Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
2 de Maio de 2024
    Adicione tópicos

    Fiança ainda é entrave à liberdade de réu pobre

    Código de Processo Penal estabelece a isenção para suspeitos sem condições financeiras, mas falta de padronização por parte dos juízes dificulta a aplicação

    A discussão sobre a fiança ganhou um novo ingrediente. Diante do caso de um homem pobre preso por furto que não tinha R$ 830 para sair da cadeia, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que o acusado podia ganhar a liberdade provisória mesmo sem pagar a fiança. A regra já é velha conhecida dos juristas: o artigo 350 do Código de Processo Penal (CPP) estabelece a isenção da fiança para réus pobres. No entanto, a falta de um mecanismo eficiente de defesa dos réus carentes e a não padronização dos procedimentos dos juízes dificultam a aplicação do artigo.

    A fiança é um instituto jurídico criado em 1941 como uma espécie de garantia dada pelo preso que atende aos requisitos da liberdade provisória. A taxa varia de 1 a 200 salários mínimos (leia ao lado sobre aumento do teto da fiança), mas pode ser reduzida ou aumentada nesses mesmos limites de acordo com a condição financeira do réu.

    Não há um estudo sobre a faixa salarial dos presos. O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) informou que o perfil econômico da população carcerária brasileira é objeto de uma pesquisa que ainda não foi concluída. O presidente da Associação dos Magistrados do Paraná (Amapar), Gil Francisco de Paula Xavier Fernandes Guerra, observa que, como a maioria dos encarcerados é pobre, a decisão do STJ é boa. A lei prevê a redução do valor da fiança em alguns casos. Mas, para um país como o Brasil, que ainda tem gente que mora na rua, o mínimo a se pagar para a fiança ainda é alto. Eu vejo que o entendimento do STJ nesse caso tem um aspecto social muito importante, opina.

    Isenção
    O juiz da 2.ª Vara Criminal de Ponta Grossa, André Schafranski, se vale da isenção em algumas situações. Você avalia as condições do réu, ele faz uma declaração de sua situação financeira de próprio punho e você concede a liberdade provisória. São poucos os juízes que arbitram a fiança nos casos de pobreza. Eu acredito que ninguém fica recluso por muito tempo pela sua condição financeira, afirma. Assim, não se penaliza o pobre, acrescenta o professor de Direito Processual Penal da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Jacinto Nelson de Miranda Coutinho.

    É um instituto absolutamente falido. Quando o delegado ou o juiz arbitra a fiança, mesmo que a pessoa não tenha condições de pagá-la, ela fica recolhida. Muitas vezes é culpa do advogado ou da falta dele. A autoridade policial e o juiz precisam ser cobrados disso. A falta de uma defensoria pública agrava ainda mais essa situação, considera o presidente da Co missão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em Ponta Grossa, Luiz Carlos Simionato.

    Segundo a Associação Nacional dos Defensores Públicos (Anadep), três estados ainda não têm uma defensoria pública regulamentada conforme prevê a Constituição de 1988: Paraná, Santa Catarina e Goiás. No Rio de Janeiro, por exemplo, que possui o órgão, 90% dos processos criminais são acompanhados pela defensoria e os ajustes com relação ao recolhimento da fiança são feitos, segundo o defensor público Rodrigo Baptista Pacheco. No Paraná, o projeto de lei que cria o órgão está em trâmite na Assembleia Legislativa.

    Dilma sanciona lei que aumenta limite para até 200 salários mínimos
    Enquanto se discute a dispensa de fiança para réus sem condições financeiras, a presidente Dilma Rousseff sancionou ontem a Lei 12.403, proposta pelo próprio Executivo, que aumenta o limite da fiança de 100 para 200 salários mínimos. Se o juiz considerar que o crime praticado pelo réu rendeu-lhe lucros, o teto de 200 salários mínimos pode ser aumentado em até mil vezes. Dessa forma, um réu pode ser passível de pagar por uma fiança de até R$ 109 milhões no Brasil.

    A nova lei, que entrará em vigor dentro de 60 dias, não diminui o piso da cobrança. O deputado federal João Campos (PSDB-GO), que acompanhou o andamento do projeto no Congresso, acredita que a reformulação foi necessária. Anteriormente, os valores estabelecidos pelo Código de Processo Penal eram simbólicos quando se tratavam de crimes financeiros, diz. Ele cita o caso do banqueiro Salvatore Alberto Cacciola, que provocou um rombo milionário contra o sistema financeiro brasileiro e pagou uma fiança de apenas dez salários mínimos, o equivalente a R$ 5,4 mil.

    Paradoxo
    Outra incongruência do atual Código, e que não foi revista até o momento, é o fato de crimes leves serem passíveis de pagamento de fiança para a conquista da liberdade provisória enquanto crimes graves são inafiançáveis, porém dignos de liberdade provisória.

    Os juízes costumam conceder a liberdade provisória mediante fiança aos crimes menos graves e sem fiança aos mais graves. Trata-se de uma prática incorreta, diz a professora de Direito Processual Penal da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Clara Maria Roman Borges. Há uma inversão da culpa, completa o professor de Processo Penal na Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) Adriano Bretas. Isso é um paradoxo. Um crime de furto simples, no qual se cometeu um crime contra o patrimônio, comporta fiança, e um homicídio, em que se atentou contra a vida, não. Acaba-se privilegiando com o não pagamento da fiança alguém que cometeu um crime mais grave, afirma.

    Veículo: Gazeta do Povo Online
    Estado: PR

    • Publicações1882
    • Seguidores6
    Detalhes da publicação
    • Tipo do documentoNotícia
    • Visualizações114
    De onde vêm as informações do Jusbrasil?
    Este conteúdo foi produzido e/ou disponibilizado por pessoas da Comunidade, que são responsáveis pelas respectivas opiniões. O Jusbrasil realiza a moderação do conteúdo de nossa Comunidade. Mesmo assim, caso entenda que o conteúdo deste artigo viole as Regras de Publicação, clique na opção "reportar" que o nosso time irá avaliar o relato e tomar as medidas cabíveis, se necessário. Conheça nossos Termos de uso e Regras de Publicação.
    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/fianca-ainda-e-entrave-a-liberdade-de-reu-pobre/2675124

    0 Comentários

    Faça um comentário construtivo para esse documento.

    Não use muitas letras maiúsculas, isso denota "GRITAR" ;)