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3 de Maio de 2024

Carência para receber devolução por cancelamento de título de capitalização é ilegal, diz Terceira Turma

há 11 anos

É ilegal a cláusula que estipula prazo de carência de 12 meses para o recebimento dos valores de títulos de capitalização, quando há cancelamento por desistência antecipada ou inadimplência do consumidor no primeiro ano de vigência do contrato. O entendimento é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que, por maioria, negou provimento ao recurso da Real Capitalização e manteve acórdão da Justiça paulista.

Prevaleceu o voto da ministra Nancy Andrighi, para quem a cláusula ultrapassa os limites do direito. Ela destacou que a fixação de um prazo de carência não é da essência dos títulos de capitalização, como a Real Capitalização alegava, e que não há semelhança entre estes contratos e os de consórcio.

A posição é oposta ao que foi decidido em 2011 pela Quarta Turma do STJ no julgamento do REsp 1.216.673 (leia aqui). Juntas, as duas Turmas compõem a Segunda Seção, que analisa as questões de direito privado no Tribunal.

Desvantagem excessiva

A ação civil pública foi ajuizada pela Associação Nacional de Defesa da Cidadania e do Consumidor (Anadec). Em primeiro grau, foi declarada a nulidade da cláusula do contrato padrão, em razão da desvantagem excessiva ao consumidor pela dupla penalidade: a redução do valor a restituir e o prazo.

O juiz determinou ainda que o prazo de carência para devolução dos valores do consumidor desistente ou inadimplente seja de 15 dias a partir da data em que pleiteada a devolução. A sentença também fixou multa diária de R$ 10 mil em caso de descumprimento. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) apenas reduziu o valor da multa.

Consórcios

A Real Capitalização recorreu ao STJ. O relator, ministro Sidnei Beneti, considerou que a cláusula contestada não é abusiva, uma vez que se encontra em conformidade com a legislação específica aplicável à espécie, bem como redigida de forma clara e precisa.

Enfatizou, também, que a retenção dos valores pelo prazo de carência não busca penalizar o consumidor, mas garantir o equilíbrio atuarial dessa modalidade de contrato, semelhante ao que já fora reconhecido e vem sendo aplicado pelo STJ nos contratos de consórcio.

Dinheiro indisponível

A ministra Nancy Andrighi, porém, apresentou voto divergente. Ela ressaltou que, do ponto de vista econômico e social, esses títulos de capitalização, ainda que não representem investimento, têm sua importância no contexto brasileiro, em que o grande público bancário não tem a cultura de investimento e poupança, e adere ao contrato motivado pela possibilidade de premiação.

Nancy Andrighi enfatizou que a Superintendência de Seguros Privados (Susep), por meio da Circular 365/08, em seu artigo 23, define que a fixação de prazo de carência para resgate antecipado é apenas facultada às sociedades de capitalização. Ela também observou que, ao se desligar do título antes do fim da vigência contratada, independentemente de prazo de carência, o valor a ser devolvido ao aplicador é substancialmente inferior àquele que seria devido ao final do contrato.

Embora essa não seja uma penalidade, mas decorrência da formatação essencial do contrato, há um pesado prejuízo financeiro de modo a desestimular a desistência voluntária do contrato, afirmou.

Capital individual

Quanto a outro ponto, a ministra entendeu que os títulos de capitalização não são como os contratos de consórcio. Nos consórcios, como o fundo formado a partir da contribuição dos integrantes é de propriedade conjunta de todos, o interesse do grupo prevalece sobre o interesse individual do consorciado. Daí, a jurisprudência do STJ de que o desistente de consórcio deverá aguardar o término do grupo para devolução de suas parcelas.

A ministra explicou, porém, que, no caso dos títulos de capitalização, há a formação de um grupo que perdura, ainda que de forma flutuante. A cada dia há a adesão de novos participantes e a retirada de outros que já cumpriram o prazo contratado. O capital constituído a partir da cota de capitalização é individual e não tem relação com o dos demais participantes, disse. Por isso, na visão da ministra, não se deve estender o entendimento jurisprudencial dos consórcios aos títulos de capitalização.

Abuso de direito

O valor aplicado no título de capitalização é dividido em três cotas, conforme a Susep: cota de sorteio (para compor o prêmio), cota de carregamento (para custos e lucros da instituição) e cota capitalizada (que é devolvida ao final da vigência do título, acrescida de correção monetária). O prazo de carência nos casos de cancelamento é aplicado a esta última, única passível de devolução.

A ministra Nancy assinala que antes dos 12 primeiros meses essa cota representa, em geral, um pequeno percentual de cada aplicação, nos termos da legislação aplicável. Além disso, o resgate antecipado da cota de capitalização não prejudica os demais titulares, tampouco a sociedade de capitalização, já que não se comunica com as outras cotas.

Concluindo, a relatora afirmou que a cláusula contraria os interesses dos titulares de títulos de capitalização, o que afronta o Decreto-Lei 261/67, segundo o qual o controle da Susep sobre as sociedades de capitalização deve ser exercido no interesse dos portadores dos títulos. Assim, Nancy conclui que não apenas a cláusula é abusiva, mas a própria norma infralegal (a Circular da Susep) que faculta a fixação de carência também é ilegal.

Acompanharam o entendimento da ministra Nancy, negando o recurso, os ministros Paulo de Tarso Sanseverino e Villas Bôas Cueva.

Leia também:

Carência para devolução de valor investido em plano de capitalização não é abusiva

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2 Comentários

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É possível resgatar um título de capitalização doze anos após a desistência? Paguei durante um ano, em 2009. Será que consigo resgatar hoje ao menos parte do valor? Foi pelo Santander. Alguém aí pode me informar? continuar lendo

O STJ, declara através do juíz que os valores declarados em títulos de capitalização não são drevolvidos ao consumidor ,ao meu enteder,mesmo pedindo cancelamento no dia seguinte ,o consumidor é lezado,somente o Banco ganha. Aconteceu comigo, estive no banco no dia 25/02/22, meu objetivo era abrir uma conta poupança,pois tinha em conta correnta 10.000,00, o gerente conseguiu me induzirr ao erro para aplicar em capitalização,quando cheguei em casa me dei conta do grande erro,liguei para ele e pedi cancelamento,ele disse que teria que pagar várias taxas no valor total de 1.000,00 reais, até agora não foi cancelado, mesmo falando com ele que pago as taxas ,o gerente alega que o sistema não tem como cancelar,então, acredito que somente a justiça pode resolver esse meu ato desastroso.Realmente, não estava bem psicologicamente nesse dia.A minha inteligência falhou, caí na armadilha. Estou chateada comigo mesmo.Infelizmente! continuar lendo