Gaita e Liberdade
Há pouco mais de um ano e meio, eu recebia a melhor notícia que uma pessoa pode receber: estava livre das amarras da ROTINA e da BUROCRACIA do serviço público (exercia um cargo comissionado no Poder Judiciário) que há mais de dois anos faziam parte da minha vida. O que poderia ser motivo de tristeza para alguns, acabou virando a melhor notícia do mundo para mim.
Era uma rotina extenuante, que começava cedo (antes das 08 hs da manhã) e que não tinha hora pra acabar (saí inúmeras vezes após as 21 hs). Naquele dia, o medo pela ausência de um salário (muito bom, diga-se) e pela falta de um vínculo fixo, que me fornecia segurança, foi ofuscado pela sensação de prazer e liberdade que sempre sonhei.
Naquele momento, ainda não estavam bem claros todos os benefícios que experimentaria depois, pois, inevitavelmente uma pergunta ecoava em minha cabeça: o que eu farei agora da vida? A resposta para isso veio na lembrança do ciclo vicioso de correr atrás do próprio rabo que me consumia: trabalhava para pagar as contas e gastava cada vez mais, transformando-me em um escravo.
Naquele momento não mais me preocupei sobre o que faria a partir dali, pois, só tinha uma certeza: a partir de agora eu quem dou as cartas, sem chefes chatos, sem colegas de trabalho inescrupulosos, sem rotina, sem hora pra chegar ou sair, sem salas com mofo. A minha saúde mental agradeceria.
Esses dias, depois de ler alguns livros, e lendo atualmente o sensacional “Trabalhe 4 Horas por Semana” do Tim Ferriss, percebi que os dois valores mais importantes da vida (pelo menos para a minha) eu tinha perdido: TEMPO e LIBERDADE.
Aquele emprego me consumia de tal forma que havia deixado de lado a família, os estudos, as atividades físicas e tantas coisas mais que prezava. Mas, sem dúvidas, o pior de tudo, foi perder a capacidade de sonhar: com uma vida melhor e um futuro digno.
Ainda, dia após dia era obrigado a me dirigir a uma sala abafada, que cheirava a mofo, cercado de processos velhos e que pareciam que nunca iam acabar (acreditem, ainda estão lá). A liberdade de trabalhar de qualquer lugar não existia, seria até uma aberração falar nisso, e assim a minha saúde mental esvaia-se, cujo único conforto era esperar chegar o fim do expediente na sexta-feira para enfrentar oito horas de ônibus, chegar de madrugada em outra cidade, pagar um táxi caro para chegar em casa, e amargar a depressão de saber que no domingo à tarde tudo recomeçaria.
No dia de hoje, após terminar meus afazeres como profissional liberal, me surpreendi ao refletir sobre o que estava fazendo (e que já virou rotina, diga-se): na pausa da leitura do meu livro, após fazer breves anotações, arranhei algumas notas na minha gaita que estava jogada num canto, empoeirada. Há um ano e meio, tocar gaita no meio do expediente seria algo inimaginável e que hoje tenho o prazer de fazer com toda naturalidade.
Orgulhosamente, hoje posso dizer que tenho o controle da minha vida, posso sonhar, e, principalmente, realizar, algo que somente a liberdade de ser meu próprio chefe pôde me proporcionar. A essa altura, nem aquele ótimo salário me faz mais falta, pois, ganho o suficiente para viver feliz, e tenho minha gaita a me acompanhar.
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