investigado no Palácio residencial, já não pode ser aceito como normal. Ter a conversa que teve o presidente, menos ainda. Fiquei longe do olhar dela que me paralisa e envolve. Não fui ouvir meus discos, não fiz meus programas de final de semana. Mas que participei de uma decisão acertada, participei. Estava lá e vi.

    *Publicado originalmente no jornal O Estado do ES.

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    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/artigo-estava-la-e-vi/461030567

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