Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
17 de Junho de 2024
    Adicione tópicos

    Caminhos possíveis para os servidores públicos do falido estado do Rio de Janeiro

    Publicado por Justificando
    há 8 anos

    Defensorar não é um ato sobrenatural. O Defensor Público se encontra inserido no mundo e, por essa razão, a coluna trata de um tema tão caro para a realidade do funcionalismo público fluminense: o pedido de paciência do governador em exercício para o integral pagamento dos servidores.

    Dito de outra e direta forma: é necessário problematizar o “beiço”, o calote suportado indevidamente pelos servidores públicos fluminenses. Não se mostra apropriado discorrer sobre as causas da carestia financeira. Quiçá os economistas possam melhor apresentar as razões para a mendicante situação posta. É, então, o momento de examinar os caminhos possíveis para aquelas que não possuem o direito à remuneração assegurada.

    Sem que constitua qualquer exagero retórico, a atual conjuntura permite invocar precisa lição de Norberto Bobbio, no sentido de que um dos poucos direitos absolutos consista na proibição de redução à condição de escravo.

    Ora, a dita pós-modernidade permite que antigos e abomináveis institutos possam adquirir novas roupagens. Não se verifica, tal como outrora, a existência de grilhões e açoites; porém, a ausência de remuneração devida permite realizar um paralelo com a condição de cativo.

    Há, por parte da “máquina estatal”, apropriação da mão-de-obra sem que exista, no momento devido, a contraprestação pactuada. Dito de outra maneira: há a prestação do serviço público sem que a remuneração seja entregue ao servidor.

    Frente a essa realidade, há de se indagar: o que fazer? Sem sombra de dúvida, a inércia não configura a resposta adequada, sendo certo que a necessária mobilização não pode ser restringida pela iminente realização de evento esportivo de repercussão global. Não se pode querer “esconder a sujeira debaixo de um simbólico tapete” e, dessa forma, “fazer bonito” para o concerto das nações.

    Não custa assinalar que um governo eleito pela maioria, ao ser empossado, não adquire um “cheque em branco” para adotar as medidas que melhor lhes aprouver. Existem balizas normativas intransponíveis e que não deveriam ser superadas, sob pena de persistir o drama da efetividade das normas jurídicas.

    Diante do mosaico estabelecido pela Constituição da República no que se refere ao direito à remuneração dos servidores públicos, não há a mínima possibilidade de a efetividade de normas jurídicas serem submetidas à exclusiva vontade do governante. Assim, a lógica do “ordenamento vacina”, isto é, que “pode ou não pegar”, não deveria mais obter espaço em uma verdadeira realidade democrática.

    Frente a essa triste realidade, sequer se pode tratar como novidade o recurso à desobediência civil, sendo certo que a história é repleta de exemplos bem sucedidos decorrentes de lutas pautadas pelo “simples” ato de não aceitar os desmandos de quem exerce o poder político.

    E quando se invoca à desobediência civil, é possível estabelecer uma dicotomia que não possui natureza excludente: a luta pela via judicial e a adoção de caminhos extrajudiciais, que serão apresentados a seguir de maneira ilustrativa.

    No âmbito judicial, de primeiro plano, é oportuno trazer para o debate a possibilidade de sequestro de verbas públicas. E, nesse instante, não se mostra cabível olvidar de um importante balizamento constitucional e que se encontra positivado no artigo 227, Constituição da República, que traduz a regra da prioridade absoluta da criança e do adolescente. Em assim sendo, em tempos de carestia, toda e qualquer atividade relacionada ao grupo vulnerável em questão deveria ter precedência no uso das verbas públicas.

    Ainda no âmbito judicial, mas também indo além dele é possível elencar o exercício do direito de greve. A greve constitui derradeiro instrumento de pressão contra a maior arbitrariedade praticada por um empregador: a recusa de adimplir com seu dever de remunerar os seus empregados. E mesmo que o movimento traga transtornos à população, a greve deve ser compreendida como um necessário instrumento de pressão. Logo, caso venha a ser provocado em razão de uma greve, o órgão jurisdicional competente deve repudiar qualquer tentativa de declaração de ilegalidade do movimento paradista.

    Afora isso, se mostram oportunas, quando não imprescindíveis, campanhas de conscientização da população sobre o drama imposto aos servidores públicos. Para tanto, a liberdade de expressão não poderá ser restringida. A recente iniciativa tomada por servidores públicos, que guarneciam faixa de “boas vindas” no aeroporto e ali apontavam para o caótico quadro do funcionalismo público (clique aqui) há de ser vista como um modelo de inconformismo e que, portanto, deve ser replicado. Ademais, se mostra questionável editorial de periódico – O GLOBO do dia 29 de junho de 2016 (clique aqui) que através do título “A irresponsabilidade de jogar contra a Rio-2016”, questionou publicamente a postura assumida por policiais e bombeiros que tão-somente exerceram o seu direito de protestar. Valendo-se do termo empregado pelo jornal, indigesta é a situação de quem não pode honrar seus compromissos, pois o Estado sequer consegue arcar com a sua folha de pagamento.

    É chegado o momento de concluir. Talvez a frustração tome conta do leitor, uma vez que não foram traçadas trilhas seguras para resolver o grave quadro imposto ao funcionalismo público fluminense. Todavia, neste momento de dita insegurança financeira, todo e qualquer passo deverá ser pautado pelo inconformismo. Independentemente da dimensão do evento esportivo que em breve será realizado, não podem os servidores públicos fluminenses optarem pela inércia, sob pena de receberem vergonhosa “medalha de lata”, símbolo máximo daqueles que se acorvadaram.

    Eduardo Januário Newton é Defensor Público do estado do Rio de Janeiro. Foi Defensor Público do estado de São Paulo (2007-2010). Mestre em direito pela UNESA. E-mail: newton.eduardo@gmail
    Foto: Mídia Ninja
    • Sobre o autorMentes inquietas pensam Direito.
    • Publicações6576
    • Seguidores948
    Detalhes da publicação
    • Tipo do documentoNotícia
    • Visualizações163
    De onde vêm as informações do Jusbrasil?
    Este conteúdo foi produzido e/ou disponibilizado por pessoas da Comunidade, que são responsáveis pelas respectivas opiniões. O Jusbrasil realiza a moderação do conteúdo de nossa Comunidade. Mesmo assim, caso entenda que o conteúdo deste artigo viole as Regras de Publicação, clique na opção "reportar" que o nosso time irá avaliar o relato e tomar as medidas cabíveis, se necessário. Conheça nossos Termos de uso e Regras de Publicação.
    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/caminhos-possiveis-para-os-servidores-publicos-do-falido-estado-do-rio-de-janeiro/359821914

    0 Comentários

    Faça um comentário construtivo para esse documento.

    Não use muitas letras maiúsculas, isso denota "GRITAR" ;)