O voto e a matemática
PONTO UM:
Nesses dias de diplomação dos candidatos eleitos em 2018 - solenidade que encerra a atividade conduzida pela Justiça Eleitoral e prepara os próximos passos, como a posse e o início do exercício do mandato - será aplicada, pela vez primeira, uma significativa alteração no sistema proporcional, atingindo a distribuição das cadeiras a serem ocupadas pelos deputados estaduais e federais: a cláusula de barreira dos 10%.
É da tradição brasileira que para os cargos de vereadores, deputados estaduais e federais o eleitor, ao votar, faz duas escolhas: a do partido e a do candidato.
Não vinga, aqui, o critério modal do “tudo ou nada”, do sistema majoritário, caso dos cargos executivos e do Senado: elege-se um, em detrimento dos demais. No sistema proporcional o voto é computado duas vezes, uma para o partido, outra para o candidato.
Para se alcançar o resultado final – quem foi e quem não foi eleito – passava-se por dois cálculos: o quociente eleitoral, que se vale do total de votos válidos e o número de vagas no Legislativo, o qual serve de base para a segunda operação matemática. Assim chegava-se ao quociente partidário: tomava-se o total de votos obtidos por cada partido e dividia-se pelo quociente eleitoral.
Exemplificando: 10.000 votos válidos, 20 cadeiras = 500 é o quociente eleitoral.
O partido A alcançou 2.000 votos, dividindo-se por 500 = 4 cadeiras a serem ocupadas por esse partido, escolhendo-se para tanto os quatro candidatos mais votados.
Essa a nossa tradição até 2016!
PONTO DOIS
A nova redação do art. 108 do Código Eleitoral, porém, veio agregar o que se tem nominado de cláusula de barreira dos 10%, impondo mais um obstáculo para ser o candidato efetivamente considerado eleito.
É preciso, tomando-se o exemplo acima, que cada um dos quatro candidatos mais votados tenha, individualmente, alcançado um número mínimo de votos igual ou superior a 10% do quociente eleitoral. Assim, não basta ter o candidato alcançado a melhor condição dentro de sua legenda. É preciso também que ele, pessoalmente, preencha uma cota mínima de votos.
Assim, se dos quatro mais votados, dois alcançaram (lembrem: no hipotético exemplo o partido teve 2.000 votos) um número superior a 50 votos, estarão eleitos; mas se os dois últimos tiveram 48 ou 49 votos, cada um, nenhum desses está eleito e essas duas vagas não preenchidas serão redistribuídas e submetidas a um novo cálculo entre todos os partidos.
Embora a disposição pretendesse afastar o efeito nefasto do “puxador de votos”, exemplos históricos como o caso do deputado Enéas e do deputado Tiririca, o fato é que o novo sistema cria outras distorções e - a mais grave - despreza o voto do eleitor em favor, inclusive, daquele partido. O eleitor fez sua dupla escolha, mas o seu voto poderá ser computado para outro partido e para outro candidato.
Como justificar isso?
O tema está merecendo discussão junto ao STF em sede de ADI, mas por ora sem qualquer previsão de decisão.
Portanto, as Assembleias Estaduais e a Câmara de Deputados do próximo quadriênio serão formadas por partidos e candidatos eleitos pelo povo e outros pela matemática.
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