Morre a viúva do sargento das mãos amarradas sem receber a indenização
Morreu há poucos dias, no Rio de Janeiro, aos 72 de idade, Elizabeth Chalupp Soares, viúva de Manoel Raimundo Soares, o sargento das "mãos amarradas". Como o casal não teve descendentes, uma filha de criação (Fátima) - mas sem adoção formal - vai habilitar-se como sucessora. O óbito de Dona Betinha - como era chamada - sem ter recebido os seus haveres causou indignação e mais motivos dará aos advogados João Francisco Rogowski e Rael Rogowski, para denunciar na próxima semana, o Estado Brasileiro à Corte Interamericana de Direitos Humanos por violação do Pacto de San Jose da Costa Rica e por crime contra a humanidade.
Centenas dos leitores do Espaço Vital ainda não eram nascidos - outros sequer estavam nos bancos universitários, ou recém davam os primeiros passos na Advocacia ou em outras tarefas como operadores do Direito - quando, no início de 1966, o sargento do Exército Manoel Raimundo Soares - participante do Movimento Legalista, que visava restituir ao presidente João Goulart o mandato tomado pelos militares, passou a viver na clandestinidade.
Em março daquele ano, Raimundo foi preso pela Polícia do Exército, em frente ao Auditório Araújo Viana, em Porto Alegre e levado para o Dops, onde foi torturado por cerca de uma semana. Posteriormente foi transferido para a Ilha do Presídio, no Rio Guaíba. No dia 13 de agosto de 1966, foi novamente levado para o Dops, agredido ao longo de vários dias e assassinado por afogamento. O corpo foi encontrado no dia 24 de agosto. Soares tinha, então, 30 anos.
Em 1973, a viúva Elizabethe Chalupp Soares ajuizou uma ação requerendo pensão, ressarcimento pela União das despesas do funeral e indenização por danos materiais e morais. O processo foi transferido da Justiça estadual para a federal em novembro de 1988 e teve uma demorada tramitação. Em dezembro de 1995, o juiz Cândido Alfredo Silva Leal Júnior, então na 5ª Vara Federal de Porto Alegre, proferiu a sentença, mandando indenizar a viúva. A União recorreu.
Seguiram-se demorados incidentes e o processo só foi remetido ao TRF-4 em 16 de novembro de 2001 - cerca de seis anos depois da sentença. No tribunal, os autos passaram por distribuição, redistribuições, conclusões, impedimento, aposentadoria etc. que consumiram mais três anos e meio de espera. A última relatora designada (juíza federal Vânia Hack de Almeida, convocada para atuar no TRF-4) levou o processo a julgamento em breve tempo, recebendo os autos conclusos em 11 de julho de 2005. Em dois meses, ela leu os autos, julgou o recurso, improveu o recurso da União e manteve a indenização concedida.
Segundo a decisão, Elizabeth teria direito à pensão vitalícia, retroativa a 1966, com base na remuneração integral de 2º sargento, compensando-se os valores que ela já recebia mensalmente, pelo óbito do marido. O tribunal concedeu tutela antecipada neste item, permitindo que a viúva recebesse desde logo a correção monetária anual do pensionamento. A reparação pelos danos morais foi de R$ 222.720,00 - valor nominal, a ser corrigido monetariamente. A correção retroagiria à data da sentença (dezembro de 1995) e os juros de mora de 12% ao ano seriam contados desde a data do crime até hoje. Até morrer, ela recebia R$ 1,5 mil de pensão mensal. Não viu a cor do restante!
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