Caso VW e Elis Regina: desafios pela integração da inteligência artificial, direitos da personalidade e públicidade
Fonte: Divulgação/Wolksvagen
Com a nova propaganda de divulgação da nova Kombi, a Volkswagen trouxe às redes sociais um debate sobre o uso da ferramenta deepfake. A tecnologia usada na campanha é capaz de adulterar o rosto de uma pessoa, desta forma, a VW "ressuscitou" a cantora Elis Regina, que morreu em 1982, colocando-a dirigindo uma Kombi e cantando Como Nossos Pais, de Belchior, ao lado da filha, Maria Rita. Embora muitos tenham se emocionado com o dueto, outros levantaram o questionamento ético sobre a manipulação da imagem de uma pessoa falecida em um contexto fictício.
Considerando as recentes discussões trazidas pela inteligência artificial, os primeiros posicionamentos jurídicos têm sido no sentido de que cabe aos juristas utilizar-se das doutrinas e regras já existentes para a formação de jurisprudências. Neste sentido, em notícia disponível no portal no IBDFAM, Patrícia Corrêa Sanches, presidente da Comissão Nacional de Tecnologia do Instituto Brasileiro de Direito de Família, se expõe:
“Tenho me posicionado no sentido de que os direitos da personalidade, como o direito à imagem, por exemplo, não deixam de existir com a morte – apenas encerram seu desenvolvimento natural – e, por isso, precisam ser respeitados e mantidos em acordo com a vontade do seu titular, tal qual enquanto vivia. Portanto, nada, nem tampouco a tecnologia, pode vilipendiar essa proteção”
Assim, em relação ao direito de imagem, por exemplo, entende ser esse um direito fundamental e que não se destaca do indivíduo pos mortem, uma vez que é resultado de uma construção durante todo o percurso da vida. Consequentemente, a decisão sobre a exploração comercial da imagem daqueles que já se foram, quando não convencionado por este em vida, pertence aos herdeiros e deve encontrar limites na proteção da imagem construída pela pessoa socialmente em vida.
No entanto, é importante pontuar que a atual legislação disciplina a sucessão dos bens patrimoniais do de cujus e, em mesma redação, trata a imagem como um direito da personalidade, de caráter intransmissível. Desta forma, não é possível a aplicação da exata lógica para a negociação de duas situações diferentes, sendo necessário, na falta de regulamentação específica, analisar o caso concreto e utilizar-se dos dispositivos existentes para uma interpretação englobante da nova situação.
Quanto a campanha publicitária estrelada pela cantora Elis Regina, o Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar) deu início a uma investigação ética e moral sobre a campanha, com foco em verificar, a luz da regulamentação existente, a ética em trazer de volta a "vida" uma personalidade. Ademais, a investigação deve conferir o direito dos herdeiros em autorizarem a recriação da imagem, a possível violação dos princípios de respeitabilidade e veracidade e se a campanha deveria ter comunicado aos espectadores sobre o uso da inteligência artificial, já que pode ter levado a confundir ficção com a realidade.
A representação ética sobre a publicidade será julgada nas próximas semanas por uma das câmaras do conselho de ética do Conar, mas sabemos que, com certeza, deve trazer importantes reflexões para as futuras situações envolvendo direitos da personalidade, inteligência artificial e publicidade. Criando precedente para futuros debates sobre a intersecção dessas áreas, especialmente no contexto brasileiro.
Por Nathalia C. de Mello Vieira, Advogada OAB/PR 112.820
Referências:
IBDFAM: Caso Elis Regina: o impacto da inteligência artificial na preservação da memória. Disponível em: < https://ibdfam.org.br/noticias/10970/Caso+Elis+Regina%3A+o+impacto+da+intelig%C3%AAncia+artificial+n.... Acesso em: 18 jul. 2023.
CNN, D. Conar abre representação ética contra propaganda da Volkswagen com Elis Regina. Disponível em: . Acesso em: 18 jul. 2023.
7 Comentários
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Vai Besta, Faz Homenagem faz kkkkkkkkkkkk
As vezes o pessoal do direito ultrapassa os limites.
Gente, calma, foi só uma homenagem bem intencionada kkkkk continuar lendo
Dra. Nathalia, muito bom o artigo, parabéns. O assunto da moda é IA mas vejamos... Quando o cantor norte americano Nat King Cole faleceu, décadas atrás, sua filha era ainda uma criança, após uns 20 anos (não lembro exatamente o tempo) com os recursos da época fizeram uma montagem dos dois cantando juntos, aqui no Brasil ocorreu a mesma coisa com o cantor Paulo Sérgio, a montagem realizada colocou pai e filho cantando juntos e todo mundo aplaudiu.
Colocar Elis Regina e Maria Rita cantando juntas numa kombi é sensacional!!!! Para quem era fã da Elis e aprecia a voz de Maria Rita então.... Sem falar nos fãs da Kombi.... O Conar devia se preocupar com comerciais mais nocivos ao público como aqueles em que certas personalidades induzem as pessoas a comprar determinado produto dizendo que é bom quando na verdade são porcarias!!! continuar lendo
Positivamente correto. Nenhum desmerecimento ou maledicência contra a VW pois deu respeitável imagem de nossa querida cantora O Estado precisa se preocupar mais em retirar drogas nocivas ao brasileiro quê é comercializada a céu aberto, isto sim .
Tenho dito
At Álvaro Araujo continuar lendo
Fala sério, será que esse pessoal não tem nada de mais útil a fazer? Onde está a ofensa, a ilicitude, o desrespeito, enfim, onde está o problema em homenagear uma personalidade pública como a Elis Regina? Na minha ótica, se os familiares, no caso específico, sua filha Maria Rita, não se opôs e ainda autorizou, ninguém mais tem competência ou mesmo direito de questionar seja lá o que for. continuar lendo
A intransmissibilidade do direito à imagem deve ser interpretada à luz da sensatez. Se a revivência da imagem, como no caso, apraz aos familiares da falecida e se manifestamente em nada diminui a memória da mesma, onde se poderia encontrar algum óbice aceitável? Podem discutir à vontade, mas é fazer tempestade em copo dágua, continuar lendo