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26 de Maio de 2024
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    Há violência psicológica na exigência de cheque caução para o atendimento hospitalar de urgência

    há 15 anos

    Notícia (Fonte: TJMT)

    Exigir cheque caução para atendimento hospitalar caracteriza coação moral

    A Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Mato Grosso determinou a extinção de uma ação de execução que pleiteava o pagamento de cheque caução entregue a um hospital, para que fosse realizado atendimento de urgência a uma vítima de acidente. Os magistrados de Segundo Grau compreenderam que o cheque não era uma ordem de pagamento à vista, e sim uma promessa de pagamento de despesas que sequer foram realizadas, pois não se sabe o valor despendido no tratamento. Além disso, para eles, a emissão de cheque da forma como foi realizada demonstrou atitude de coação moral.

    O apelante alegou que o cheque teria sido emitido por garantia pelo fornecimento do serviço hospitalar a ser prestado, constituindo conduta ilegal e abusiva. Aduziu que a sentença recorrida teria ido de encontro com a jurisprudência, quando tomou como exercício regular de direto a exigência de cheque caução para proceder à internação da vítima de acidente em estado grave. Na avaliação da relatora do recurso, desembargadora Maria Helena Gargaglione Povoas, o cheque executado, apesar de constar em seu verso tratar-se de mero depósito para custear despesas do paciente, possuiu a finalidade de caucionar a internação, ou seja, foi emitido como condição para que o hospital prestasse o atendimento médico à vítima. A magistrada destacou que sendo o cheque entregue ao hospital, como promessa de pagamento de despesas que sequer foram realizadas, como ficou comprovado dos autos, evidenciou-se tratar-se de caucionamento dos serviços médicos a serem prestados ao acidentado.

    Nesse sentido, a relatora destacou ser perfeitamente cabível a discussão da causa debendi (causa da dívida), a fim de averiguar eventual abuso por parte do credor, pois permitira a apuração real dos serviços prestados para não haver enriquecimento ilícito por parte do hospital. Além disso, acrescentou que a emissão de cheque caução é vedada pela Agência Nacional de Saúde Suplementar na Resolução Normativa 44 de 2003. Por fim, a magistrada concluiu que o cheque em questão encontrava-se revestido de imprestabilidade jurídica, não correspondia a realidade da obrigação assumida pelo devedor. Com isso, para a magistrada ficou descaracterizada a liquidez e a certeza do título e, consequentemente, sua força executória.

    O voto da magistrada foi acompanhado pelo desembargador Antônio Bitar Filho (revisor) e pelo juiz substituto de Segundo Grau Marcelo Souza de Barros (vogal).

    Apelação nº. 85803/2008

    NOTAS DA REDAÇAO

    O caso em tela trata de execução de cheque caução emitido em garantia de pagamento de tratamento hospitalar.

    Nos termos do art. 585 do Código de Processo Civil o cheque está classificado como título executivo extrajudicial, o qual segundo a doutrina também pode ser chamado de cambial. Os títulos de crédito são dotados de cartularidade, ou seja, para sua execução basta que o exequente esteja portando o título e junte o original, caso faça a juntada da cópia deverá provar que o original não está em circulação.

    Na notícia em comento o cheque foi exigido como caução para atendimento urgente em unidade hospitalar, essa exigência caracteriza violência contra quem está em desespero, pois consiste em coação psicológica e moral, o que pode ser causa de anulabilidade do negócio jurídico estabelecido entre o beneficiário e o sacador.

    Segundo a jurisprudência do STJ, apesar do caráter cambiariforme do cheque que permite sua execução direta, quando ele for entregue para garantir futuras despesas hospitalares, deixa de ser ordem de pagamento à vista para se transformar em título de crédito substancialmente igual a nota promissória, o que torna possível a investigação da causa debendi .

    Assim, em algumas situações, é possível a discussão da origem do título, afinal segundo o Ministro Humberto Gomes de Barros não seria razoável em cheque dado como caução para tratamento hospitalar ignorar-lhe a causa. Do contrário, gera-se desequilíbrio entre as partes. O devedor, em situação de necessidade quedar-se-ia à mercê do hospital, compelido a emitir cheque no valor exigido pelo prestador do serviço.

    Neste sentido a Terceira Turma do STJ manifestou o seguinte entendimento em acórdão lavrado pelo eminente Ministro Menezes Direito:

    "CHEQUE. EMBARGOS DE DEVEDOR. GARANTIA. INVESTIGAÇAO DA CAUSA. 1. Reconhecendo embora a divergência doutrinária e jurisprudencial, não é razoável juridicamente admitir-se o cheque como caução, como garantia, e negar-se a relação entre a garantia e a sua causa. Essa posição permitiria toda sorte de abusos, ocasionando o enriquecimento sem causa, como no presente caso, no qual se ofereceu em garantia um cheque de valor muito maior do que o efetivamente comprometido. 2. Se a praxe no mercado aceita o cheque em garantia, vedar, em tese, a investigação da causa debendi propiciaria um desequilíbrio na relação jurídica entre partes, uma das quais, em casos de extrema necessidade, ficaria a depender do arbítrio da outra. Se o cheque ganhou essa dimensão, fora do critério legal, que tanto não regulou, é imperativo extrair a conseqüência própria, especifica. Por essa razão, é que deve ser admitida a investigação da causa debendi. 3. Recurso especial conhecido, mas, não provido. (REsp 111.154)

    Por fim, após investigação da c ausa debendi , a Segunda Câmara Cível do Tribunal mato-grossense verificou a existência de coação moral na exigência do cheque caução como garantia de despesas que sequer foram realizadas. Dessa forma, determinou-se a extinção da ação de execução.

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    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/ha-violencia-psicologica-na-exigencia-de-cheque-caucao-para-o-atendimento-hospitalar-de-urgencia/1650928

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