43 anos depois, caso das mãos amarradas vai chegando ao fim
Morreu em junho, no Rio de Janeiro, aos 72 de idade, Elizabeth Chalupp Soares, viúva de Manoel Raimundo Soares, o sargento das "mãos amarradas". Como o casal não teve descendentes, uma filha de criação (Fátima) - mas sem adoção formal - vai habilitar-se como sucessora.
O óbito de ´Dona Betinha sem ter recebido os seus haveres causou indignação e mais motivos deu aos advogados João Francisco Rogowski e Rael Rogowski, para denunciar na primeira semana de julho o Estado Brasileiro à Corte Interamericana de Direitos Humanos por violação do Pacto de San Jose da Costa Rica e por crime contra a humanidade.
No DJ on line, o STJ disponibilizou ontem (08) o acórdão do recurso especial da União, julgado no dia 1º deste mês e provido apenas para "afastar a incidência de juros compostos e reduzir o percentual dos juros de mora para 0,5% ao mês durante o período de vigência do Código Civil anterior".
Ao extirpar parte dos juros, o ministro relator Herman Benjamin dispôs que os juros compostos não
poderiam se transformar em encargo da União, mas sim por aquele (s) que praticou (aram) o crime - mas, no ponto, os sete denunciados escaparam pela via da prescrição reconhecida no Juízo criminal.
Faltando o cálculo oficial da condenação - que está sendo feita pela Contadoria da Justiça Federal de Porto Alegre - a condenação fica próxima dos R$ 2,5 milhões.
Uma história triste que começou em 1966
* Centenas dos leitores do Espaço Vital ainda não eram nascidos - outros sequer estavam nos bancos universitários, ou recém davam os primeiros passos na Advocacia ou em outras tarefas como operadores do Direito - quando, no início de 1966, o sargento do Exército Manoel Raimundo Soares - participante do Movimento Legalista, que visava restituir ao presidente João Goulart o mandato tomado pelos militares, passou a viver na clandestinidade.
* Em março daquele ano de 1966, Raimundo foi preso pela Polícia do Exército, em frente ao Auditório Araújo Viana, em Porto Alegre e levado para o Dops, onde foi torturado durante uma semana. Posteriormente foi transferido para a Ilha do Presídio, no Rio Guaíba. No dia 13 de agosto de 1966, ele foi novamente levado para o Dops, agredido ao longo de vários dias e assassinado por afogamento. O corpo foi encontrado no dia 24 de agosto. Soares tinha, então, 30 anos.
* Em 1973, a viúva Elizabethe Chalupp Soares ajuizou uma ação requerendo pensão, ressarcimento pela União das despesas do funeral e indenização por danos materiais e morais. O processo foi transferido da Justiça estadual para a federal em novembro de 1988 e teve uma demorada tramitação. Em dezembro de 2000, o juiz Cândido Alfredo Silva Leal Júnior, então na 5ª Vara Federal de Porto Alegre, poucos meses depois de ter os autos conclusos, proferiu a sentença, mandando indenizar a viúva. A União recorreu.
* Com os recursos, os autos foram remetidos ao TRF-4 em 16 de novembro de 2001. No tribunal, os autos passaram por distribuição, redistribuições, conclusões, impedimento, aposentadoria etc. que consumiram mais três anos e meio de espera. A última relatora designada (juíza federal Vânia Hack de Almeida, convocada para atuar no TRF-4) recebeu os autos conclusos em 11 de julho de 2005, levando o processo a julgamento em breve tempo. Em dois meses, ela leu os autos, julgou o recurso, improveu o recurso da União e manteve a indenização concedida.
* Uma das frases candentes da então relatora foi que "Justiça depois de 30 anos não é mais possível". Desde então, a sucessão de recursos consumiu mais quatro anos e meio.
* Segundo a sentença e o acórdão da JFRS, Elizabeth teria direito à pensão vitalícia, retroativa a 1966, com base na remuneração integral de 2º sargento, compensando-se os valores que ela já recebia mensalmente, pelo óbito do marido. O tribunal concedeu tutela antecipada neste item, permitindo que a viúva recebesse desde logo a correção monetária anual do pensionamento.
* A reparação pelos danos morais foi fixada em R$ 222.720,00 - valor nominal, a ser corrigido monetariamente. A correção retroage à data da sentença (dezembro de 2000) e os juros de mora de 12% ao ano seriam contados desde a data do crime até hoje, mas o percentual foi agora reduzido pelo STJ para 0,5% ao mês, durante o período de vigência do Código Civil anterior.
Até morrer, a viúva recebia R$ 1,5 mil de pensão mensal. Não viu a cor do restante! Com o julgamento pelo STJ, a execução de sentença torna-se definitiva e a filha de criação deverá habilitar-se para - possivelmente em 2011 - receber via precatório a ser pago pela União.
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