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17 de Junho de 2024
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    No recálculo da dívida dos estados, quem realmente "paga o pato"?

    Publicado por Consultor Jurídico
    há 8 anos

    Após decisão plenária do Supremo Tribunal Federal concedendo liminar a Santa Catarina (MS 34.023), em ação que busca garantir a aplicação dos novos parâmetros instituídos pela Lei Complementar 148/14, especificamente para o desconto da dívida com a União (artigo 3º), Rio Grande do Sul (MS 34.110), Minas Gerais (MS 34.122), Pará (MS 34.132), São Paulo (MS 34.135), Rio de Janeiro (MS 34.137), Mato Grosso do Sul (MS 34.141), Alagoas (MS 34.123) e Goiás (MS 34.143) também recorreram à suprema corte, obtendo igual provimento provisório. E vários outros (Sergipe, Bahia, Mato Grosso, Maranhão, Amapá, Pernambuco e Distrito Federal) ingressaram ou estão em vias de ingressar em juízo.

    Uma coisa precisa ser esclarecida: o debate não diz respeito à forma de incidência dos índices oficiais (se simples ou composta), como tem sido dito por aí. Não se está a questionar, ao menos por enquanto, a prática usual do mercado de capitalizar juros (anatocismo, juros sobre juros, juros compostos, exponenciais ou não lineares). E ao contrário do que alguns têm afirmado, inclusive neste espaço,[1] não é o artigo da LC 148 que está em disputa, mas seu artigo 3º.

    É bem verdade que o anatocismo revela-se como comportamento ultrajante, razão pela qual existe a Lei de Usura (Decreto 22.626/33) e a Súmula 121/STF. Mas não é completamente rejeitado pelo ordenamento jurídico, devendo, porém, ser visto sempre como exceção (precisa estar previsto expressamente). A questão toda é que a LC 148, ao tratar dos descontos, não previu a capitalização da taxa Selic, mas sua acumulação (leia-se: soma dos índices).

    Tampouco há que se falar, como equivocadamente fez o editorial do jornal Folha de São Paulo,[2] em obtenção de tratamento privilegiado via ativismo judicial. O que está realmente em pauta é a aplicação estrita de critérios legais para o cálculo do desconto a que fazem jus os estados, conforme determinou o legislador nacional.

    No ano de 2014, foi aprovada a LC 148, alterada em 2015 pela LC 151. Os diplomas estabeleceram duas formas de reduzir o endividamento estadual: (1) novos indexadores de correção (4% a.a. + IPCA, limitados pela Selic); e (2) substancioso desconto sobre os saldos devedores (a ser apurado segundo fórmula matemática posta na própria lei).

    O primeiro ponto ninguém está questionando. Só o segundo foi arguido judicialmente. Não há, pois, uma discussão propriamente sobre a capitalização, seja dos velhos, seja dos novos indexadores. O objeto das ações propostas se restringe aos descontos, concedidos tanto para corrigir distorções do passado,[3] quanto para “aliviar” a situação financeira dos entes estaduais, trazendo certo reequilíbrio ao combalido “pacto federativo”.[4]

    É que, com suas práticas predatórias, a União sempre impactou negativamente a arrecadação estadual, dificultando a quitação da dívida.[5] Por anos, a “mãe/madrasta” esteve não só a lucrar em cima de seus “filhos/enteados” (11,5% a 15% da receitas estaduais fluem para o caixa da União), mas a mantê-los eternamente na condição de devedores, asfixiando suas fontes arrecadatórias.[6] Se a CRFB/1988, em seu artigo , assevera que a República Federativa do Brasil é “formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal”, não poderia a União agir como se fosse um ser totalmente dissociado das demais pessoas políticas, ganhando às custas do endividando delas.

    Tal postura, adotada durante todos esses anos, resultou na absoluta perversão do “pacto federativo”, levando o Congresso Nacional a conceder descontos vultosos (porque a União não é banco nem agiota), de modo a reduzir, de uma vez por todas, a dívida estadual. Essa é a mens legis do artigo da LC 148: reduzir o endividamento estadual, tanto em razão dos ganhos da União sobre os estados, como também — e, aqui, está o ponto principal — reduzir o desequilíbrio federativo em sua dimensão vertical. É dizer: a lei faz muito mais do que simplesmente corrigir distorções passadas. Busca, ainda, reequilibrar as debilitadas relações “União-Estados” (não as relações “Estados-Estados”), colocando, em parte, “as coisas em seus devidos lugares”.[7]

    Na redação dada pela LC 151/15, o artigo da LC 148/14 passou a obrigar a União a abater dos débitos estaduais a diferença entre a quantia devida em 1º de janeiro de 2013 (minuendo) e aquela apurada desde a assinatura dos contratos, utilizando-se (para se chegar ao subtraendo) a variação acumulada da Selic (= juros simples), já adotada por várias entidades brasileiras (Receita Federal e Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN),[8] Instituto Nacional do Seguro Social (INSS),[9] Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra),[10] Tribunal de Contas da União (TCU),[11] Justiça Federal[12] e Eleitoral[13]).

    O desconto legalmente criado corresponde ao resultado de uma operação de subtração. Nessa operação, o minuendo é o saldo devedor da dívida em 1º de janeiro de 2013 e o subtraendo é o valor da dívida corrigido pela Selic, com juros simples, desde a assinatura do contrato, até 01/01/2013. Eis a fórmula:

    DESC = SD2013 - SDSelic

    Fica fácil perceber que, considerando o minuendo SD2013 um número certo, quanto menor for o subtraendo SDSelic, maior será DESC, e vice-versa.

    Ocorre que, no final do ano passado, o poder executivo federal expediu o desnecessário e ilegal Decreto 8.616, que altera a fórmula de cálculo de SDSelic.[14] Basicamente, o que esse decreto regulamentar fez foi substituir a expressão legal “variação acumulada” (= fator simples) por “fator acumulado”.[15] Como “fator acumulado” equivale à sobreposição de juros (anatocismo), SDSelic passaria a ser calculado com base na Selic capitalizada, e não mais na Selic somada, atingindo um resultado drasticamente elevado. Sendo SD2013 constante, a radical majoração de SDSelic promovida pelo decreto presidencial teria como consequência a absurda redução de DESC.

    Apesar de marcado, no texto da LC 148, que não seria necessário regulamentaç...

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