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29 de Maio de 2024
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    Atribuição de efeitos infringentes a embargos declaratórios interpostos anteriormente à tese adotada pelos tribunais superiores

    há 4 anos

    Não é novidade que o Código de Processo Civil de 2016 atribui maior força vinculante à jurisprudência, o que de certo modo contribui para matizar a estrutura clássica do sistema jurídico romano-germânico (civil law) do qual o direito brasileiro é tributário. As modificações aportadas pelo recente diploma processual refletem de maneira especialmente relevante no regime jurídico dos recursos, já que confere e aprimora importantes mecanismos para as instâncias superiores – ou mesmo diferentes órgãos de um mesmo tribunal – fazerem prevalecer o entendimento jurisprudencial predominante.

    Nesse sentido, os embargos de declaração tiveram ampliadas as suas hipóteses de cabimento, uma vez que o legislador atribuiu novo sentido à concepção de decisão judicial omissa.

    É verdade que o CPC de 1973 já estabelecia como passível de recurso aclaratório a decisão judicial obscura, contraditória ou omissa, da mesma maneira que o CPC de 2016 – o qual apenas adicionou a hipótese de erro material, que já estava implícita nos dispositivos da antiga legislação –; entretanto, o novo codex explicita que considera decisão omissa aquela que “deixe de se manifestar sobre tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de competência aplicável ao caso sob julgamento” (art. 1.022, parágrafo único, I).

    Dessa forma, resta claro que é embargável a decisão, singular ou colegiada, que deixe de aplicar o entendimento já assentado pelos tribunais. A dúvida que resta, contudo, diz respeito à aplicabilidade de tal dispositivo, com efeitos infringentes, nos casos em que a tese seja consolidada após a interposição dos embargos de declaração. Em tais casos, evidentemente, os aclaratórios não terão apontado a novel tese como o motivo da omissão.

    A 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal deparou-se com essa mesma situação em processo recentemente julgado. Tratava-se, na espécie, de questão relativa à terceirização de serviços, cujo entendimento da Suprema Corte restou consolidado em agosto de 2018 no sentido da sua licitude para todas as atividades empresariais (ADPF 324 e RE 958252).

    Reclamação ajuizada por empresa no ano de 2013 contestava acórdão proferido pelo TRT da 9ª Região em ação civil pública, movida pelo Ministério Público do Trabalho, o qual a condenava à obrigação de se abster de “realizar novas contratações de trabalhadores destinados à operação de cabines de pedágio por meio de empresa interposta (terceirização), sob pena de multa diária (...)”, sob a alegação de violação à Súmula Vinculante nº 10/STF.[1] A Ministra Relatora, Rosa Weber, negou seguimento ao feito em decisão monocrática de agosto de 2014, ao fundamento de inaplicabilidade da SV nº 10/STF ao caso concreto, o que foi mantido em posterior julgamento de agravo regimental, com acórdão proferido no dia 15/04/2016. Esta última decisão foi desafiada por embargos declaratório interpostos pela empresa prejudicada no dia 22/04/2016.

    Assim, entre a data da interposição dos aclaratórios (22/04/2016) e a do seu efetivo julgamento (05/05/2020), houve a pacificação da jurisprudência do STF para reconhecer a licitude da terceirização de todas as atividades empresariais. Já o fundamento dos embargos de declaração versava sobre matéria alheia à estrita licitude ou ilicitude do serviço interposto, visto que se concentrava sobre a aplicação da Súmula Vinculante nº 10, que tratava da violação à cláusula de reserva de plenário.

    A Ministra Relatora (acompanhada pelo Ministro Marco Aurélio) entenderam por bem rejeitar os embargos declaratórios, já que na data da sua interposição (em 2016) o entendimento jurisprudencial de 2018 (acerca da licitude da terceirização total) sequer existia. Todavia, não foi esse o entendimento majoritário da Turma.

    Em acórdão publicado em 18/06/2020, já transitado em julgado, o 1ª Turma decidiu, por maioria, nos termos do voto divergente do Ministro Alexandre de Moraes, dar provimento aos aclaratórios para a finalidade de reconhecer a omissão do acórdão proferido em sede de agravo regimental (15/04/2016) e atribuir-lhe efeitos infringentes para dar provimento ao agravo regimental na reclamação. Desse modo, garantiu-se a aplicação do já consolidado e mais recente entendimento jurisprudencial do STF a respeito da temática.

    Com efeito, nos termos do entendimento majoritário da 1ª Turma do STF, proferido no âmbito da Reclamação 15.724/PR, é possível atribuir efeitos infringentes a embargos declaratórios interpostos anteriormente à tese adotada pelo plenário dos tribunais superiores, o que é especialmente relevante em temáticas polêmicas, onde costuma ocorrer um espaço considerável de tempo entre a interposição dos embargos e o seu julgamento definitivo.


    [1] SV nº 10/STF: “Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, artigo 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público, afasta sua incidência, no todo ou em parte.”

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