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2 de Maio de 2024
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    Ministério Público do Trabalho aciona indústrias fumageiras por irregularidades trabalhistas

    O Ministério Público do Trabalho em Santa Catarina ajuizou 11 Ações Civis Públicas (ACPs) contra as indústrias fumageiras que mantêm contratos de integração no Estado, devido à existência de trabalho degradante, falta de registro dos trabalhadores e uso da mão-de-obra infantil. Além de acionar a Souza Cruz, a Alliance One Exportadora de Tabacos Ltda, a ATC - Associated Tobacco Company (Brasil) Ltda, a Brasfumo Indústria Brasileira de Fumos S/A, a CTA - Continental Tobaccos Alliance S/A, a Intab - Indústria de Tabacos e Agropecuária Ltda, a Kannenberg & Cia Ltda, a Premium Tabacos do Brasil Ltda, a Sul América Tabacos S/A, a Unifumo Brasil Ltda e a Universal Leaf Tabacos Ltda, o MPT incluiu nas ações - propostas em dezembro - a Associação dos Fumicultores do Brasil (Afubra) e o Sindicato das Indústrias do Fumo (Sindifumo).

    "O que a gente quer é o reconhecimento do vínculo de emprego com essas pessoas [agricultores], com pagamento de férias, 13º salário, assinatura em carteira, fundo de garantia, que são direitos de qualquer trabalhador", afirma a Procuradora do Trabalho Cristiane Kraemer Gehlen Caravieri, uma das responsáveis pela proposição das ações.

    Até o momento, a 1ª e a 3ª Varas do Trabalho de Florianópolis concederam liminares favoráveis ao MPT nas ações contra a Unifumo e Intab, proibindo contratações com cláusulas abusivas e o trabalho de menores de idade, sob pena de multa de R$ 10 mil por irregularidade encontrada. A Justiça acaba de derrubar o mandado de segurança impetrado pela Souza Cruz, contra a liminar que também restringia contatos abusivos por parte da empresa. Com a decisão, a liminar passa a valer também para a Souza Cruz. A decisão invalida todos os contratos feitos pela empresa a partir do dia 19 de dezembro, sujeitando a multinacional às multas constantes na ação. As liminares também proíbem a Afubra de intermediar contratos de compra e venda de fumo, também sob pena de multa. Em decorrência, as contratações de agricultores firmadas neste período (quando o contrato permaneceu com as cláusulas lesivas) incidem, cada uma delas, na multa de R$ 30 mil (R$ 10 mil por cada réu das ACPs). Somente na ação contra a Souza Cruz este valor inicial, relativo apenas a eventual descumprimento da liminar, pode acalçar e até ultrapassar a expressiva quantia de cerca de um bilhão de reais. Ações similares foram propostas no Paraná, também com liminares favoráveis ao MPT daquele Estado.

    Nas ações civis públicas, MPT exige o fim dos contratos individuais com os agricultores e o reconhecimento do vínculo empregatício, com o pagamento dos direitos trabalhistas, além da observância das normas de saúde e segurança no trabalho, especialmente no que se refere ao uso de agrotóxicos. A título de dano moral, pelas características das lesões causadas e pelo prejuízo econômico e social causado aos fumicultores, o MPT também pede uma indenização de R$ 50 mil por produtor integrado, mais R$ 10 mil por safra contratada nos anos subseqüentes à celebração do primeiro contrato. Os pedidos constantes das ações e que atingem cerca de 150 itens em cada uma, podem somar valores bem maiores que o acima indicado, acaso deferidos pelo Poder Judiciário. As diversas multas pleiteadas nas ações do MPT deverão ser destinadas à reversão da cultura do fumo e auxílio às milhares de famílias que trabalham nas respectivas lavouras, em decorrência dos danos causados em toda aquela coletividade.

    O MPT pede também que a Afubra e o Sindifumo parem de apoiar o sistema integrado e de incentivar os agricultores a realizarem contratos com cláusulas lesivas, abstendo-se de realizar venda de sementes, insumos, agrotóxicos e seguros de vida aos agricultores, também sob pena de multa. O MPT ainda exige que a Afubra devolva em dinheiro todos os valores pagos pelos produtores a título de seguro.

    A seguir, relatos do diaadia nas lavouras de fumo, retratados na Ação Civil Pública:

    Cada um dos 47.500 "plantadores associados" da Souza Cruz, que semeiam, fazem germinar, transplantam, borrifam, colhem, secam, selecionam e entregam o fumo, e que manuseiam cada planta entre 30 e 50 vezes por estação, ganha por ano, em média, um sexto do que o presidente da BAT[1] ganha por dia. Em outras palavras, um fumicultor brasileiro precisaria trabalhar seis anos para ganhar o salário diário do presidente da BAT e 2.140 anos para receber o seu salário anual.

    A agricultora Eva da Silva, de 61 anos, se suicidou após ter tido toda a sua produção de fumo tomada pela Alliance One, para quem vendia a produção de sua lavoura há mais de 25 anos

    O MPA denuncia ainda, que mesmo depois de constatada a morte da agricultora, a operação de cobrança não parou. "Foi solicitado reforço aos trabalhadores da Alliance One, para terminar o carregamento o mais rápido possível, numa prova inequívoca de que as fumageiras não dão valor à vida humana".

    A agricultora de 61 anos, Eva da Silva, morreu por enforcamento e esta foi a única saída que entendeu possível para estancar, de vez, a cruel realidade de uma vida dedicada ao plantio de fumo (cerca de 25 anos).

    José sempre foi considerado o membro mais animado da família. Aprendeu com o pai (atualmente com câncer no pulmão) a lide das plantações de fumo, atividade que tem sido o sustento deles até os dias de hoje. Sempre foi considerado um homem trabalhador e promessa de sucesso. Agora, aos 31 anos, inválido pelo excesso de contaminação dos agrotóxicos utilizados na lavoura ao longo dos anos, pede uma indenização à empresa que lhe fornecia os defensivos agrícolas, a Souza Cruz S.A., maior no setor em que atua.

    "Com 22 anos comecei a sentir queimação na pelé e dificuldade de dormir, além de vômito. Os médicos diziam que era só um problema de fígado. Em 94 tive uma crise neurológica, fui internado em um hospital psiquiátrico. Fiquei muito inchado. Fui mudando de médico em médico e ninguém acertava o tratamento. Até que outro doutor constatou que tive uma parada neurológica, só não sabia a causa, com o tempo concluiu que era o veneno. O desespero é grande, só não me matei ainda porque acredito em Deus", desabafa o agricultor.

    O estudante Jean Lucas de Carvalho, oito anos, morreu... O menino caiu de uma carroça, carregada com fumo, em Linha São João, interior de Quilombo, Oeste do Estado. Pelo menos uma das quatro rodas da carroça teria passado sobre o corpo do menino... Padrinho de Jean, o agricultor Dorneles de Carvalho, 31 anos, contou que os dois trabalharam juntos na lavoura de fumo da família momentos antes do acidente. Carvalho disse que o menino gostava de trabalhar com a carroça puxada por uma junta de bois e que acompanhava as atividades agrícolas diariamente.

    Esta pobre criança aprendeu, em sua curta vida, a gostar de trabalhar, diariamente. Jean, este menino que sofreu e gritou antes de ir embora pra sempre,... teve a certeza que os sonhos e brincadeiras da infância eram piegas e desprezíveis para os adultos.

    Que adultos são estes agora, seus familiares e aqueles que lucraram com o seu trabalho? Uns parecem tão pequenos, indefesos e derrotados, seres que eram sua família e que agora estão tão mergulhados na infelicidade que são mais infelicidade do que um ser. Outros que lucraram com seu trabalho parece que nem perceberam sua morte e seguem, desviando o olhar, fugindo da culpa. Que adultos são estes?

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