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5 de Maio de 2024
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    Em que consiste a teoria da autocolocação em risco no direito penal? - Joaquim Leitão Júnior

    há 16 anos

    A autocolocação sob perigo existe nas circunstâncias em que alguém age de modo a estabelecer uma situação de perigo para si próprio ou se expõe a um perigo já ocorrente.

    Deveras, conforme ensina o jurista W. FRISCH em sua obra, "haverá autocolocação sob perigo sempre que a vítima, consciente ou inconsciente, participe, com sua própria conduta, na realização do resultado juridicamente protegido ". (W. FRISH, Tipo Penal e Imputación Objetiva, Colex, Madrid, 1995).

    Essa autocolocação da vítima em perigo pode existir posteriormente a uma conduta do partícipe ou simultaneamente a esta.

    Convém ilustrar ainda, que a aludida teoria é bem trabalhada dentro da teoria da imputação objetiva e do princípio da confiança.

    A sua importância se mostrou num caso concreto em que o Superior Tribunal de Justiça abordou expressamente a teoria da autocolocação em risco, retirando a responsabilidade atribuída a outrem - no caso, a Comissão de Formatura, já que a própria vítima teria contribuído diretamente no resultado de sua morte. Vejamos o aresto proferido pela aludida Corte de Justiça:

    "PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS . HOMICÍDIO CULPOSO. MORTE POR AFOGAMENTO NA PISCINA. COMISSÃO DE FORMATURA. INÉPCIA DA DENÚNCIA. ACUSAÇÃO GENÉRICA. AUSÊNCIA DE PREVISIBILIDADE, DE NEXO DE CAUSALIDADE E DA CRIAÇÃO DE UM RISCO NÃO PERMITIDO. PRINCÍPIO DA CONFIANÇA. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. ATIPICIDADE DA CONDUTA. ORDEM CONCEDIDA. 1. Afirmar na denúncia que"a vítima foi jogada dentro da piscina por seus colegas, assim como tantos outros que estavam presentes, ocasionando seu óbito"não atende satisfatoriamente aos requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal , uma vez que, segundo o referido dispositivo legal,"A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas". 2. Mesmo que se admita certo abrandamento no tocante ao rigor da individualização das condutas, quando se trata de delito de autoria coletiva, não existe respaldo jurisprudencial para uma acusação genérica, que impeça o exercício da ampla defesa, por não demonstrar qual a conduta tida por delituosa, considerando que nenhum dos membros da referida comissão foi apontado na peça acusatória como sendo pessoa que jogou a vítima na piscina. 3. Por outro lado, narrando a denúncia que a vítima afogou-se em virtude da ingestão de substâncias psicotrópicas, o que caracteriza uma autocolocação em risco, excludente da responsabilidade criminal, ausente o nexo causal. 4. Ainda que se admita a existência de relação de causalidade entre a conduta dos acusados e a morte da vítima, à luz da teoria da imputação objetiva, necessária é a demonstração da criação pelos agentes de uma situação de risco não permitido, não-ocorrente, na hipótese, porquanto é inviável exigir de uma Comissão de Formatura um rigor na fiscalização das substâncias ingeridas por todos os participantes de uma festa. 5. Associada à teoria da imputação objetiva, sustenta a doutrina que vigora o princípio da confiança, as pessoas se comportarão em conformidade com o direito, o que não ocorreu in casu, pois a vítima veio a afogar-se, segundo a denúncia, em virtude de ter ingerido substâncias psicotrópicas, comportando-se, portanto, de forma contrária aos padrões esperados, afastando, assim, a responsabilidade dos pacientes, diante da inexistência de previsibilidade do resultado, acarretando a atipicidade da conduta. 6. Ordem concedida para trancar a ação penal, por atipicidade da conduta, em razão da ausência de previsibilidade, de nexo de causalidade e de criação de um risco não permitido, em relação a todos os denunciados, por força do disposto no art. 580 do Código de Processo Penal". (Superior Tribunal de Justiça. Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima. Habeas Corpus nº 46.525 - MT (2005/0127885-1).

    Conclui-se, finalmente, que a autocolocação em risco - se observados os seus requisitos - opera como excludente do nexo causal, e por conseqüência, da responsabilidade criminal.

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