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7 de Maio de 2024

Especialista em Direito Digital discute PL das Fake News

ano passado

Resumo da notícia

O Projeto de Lei nº 2630, em pauta no Congresso Nacional, tem como proposta combater a disseminação de desinformação e promover a transparência nas plataformas digitais e aplicativos de mensagem. O PL, proposto pelo deputado federal Orlando Silva (PCdoB-SP), atualmente está em fase de edição e teve sua votação adiada na Câmara dos Deputados. Em entrevista, a advogada e professora da Faculdade Baiana de Direito Maria Clara Seixas responde questões que envolvem o referido projeto de lei. Seixas é sócia do escritório 4S Advogados e leciona na Pós-Graduação em Direito Digital da Baiana.

1. O que muda em termos práticos com a aprovação do PL 2630?

Em tempos de intensa comunicação digital, muita coisa mudaria com a aprovação! Primeiro é importante sinalizar que apesar do apelido, o nome do PL 2630/2020 oficial não é PL das Fake News, e sim Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet. Este projeto de lei tem como objetivo regular o uso das plataformas digitais (como redes sociais, aplicativos de trocas de mensagens e ferramentas de busca), tendo um escopo muito mais amplo e complexo do que apenas combater a desinformação.

As empresas de tecnologia passariam a ter uma obrigação de transparência e fiscalização muito maior do que hoje em dia é exigido pelo Marco Civil da Internet e pela Lei Geral de Proteção de Dados, como é o caso da previsão dos relatórios de avaliação de risco sistêmico - que deverão ser feitos pelas empresas e serão usados para a fiscalização das mesmas.

A título de exemplo, o PL cria novas regras para a moderação de conteúdo por parte das plataformas digitais, o que significa que eventuais exclusões de conteúdos e contas de usuários poderão ser questionadas e estes deverão ter o direito de recorrer das decisões tomadas pelas plataformas. São criadas também uma série de obrigações para as big techs no âmbito do oferecimento dos seus serviços e na moderação dos conteúdos publicados nas plataformas, este ponto, inclusive, fonte de fortes debates no que se refere à diferenciação de conteúdos legítimos e conteúdos de natureza ilícita e quem poderia/deveria fazer esta diferenciação.

2. Em quais situações as plataformas e aplicativos podem ser responsabilizados pelo conteúdo publicado? E quais as medidas punitivas previstas?

Atualmente, de acordo com o Marco Civil da Internet, via de regra as plataformas digitais não têm responsabilidade pelo conteúdo criado por terceiros e compartilhado em suas plataformas a menos que descumpram ordem judicial para a remoção. Com isso, não há um forte incentivo legal para que as plataformas atuem no combate à publicação de conteúdos ilícitos, como fake news, de incitação à violentos, antidemocráticos ou de qualquer outra forma criminosos.

Já com o atual texto do PL, isso iria mudar uma vez que elas passariam a ter obrigações de dever de cuidado, especialmente na identificação de contas e conteúdos inautênticos ou ilícitos, ou quando oferecerem serviços de impulsionamento.

As medidas punitivas previstas no PL como sanções administrativas vão desde advertência, com indicação de prazo para adoção de medidas corretivas, até multa de até 10% do faturamento do grupo econômico no Brasil no seu último exercício.

3. Na proposta, a imunidade parlamentar é estendida para as redes sociais. O que exatamente isso quer dizer?

A imunidade parlamentar é prevista na nossa Constituição Federal no art. 53, dispondo que os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos. Essa garantia representa uma garantia para a função, para o cargo portanto e não para a pessoa em si. A mencionada proposta seria de que os pronunciamentos feitos pelos parlamentares também em redes sociais fossem considerados invioláveis, tanto no âmbito civil como penal.

Apesar do STF ter entendimentos no sentido de que imunidade não equivale a impunidade (palavras da ministra Rosa Weber) e que a propagação deliberada de fake news poderia ser entendida como abuso das prerrogativas asseguradas a membro do Congresso Nacional, este ponto do PL é muito criticado pois significa para muitos um "carta em branco" dada aos parlamentares para a desinformação e manipulação política.

Por outro lado, como são os próprios "beneficiários" da imunidade que estão decidindo sobre manter ou não o texto no PL, não é difícil intuir o quanto que este dispositivo terá força na votação do projeto.

4. A lei é propositiva no que diz respeito a formas de apurar e prevenir notícias falsas? Em outras palavras, há orientações sobre como conduzir o “fact checking”?

É importante observar que não há um procedimento específico de "fact checking" previsto no PL, no sentido de verificar a veracidade de conteúdos publicados. Em outras palavras, o texto atual não cria um "ministério da verdade". O foco é mais na responsabilização, ou seja, na hipótese de informações ilegítimas, quem deve ser responsabilizado.

E em tempos de polarização política, radicalismo ideológico, contas inautênticas e uso de robôs em contas automatizadas, falar em "fact checking" é um imenso desafio. Mas a lei é positiva no sentido de que é necessário algum tipo de regulação do que vem ocorrendo nas plataformas digitais. Inibir a propagação de fake news, impulsionamento de conteúdos violentos e ilegais e a manipulação por meio de desinformação nas redes sociais e serviços de mensageria deve ser visto como urgência social.

Por outro lado, a forma de se fazer este tipo de controle, quais os incentivos que serão instituídos, pode fazer com que as plataformas atuem de forma contrária à liberdade de expressão (como censurando conteúdos legítimos para não incorrer em riscos legais).

O ajuste desta engrenagem é que é o ponto mais delicado e, não por outro motivo, diferentes atores têm se manifestado para conseguirem controlar a narrativa do PL.

5. Big Techs como a Google e a Meta têm feito campanha contra a aprovação da lei. Como você avalia as implicações disso?

Apesar de não haver qualquer surpresa, as recentes notícias de que as big techs estariam fazendo campanhas contra a aprovação da lei são bem sérias, mais precisamente pela forma que isso estaria sendo feito. É evidente que existe lobby e que as empresas de tecnologia podem buscar influenciar na construção do projeto de lei, mas tudo isso deve ser feito de forma legítima e transparente, e não por meio da manipulação dos seus usuários direcionando as informações às quais estes terão acesso. Pessoalmente, avalio este tipo de atitude como um abuso do poder que estas empresas possuem, indo de encontro não apenas a diversos dispositivos legais e os próprios termos de uso das plataformas, mas também com a imensa responsabilidade social que estas empresas deveriam possuir.

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Desinformação sempre existiu. E nunca foi considerado um enorme problema social, tal como está sendo propagado hoje. Existe uma narrativa política por trás disto.

A maneira mais eficaz de combater desinformação é disponibilizando cada vez mais informação. E, nisto, aproximar o receptor da informação cada vez mais da fonte primária. E a internet é o melhor lugar para isto, pois ela possibilita ultrapassar o intermediário (imprensa, revistas, blogs, influenciadores e etc.) e colocar o receptor da mensagem em contato direto com a fonte – sendo ele o protagonista da checagem de fatos.

Ocorre que o Projeto de Lei não reforça isto em nenhum momento. Não prevê, por exemplo, instrumentos como a verificação de contexto (atualmente sendo testada em uma rede social, o Twitter) a qual se explica uma possível desinformação agregando à mesma o conjunto de informações corretas, inclusive citações e links para que o leitor consulte e conclua pela informação correta. O PL, ao contrário, joga para um “Conselho de Transparência e Responsabilidade na Internet”, que nada mais é do que criar um “código de conduta” e fiscalizar as redes sociais e aplicativos de mensagens de acordo com aquilo que eles próprios definem como desinformação, discurso de ódio, ataques à honra e intimidação vexatória. Ele centraliza a decisão do que seria a desinformação e pressiona o intermediário (redes sociais, buscadores, mensageiros) a tomar medidas para bloquear determinado conteúdo, sem disponibilizar mais informação.

E estes “Conselhos”, historicamente na pratica brasileira, não passam de instrumentos políticos. Observe que a “representação” da sociedade civil é composta somente por cinco membros. Quem serão estes membros? Como serão escolhidos? Quantas pessoas no Brasil tem tempo sobrando para participar de conselhos? É óbvio que estarão ali pessoas com condições prévias de participar de tais conselhos, ou seja, serão “representantes” profissionais, que vivem para isto. Facilmente serão militantes partidários que farão parte dessa “representação”.

Por fim, me parece paradoxal dizer que as big techs estariam manipulando e direcionando as informações as quais o usuário terá acesso. Pois isto nunca aconteceu! O Google e o Telegram simplesmente colocaram uma mensagem dando a opinião deles, não impedindo ninguém de buscar informações que desejam. A imprensa, por outro lado, emite sua opinião toda hora, de forma extensiva e sistemática, sem oferecer contraditório, e não é taxada de estar manipulando e direcionando informações. Será porque a opinião é favorável ao Projeto de Lei? Pois o abuso de poder” pode ser facilmente caracterizado pelo fato de sua abrangência se dar em praticamente todo o território nacional, ainda mais se tratando de emissoras de televisão. No Google, por exemplo, depois de ler a opinião dele, você pode usar o próprio buscador para buscar outras fontes e até mesmo o Projeto de Lei na integra – e assim chegar a própria conclusão. Na televisão não: se uma informação for falsa, ou empregada com intuito manipular o receptor da mensagem, vai ficar por isso mesmo. Mas quem está abusando é quem dispõe de mais informações... continuar lendo