Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
17 de Maio de 2024
    Adicione tópicos

    Herbert Carneiro concede entrevista a jornal canadense sobre sistema carcerário

    há 10 anos

    O desembargador Herbert Carneiro, presidente da Amagis e do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciário (CNPCP), concedeu entrevista ao periódico The Globe and Mail, jornal que tem a maior circulação no Canadá. Herbert Carneiro conversou com a jornalista Stephanie Nolen e falou sobre os problemas do sistema carcerário brasileiro.

    Leia a reportagem no link (em inglês) ou abaixo (traduzida para o português).

    Gangs run rampant in Brazils prison system

    Gangues dominam sistema carcerário brasileiro Stephanie Nolen

    Domingos Coelho contou 180 facadas na parte frontal do torso de seu filho Dyego, que estava sem cabeça. Ele não conseguiu girar o corpo e contar aquelas da parte de trás.

    Dyego Coelho (21), quando foi morto no mês passado, estava preso por posse ilegal de munição, seu pai disse aos repórteres - um crime pequeno pelo qual ele provavelmente nunca teria sido condenado a prisão, mas no sistema de justiça criminal ultrapassado e decrépito do Brasil, ele foi trancado junto a condenados de longas penas até ver um juiz.

    Ele foi preso em Pedrinhas, um complexo penitenciário no Maranhão, seu estado natal, que tem quase o dobro da capacidade para a qual foi construído e onde dezenas de prisioneiros são assassinados a cada ano. Em 17 de dezembro, em meio a uma rebelião, membros de uma gangue mataram membros de uma outra gangue rival bem conhecida, algo que foram capazes de fazer com eficiência cruel na prisão, e eles separaram o corpo de Dyego - e os de dois parentes e colegas de cela - de sua cabeça, para deixar claro o seu poder.

    Membros da gangue filmaram as mortes com um celular (coisa que eles, em teoria, são proibidos de ter na prisão) e depois usaram outra tecnologia proibida para compartilhar o vídeo, que chegou até a Folha de São Paulo, que o publicou no início deste mês. Isso e um relatório judicial sobre o motim provocaram a revolta de organizações de direitos humanos nacionais e internacionais, o que levou a governadora do Maranhão a responder que ela estava feliz pela violência em seu estado permanecer dentro dos muros da prisão. A presidente do Brasil Dilma Rousseff não disse nada sobre o evento por quase uma semana, quando finalmente tuitou a notícia de que estaria unindo uma força tarefa para responder à crise e mudaria alguns homens, conhecidos como líderes da violência, para prisões federais.

    Dois outros prisioneiros morreram no Maranhão na semana passada, o mais recente sufocado e esquartejado, com a cabeça jogada em uma lata de lixo. Retaliação, diz a polícia, devido à remoção dos líderes da gangue. Quando a polícia foi em busca de armas em Pedrinhas, na quarta-feira, os presos responderam colocando fogo em seus colchões e criando mais uma crise.

    As histórias de horror quase diárias de Pedrinhas têm dominado as manchetes, mas aqueles que conhecem as prisões do Brasil dizem que isso poderia estar acontecendo em qualquer um das centenas de lugares.

    "As imagens são terríveis e o nível de crueldade está fazendo-nos sentir terríveis - mas a cada ano temos algo similar acontecendo no Brasil", disse Lucia Nader, diretora do Conectas, uma organização de direitos humanos, afirmando que condições existem "para que isso aconteça em qualquer prisão no Brasil."

    A economia do Brasil cresceu nos últimos anos chegando a tornar-se a sexta maior do mundo; reformas políticas sociais ajudaram a criar uma enorme nova classe média, e o país está empenhado em mostrar sua força internacionalmente, com vistas a uma vaga no Conselho de Segurança da ONU. Mas em algumas áreas críticas, este país mantém instituições mais típicas de uma nação ainda emergente. "Há duas áreas, os sistemas penitenciário e policial, que não passaram pelo crescimento e transição do resto do país - e eles ainda estão no século 18", disse Nader.

    Não há eleitorado político com qualquer inclinação para a reforma do sistema penitenciário, disse Herbert Carneiro, um magistrado que preside o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária. As pesquisas mostram que a maioria dos brasileiros defende que menos dinheiro deveria ser gasto em prisioneiros, que as sentenças deveriam ser mais longas e que a maioridade penal deveria ser reduzida.

    "Não há consequências" para os governos federal ou estadual quando os prisioneiros são mortos ou quando vivem 16 deles em uma cela construída para dois, disse Herbert Carneiro - e pode haver incentivo para manter esse status quo.

    O Brasil tem 555 mil presos - a terceira maior população carcerária do mundo - em presídios construídos para 300.000. Estas instalações são extremamente violentas. Só em São Paulo, por exemplo, a base de dados nacional diz que 35 presos morreram em 2011, mas uma auditoria pelo serviço independente da Pastoral Carcerária descobriu que houve 500 mortes. Os prisioneiros são mal alimentados, quase nenhum deles tem acesso à educação e programas de trabalho, que seriam obrigatórios segundo a legislação penal do Brasil, que também diz que os prisioneiros devem ter cada um a sua própria cela - uma condição que não existe em quase nenhum lugar do país.

    O principal problema com as prisões, disse Julita Lemgruber, ex-diretora-geral do sistema penitenciário do Estado do Rio de Janeiro, é que "metade das pessoas nelas não deveria estar lá." Quarenta por cento dos presos brasileiros não foram condenados; um número parecido já cumpriu suas penas, mas não entende o sistema penal, que falha em sua função para libertá-los. Quase todos os que foram presos contam com um defensor público; São Paulo, uma cidade de 16 milhões de pessoas, tem 300 deles.

    Uma vez presos, eles precisam sobreviver. E as prisões estão firmemente no controle das gangues. Muitas delas começaram como organizações dos presos quase como sindicatos, explicou a socióloga Camila Caldeira Dias, e até hoje eles funcionam como grupos de bem-estar que tentam compensar a negligência do Estado, fornecendo coisas básicas como sabonete e papel higiênico. Mas agora elas também são organizações criminosas - o Primeiro Comando da Capital, conhecido por sua sigla PCC, que controla a maioria das prisões de São Paulo, opera um império de drogas que agora se estende para o Paraguai e a Bolívia - governando por meio da violência brutal.

    A comissão judicial que investiga o Complexo de Pedrinhas descobriu que seus membros poderiam acessar partes inteiras da prisão apenas a convite dos reclusos - enquanto funcionários da prisão não podiam nem colocar o pé lá - e que os líderes de gangues estavam estuprando as parceiras de presos que vinham fazer visitas íntimas.

    "O Estado não tem controle de todas as suas prisões", disse sem rodeios Herbert Carneiro, presidente do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária. "Ele controla apenas o nosso falso sentimento de segurança pública."

    Depois que o vídeo de Pedrinhas vazou, o governo estadual finalmente enviou uma força policial de elite para tentar retomar o controle da prisão; em resposta, líderes de gangues ordenaram a retaliação fora dos muros da prisão, em São Luis, capital do estado. A delegacia ficou sob fogo de metralhadoras e ônibus foram incendiados - uma criança de seis anos de idade morreu em um dos ônibus devido a queimaduras.

    O Estado brasileiro perdeu o controle de suas prisões há décadas, diz a professora Camila Dias, autora de um estudo definitivo sobre gangues em prisões. O país tem uma política de encarceramento em massa instituída na década de 1990 para responder a uma violenta guerra contra as drogas; pessoas encontradas em posse de pequenas quantidades de drogas para uso pessoal são presas assim como os traficantes (quando não podem pagar um advogado), fazendo com que a população carcerária cresça.

    "Temos uma sociedade que só pune criminosos pobres e negros, que não têm dinheiro para pagar advogados, que não têm o direito de defender-se plenamente", disse ela. "As prisões são os espaços onde se segrega e se contém essa população, que historicamente no Brasil não tem direitos. ... Eles não têm direitos aqui fora. E na prisão, não há preocupação com a violação desses direitos.

    Enquanto o governo de esquerda atual fala de direitos mais frequentemente do que os seus antecessores, ele faz acordos políticos com interesses conservadores arraigados que bloqueiam a reforma penal, ela acrescentou. Maranhão, por exemplo, tem sido controlado por 50 anos pela família Sarney, uma das mais poderosas famílias políticas do Brasil.

    " Há grandes interesses, dos governos, para manter o sistema como ele é ", disse Valdir Silveira, um padre católico que é o coordenador nacional do serviço pastoral e que recentemente conduziu auditorias sobre as condições no Maranhão. Políticos poderosos têm laços estreitos com as empresas que prestam serviços carcerários (e controlam as que foram privatizadas), enquanto a maior parte do orçamento prisional nunca volta aos administradores, disse ele.

    O ministro da Justiça, José Cardozo, que em 2012 chamou as prisões do país de" medievais "e disse que preferiria morrer a ser preso no sistema que ele supervisiona, recentemente prometeu mais de R$1 bi para o sistema penal, mas apenas para a construção de novas prisões .

    Julita Lemgruber disse que uma mudança mais importante seria manter as pessoas fora da prisão, em primeiro lugar - uma vez que os ladrões de lojas são colocados em celas com assassinos e têm que se juntar a gangues para sobreviver, eles estão entrincheirados na vida criminal, disse ela. O Brasil precisa de um verdadeiro sistema de justiça alternativa, com melhores sentenças, destinação inteligente de sua população carcerária e um sistema jurídico que forneça processo judicial, não armazenamento." Seria bom se nossos prisioneiros fossem tratados como animais ", disse ela." Isso já seria uma melhoria. "

    *Tradução: André Lourenço

    • Publicações16585
    • Seguidores104
    Detalhes da publicação
    • Tipo do documentoNotícia
    • Visualizações70
    De onde vêm as informações do Jusbrasil?
    Este conteúdo foi produzido e/ou disponibilizado por pessoas da Comunidade, que são responsáveis pelas respectivas opiniões. O Jusbrasil realiza a moderação do conteúdo de nossa Comunidade. Mesmo assim, caso entenda que o conteúdo deste artigo viole as Regras de Publicação, clique na opção "reportar" que o nosso time irá avaliar o relato e tomar as medidas cabíveis, se necessário. Conheça nossos Termos de uso e Regras de Publicação.
    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/herbert-carneiro-concede-entrevista-a-jornal-canadense-sobre-sistema-carcerario/112368475

    Informações relacionadas

    Governo do Estado parcela ICMS para participantes da Liquida Feira

    Notíciashá 11 anos

    AMBEV TEM LUCRO LÍQUIDO DE R$1,88 BI NO 2º TRI

    0 Comentários

    Faça um comentário construtivo para esse documento.

    Não use muitas letras maiúsculas, isso denota "GRITAR" ;)