Diploma é obrigatório para registro de jornalista
STJ profere decisão a favor da obrigatoriedade do diploma para jornalistas
Para ser registrado como jornalista, o profissional deve atender a exigência legal do diploma de nível superior em jornalismo. A decisão foi da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em mandado de segurança impetrado pelo médico José Eduardo Marques contra portaria do Ministério do Trabalho e Emprego. A decisão da Seção foi unânime e seguiu integralmente o voto do relator do processo, ministro José Delgado.
Marques atuava em um programa sem fins lucrativos sobre orientação da saúde chamado Prevê Saúde, em Bauru, São Paulo. O médico tinha um registro precário de jornalista, concedido antecipadamente por ação civil pública. A Portaria nº 03 , de 2006, do Ministério do Trabalho e Emprego declarou que os registros feitos por antecipação de tutela referentes a ação civil pública (nº 2001.61.00.025946-3) eram inválidos, por não exigirem o diploma em nível superior de Comunicação Social. A portaria também determinou que as delegacias regionais do trabalho deveriam cancelar os registros já emitidos.
O médico ajuizou ação com um pedido de liminar, alegando que a portaria seria ilegal e contrária ao artigo 5º , inciso XIII , da Constituição Federal , que autoriza o livre exercício de qualquer ofício, trabalho ou profissão desde que atendidas as exigências legais. A liminar foi concedida, mas a União interpôs apelação da decisão. Sustentou que a portaria era legal e que a liminar não teria fundamentação. O Tribunal Regional Federal da 3ª Região aceitou o argumento da União e reformou a sentença, cassando o registro.
Diante da decisão, a defesa do médico entrou com mandado de segurança no STJ. O Ministério Público Federal se manifestou favorável à concessão da liminar por enxergar o risco de danos irreparáveis e de demissão sumária.
Em seu voto, o ministro José Delgado destacou que a profissão de jornalista é regulada pelo Decreto-Lei 972 , de 1969 , com alterações de leis subseqüentes e que, desde então, exige-se o diploma de nível superior para o seu exercício. Para o magistrado não há dúvidas de que o artigo 5º , inciso XIII , da Constituição condiciona o exercício profissional ao atendimento das exigências legais. Também destacou que o artigo 5º , inciso I , do Decreto 83.284 , de 1979 , cria o registro especial para o colaborador e que Marques se enquadraria perfeitamente no conceito. O colaborador é aquele que, sem vínculo empregatício e mediante remuneração, produz trabalhos técnicos, científicos ou culturais de acordo com sua especialização.
Segundo o ministro, o jornalismo encontra-se cada vez mais diversificado e formados em outras áreas naturalmente acabam por se dedicarem à elaboração de artigos e matérias específicas de sua formação. Não seria razoável cercear os textos desses profissionais. Por outro lado, a figura do colaborador garante a livre atividade dessas pessoas e atende a exigência do diploma para os jornalistas, concluiu. O relator destacou ainda que a Portaria 03 é legal e não prejudica o interesse público, por não cercear a livre manifestação do pensamento, criação ou opinião, direito constitucionalmente garantido.
Com esse entendimento, o ministro negou o mandado de segurança, no que foi acompanhado à unanimidade pelos demais ministros da Seção.
Registro precários não valem mais
Os registros precários foram declarados sem efeito por decisão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, em outubro de 2005, ao julgar o mérito de recurso relacionado com uma ação civil pública proposta pelo Ministério Públçico Federal de São Paulo contra a exigência do diploma. Por isso, todos os registros precários foram anulados, fato que foi pouco divulgado pelos grandes empresas de comunicação, interessadas em derrubar os direitos conquistados pela categoria dos jornalistas. A profissão vive hoje altíssimo índice de "precarização", com o descumprimento crescente da legislação profissional e trabalhista.
O Sindicato dos Jornalistas de São Paulo produziu, há dois anos, uma "manual" contra a "precarização" das relações de trabalho na profissão. Foi feita uma campanha para o cumprimento de direitos básicos dos jornalistas, como registro em CTPS, inscrição na Previdência Social, além dos alertas contra os abusos na utilização de "colaboradores", "free lancers" e estagiários.
Decisão segue padrão legislativo e jurisprudencial brasileiro
Praticamente todas as profissões são regulamentadas no Brasil. As legislações profissionais vigentes estabelecem pré-requistos relacionados com a formação na maioria das atividades. Só recentemente, por exemplo, a profissão de Educação Física passou a ter o exercício fiscalizado, com a criação de conselhos regionais e federais. Até pouco tempo, apesar de existirem centenas de faculdades de Educação Física em funcionamento no País, ainda era possível encontrar academias de ginástica sem profissionais habilitados.
Existem dezenas de projetos de lei no Congresso propondo a regulamentação de profissões como Agente da Propriedade Industrial, Esteticista e "Sommelier", que no Brasil será chamado de "Chefe de Vinho". A profissão de chefe de vinho poderá ser regulamentada, caso o Projeto de Lei 929 /03 de autoria do deputado Júlio Lopes (PP-RJ) seja aprovado. Pelo projeto, a profissão deve ser exercida por portadores de comprovantes de habilitação em cursos ministrados por instituições oficiais ou privadas ou aos que comprovem o exercício da profissão por três anos.
Segundo a proposta, as atividades de chefe de vinho é o aconselhamento do serviço de vinho ao consumidor em estabelecimentos que servem esta bebida, informando sobre as características do produto; e o ensino nos cursos básicos, aspirantes e profissionais. O piso salarial dos profissionais seria fixado em seis salários mínimos e a jornada de trabalho seria de seis horas diárias, respeitando o descanso semanal remunerado.
Assim, o resultado da ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal de São Paulo, caso fosse acolhida, iria transformar os jornalistas em "párias" do sistema profissional brasileiro. Todas as pessoas, sem qualquer distinção, de qualquer formação acadêmicia (ou sem qualquer formação, como determinava a liminar), poderiam exercer a profissão de jornalista. Mas os jornalistas não podem exercer outras profissões, que exigem pré-requisitos (diploma, inscrição em conselhos, ordens, etc.).
Conspiração do silêncio
Depois da decisao do TRF da 3ª Região, em outubro de 2005, o tema desapareceu subitamente das páginas dos grandes diários e de algumas emissoras de rádio e TV. O acórdão do TRF3 não foi divulgado em nenhum portal dos grandes veículos de comunicação. A "pauta" só voltou ao noticiário depois de algumas cautelares chegarem aos tribunais superiores.
A Folha de S. Paulo voltou a abrir amplos espaços para o tema - desde que os articulistas fossem contrários à regulamentação dos jornalistas. A insistência com que alguns articulistas revolvem surrados argumentos, muitos deles inspirados em "pareceres" de organizações patronais estrangeiras, já vencidos nos tribunais brasileiros, fez surgir a expressão "juristas com legisfobia" - que é a aversão às leis brasileiras.
Processo: MS 11796/DF
Leia, abaixo, a íntegra da decisão:
08/11/2006
"CERTIDÃO DE JULGAMENTO
PRIMEIRA SEÇÃO
Número Registro: 2006/0094065-5 MS 11796 / DF
PAUTA: 08/11/2006 JULGADO: 08/11/2006
Relator
Exmo. Sr. Ministro JOSÉ DELGADO
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro FRANCISCO FALCÃO
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. FLAVIO GIRON
Secretária
Bela. Carolina Véras
AUTUAÇÃO
IMPETRANTE : JOSÉ EDUARDO MARQUES
ADVOGADO : VALDOMIR MANDALITI E OUTROS
IMPETRADO : MINISTRO DE ESTADO DO TRABALHO E EMPREGO
ASSUNTO: Administrativo - Ato - Portaria - Suspensão
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia PRIMEIRA SEÇÃO, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão
realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
" A Seção, por unanimidade, denegou a segurança , julgou prejudicado o agravo regimental
interposto pela União e cassou a liminar, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. "
A Sra. Ministra Eliana Calmon e os Srs. Ministros João Otávio de Noronha, Teori Albino Zavascki, Castro Meira, Denise Arruda, Humberto Martins e Herman Benjamin votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Luiz Fux.
Brasília, 08 de novembro de 2006
Carolina Véras
Secretária Decisao de 01/08/2006:
Superior Tribunal de Justiça
MANDADO DE SEGURANÇA Nº 11.796 - DF (2006/0094065-5)
RELATOR : MINISTRO JOSÉ DELGADO
IMPETRANTE : JOSÉ EDUARDO MARQUES
ADVOGADO : VALDOMIR MANDALITI E OUTROS
IMPETRADO : MINISTRO DE ESTADO DO TRABALHO E EMPREGO
DECISÃO
Vistos, etc.
SAID YUSUF ABU LAWI e VALDOMIR MANDALITI atravessam petições (fls. 189/227e 276/314), respectivamente, nos presentes autos, habilitando-se na qualidade de litisconsortes ativos facultativos. Sustentam que o seu ingresso na ação se justifica tendo em vista a similitude fática e jurídica com o caso do impetrante José Eduardo Marques, além da observância do princípio da economia processual e da necessidade de serem evitadas decisões conflitantes em casos idênticos.
Relatados, decido.
Do compulsar dos autos, verifica-se que o presente mandamus foi impetrado por José Eduardo Marques contra a Portaria nº 03 , de 12/01/2006 , do Exmo. Sr. Ministro de Estado do Trabalho e Emprego.
A liminar foi deferida (fls. 74/75) determinando-se a suspensão dos efeitos da referida Portaria, assegurando ao impetrante a continuidade do exercício da atividade de colaborador de programa de televisão sem a cominação das penas de multa ou prisão.
O que pretendem os autores das petições ora examinadas, de forma absolutamente clara, é beneficiarem-se dos efeitos da medida liminar que foi concedida ao impetrante José Eduardo Marques.
Observa-se que, anteriormente, essas mesmas pessoas (Said Yusuf Abu Lawi e Valdomir Mandaliti) já haviam impetrado mandado de segurança nesta Corte, tendo sido distribuídos à relatoria da eminente Ministra Eliana Calmon, que indeferiu as liminares vindicadas (MS 11.795/DF e MS 11.775/DF) . Posteriormente, solicitaram desistência dos feitos, tendo sido homologados os pedidos pela referida Ministra (fls. 235 e 322 - decisões datadas de 31/05/06), habilitando-se nos presentes autos como litisconsortes.
É inadmissível tal pretensão, tratando-se de conduta que não pode ser tolerada pelo Poder Judiciário, e que, infelizmente, vem sendo cada vez mais praticada no foro brasileiro.
A admissão de litisconsórcio facultativo ulterior ofende o princípio do juiz natural assegurado pela Constituição Federal (art. 5º, XXXVII e LIII).
A formação do litisconsórcio ativo facultativo tem lugar e momento processual adequado: na exordial, quando do ajuizamento da ação.
Indefiro os pedidos.
Publique-se. Intimem-se.
Após, venham-me conclusos os autos.
Brasília (DF), 26 de junho de 2006.
MINISTRO JOSÉ DELGADO
Relator"
DJ: 01/08/2006
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