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17 de Junho de 2024
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    Ministro Gilson Dipp faz balanço dos dez anos das varas especializadas em lavagem de dinheiro

    há 12 anos

    Principal idealizador da iniciativa do Conselho da Justiça Federal (CJF) de especializar varas federais no processamento e julgamento de crimes contra o Sistema Financeiro Nacional e de lavagem de dinheiro, o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Gilson Dipp, fez um balanço dos dez anos de funcionamento dessas varas, durante encontro dos juízes que atuam nessas unidades, em palestra na manhã desta quinta-feira (26). O evento está sendo realizado pelo Centro de Estudos Judiciários (CEJ) do CJF, em Brasília (DF).

    Para o ministro, os avanços no combate a esses crimes, decorrentes da especialização dessas varas, são visíveis, com um aumento exponencial no número de inquéritos e processos em tramitação, mas ainda falta maior apoio ao funcionamento dessas unidades por parte dos tribunais regionais federais. De acordo com ele, muitas varas ainda funcionam com apenas um juiz e poucos funcionários e não possuem o aparelhamento adequado para o processamento desses crimes, considerados de alta complexidade. Além disso, segundo Dipp, muitos processos em que há condenações em primeira instância ficam parados por muito tempo nos tribunais, já que estes, com exceção do TRF da 4ª Região, não possuem turmas especializadas em matéria penal. Esta especialização, no entender do ministro, é crucial para o entendimento de crimes cada vez mais complexos.

    De acordo com Gilson Dipp, as varas federais especializadas sempre foram o “ponto alto” das avaliações internacionais do Brasil em relação a esse tema, conduzidas pelo Grupo de Ação Financeira Internacional (GAFI), organismo intergovernamental que promove políticas de prevenção à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo. “E nós aqui não cuidamos delas”, critica o ministro.

    As avaliações feitas pelo GAFI em relatório de 2000, segundo relata o ministro, elogiaram o advento da Lei 9.613/1998, que passou a tipificar o crime de lavagem de dinheiro e seus antecedentes, mas criticaram a legislação processual penal. Já o relatório de 2005 elogiou o Brasil por ter criado as varas especializadas e desenvolvido mecanismos para recuperação de ativos ilícitos. Por outro lado, apontava como fator negativo as dificuldades ainda enfrentadas por autoridades estrangeiras para investigar os crimes praticados em território brasileiro e a resistência por parte das autoridades brasileiras em ratificar acordos internacionais. Já o último relatório, de 2010, criticou o Brasil por não reformar as leis penais e por não implementar acordos firmados com outros países e organismos internacionais relativos à cooperação jurídica internacional, muitas vezes necessária para a investigação ou processamento de crimes de caráter transnacional.

    O ministro apresentou dados da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), que revelam que quase metade dos acordos assinados pelo Brasil com outros países para combater a corrupção e a lavagem de dinheiro jamais entrou em vigor ou não atende aos padrões técnicos internacionais. Atualmente, o Brasil tem 34 acordos de cooperação internacional, sendo que 9 não foram ratificados, 14 tramitam no Congresso Nacional e outros estão defasados. De acordo com o ministro, a OCDE cita especificamente o tratado Brasil-Itália, que não prevê a cooperação internacional. “Por causa disso, o Brasil estaria sofrendo influência da Máfia italiana, que estaria adquirindo grandes extensões de terra na costa brasileira”, alerta o ministro.

    Ele aponta um avanço importante, que é a criação do Sistema Nacional de Bens Apreendidos, sediado no CJF e que atende a uma determinação da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (ENCLLA), a qual reúne 70 órgãos do poder público brasileiro, com representantes do Executivo, do Legislativo e do Judiciário. A ENCLLA, segundo ele, elabora políticas públicas através de metas para que o Brasil atinja internamente uma eficiência operacional e externamente o atendimento às determinações internacionais.

    No último relatório do Sistema Nacional de Bens Apreendidos, de acordo com o ministro, encontram-se cadastrados R$ 1,5 bilhão em bens apreendidos. “Deste montante, a Justiça Federal responde por mais de R$ 1 bilhão, o que permite a constatação de que os crimes de competência da Justiça Federal respondem por 2/3 dos bens apreendidos”, observa. Os bens apreendidos em decorrência da lavagem de dinheiro na Justiça Federal, segundo ele, correspondem a 26,25% do total, cerca de R$ 276,5 milhões e, comparativamente, na Justiça Estadual, esse montante corresponde a apenas 0,09% do total. “Isto demonstra que a especialização da Justiça Federal deu resultados. É claro que a competência federal é maior porque todo mecanismo de lavagem de dinheiro passa pelo Sistema Financeiro Nacional e atrai a competência da Justiça Federal, mas mesmo assim isto indica o acerto da especialização”, conclui o ministro.

    Apesar desse avanço, ele sublinha que a Justiça Federal ainda precisa de mecanismos para dar uma destinação adequada a esses bens apreendidos. O maior quantitativo desses bens decorrentes da lavagem de dinheiro na Justiça Federal, correspondente a 68% do total, refere-se a imóveis, que por sua natureza são difíceis de serem administrados pelo juiz. “Um dado mais alarmante diz respeito à destinação desses bens, já que apenas 11,84% dos bens relativos a processos da Justiça Federal tiveram destinação até este momento. Muitos estão deteriorando ou se depreciando”, revela o ministro.

    Ele informa que há projetos tramitando no Congresso Nacional possibilitando a alienação antecipada de bens apreendidos ou criando mecanismos para facilitar a destinação. Mas, na opinião do ministro, a alienação antecipada já pode ser aplicada pelos juízes, “pela construção criativa de cada um, dentro da medida do poder cautelar e obedecida a transparência”.

    Como tudo começou

    Em 2001, segundo relato do ministro Dipp, o coordenador-geral da Justiça Federal e diretor do CEJ, na época o ministro Milton Luiz Pereira (já falecido), por intermédio do CEJ/CJF, promoveu pesquisa para verificar porque havia tão poucos processos relativos ao tipo penal lavagem de dinheiro em tramitação na Justiça Federal. “Por ocasião da divulgação da pesquisa, o ministro Milton me convidou para fazer uma análise de seus dados”, conta Dipp. A partir dessa análise, o ministro Milton Pereira, com a colaboração do então presidente do CJF, ministro Nilson Naves, resolveu criar uma comissão para avaliar os resultados da pesquisa e verificar como o CJF e outras instituições poderiam colaborar na solução dos problemas apresentados.

    A comissão, presidida pelo ministro Dipp, era composta por juízes federais criminais e por representantes do Ministério Público Federal, Polícia Federal, Banco Central, Receita Federal e do recém-criado Conselho de Controle das Atividades Financeiras (Coaf). Dos trabalhos da comissão resultou uma série de propostas e recomendações, sendo a mais importante delas a proposta de especialização de varas federais no processamento e julgamento dos crimes de lavagem de dinheiro e contra o Sistema Financeiro Nacional. “Apresentei ao CJF uma proposta de resolução especializando varas federais”, relata o ministro, ressaltando que na época essa medida soava como “uma utopia”, já que a Justiça Federal tinha uma carência grande de varas federais. Mesmo assim, a proposta de resolução foi aprovada por unanimidade pelo CJF.

    Se hoje essas varas especializadas são um sucesso, na avaliação do ministro, isso se deve em grande parte ao empenho dos juízes que nelas passaram a atuar e à colaboração de outros órgãos que também atuam junto a essas varas no processamento desses crimes, como o Ministério Público e a Polícia Federal. “Todos os envolvidos estão engajados”, elogiou. A partir dessas especializações, o número de inquéritos relativos a esses crimes começaram a crescer “exponencialmente” e começaram a acontecer as primeiras interceptações telefônicas e quebras de sigilo bancário e fiscal. “O crescimento do número de processos foi de uma forma inesperada, e essas varas passaram a ter um grande destaque”, conta Dipp.

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    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/ministro-gilson-dipp-faz-balanco-dos-dez-anos-das-varas-especializadas-em-lavagem-de-dinheiro/3102557

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