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16 de Junho de 2024
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    Ocultação é lavagem só quando há intenção do agente

    Publicado por Consultor Jurídico
    há 12 anos

    Uma das características mais perceptíveis no sentido histórico e na orientação do Direito Penal do Século XXI é o efetivo recrudescimento da atividade repressora do Estado caracterizada pela elaboração de esparsa legislação especial para melhor ou mais facilmente empreender a persecução de uma gama de comportamentos considerados ilícitos sob a ótica política e socioeconômica.

    A criação de novos delitos, quase todos eles com a característica de crimes de perigo, tem gerado desacertado sacrifício de algumas opções dogmáticas construídas durante séculos para preservação de direitos e garantias fundamentais.

    Tudo isso parece refletir o populismo punitivo que passamos a experimentar a partir de sentimento de insegurança surgido como fruto de uma sociedade capitalista e tecnológica, que agora é marcada por grandes transferências de riquezas e mobilidade dinâmica de capitais entre diversas classes sociais e fronteiras, circunstância que até então parecia não despertar a atenção do braço forte do Direito Penal, preocupado em apenas exercer o ius puniendi em relação àquele que lesou ou gerou risco de lesão a um bem jurídico digno de proteção.

    Foi nesse cenário que surgiram no Brasil legislações especiais como a de combate ao crime organizado e a de lavagem de dinheiro, textos legais importados de países com históricos sócio-culturais diversos e que foram adaptados pelo legislador brasileiro a uma pretensa realidade que, na prática, não se mostra factível e nem efetiva, surgindo daí deversos problemas de interpretação e enquadramento legal.

    Pode-se dizer que o surgimento dessas leis decorre da tentativa do Estado hoje cada vez mais latente em reprimir condutas que, na sua origem ou forma primária, não estavam mais sendo alcançadas pelos órgãos de persecução, em razão de suas características próprias e da mutabilidade das ações criminosas. Os fluxos financeiros provenientes daquelas atividades primárias ilícitas passaram, então, a ser a meta final da estratégia de combate desse tipo de criminalidade.

    Como nota Faria Costa, o Direito Penal, como instrumento de controle, não pode e nem deve ser subestimado na luta contra o branqueamento de capitais, por exemplo, mas a sua eficácia tem sempre um caráter limitado que se tem que jogar, no sentido de otimização, através de justo e adequado equilíbrio com todas as outras formas de intervenção estatal [1].

    Nessa dinâmica, o crime de lavagem foi concebido como um delito derivado, de segundo grau ou de conexão, pois pressupõe a prática de um ilícito igualmente típico e anterior [2]. Esse fato ilícito anterior é o que a doutrina nacional denomina de crime antecedente.

    Tendo essa questão em mente, não raro vemos acusações de crime de lavagem de capitais contra o mesmo agente que pratica o crime antecedente e que posteriormente oculta a vantagem do crime para não ser acusado ou para simplesmente usufrurir da vantagem. Mas como observa Greco Filho, no caso da lavagem de valores, indícios isolados têm levado à efetivação de medidas de persecução penal de caráter coativo e constragedor sem a análise do caso concreto e de outras circunstâncias relevantes [3].

    O julgamento da Ação Penal 470 do Supremo Tribunal Federal é uma clara demonstração da exagerada confusão que se criou com o que seria mero exaurimento do crime antecedente e o que seria a pretensão de dar aparência de legalidade a recursos de origem ilícita.

    Recentemente entrou em vigor a nova lei de lavagem de capitais, cujo texto é muito mais rigoroso do que a anterior, especialmente porque amplia, ou melhor, deixa em aberto, o rol de ilícitos antecedentes que deram origem aos recursos objeto da lavagem, punindo com a mesma pena aquele que oculta dinheiro proveniente do tráfico de drogas como aquele que empresta sua conta corrente para que um trabalhador informal que não dispõe de serviços bancários nela deposite, para posterior saque na boca do caixa, valores recebidos pela venda de um lote de terra ou automóvel que lhe pertencia licitamente, mas que jamais foi objeto de declaração ao fisco. Nesse caso, ambos estariam sujeitos às penas de 3 a 18 anos de reclusão. Nada mais desproporcional.

    É sobre esse ponto, portanto, que se debruça o presente artigo, na media em que a mera ocultação seja a título de autoria ou participação do produto do crime antencedente não chega a caracterizar o crime de lavagem se o agente, mesmo do crime precedente, não tem a intenção de promover a reciclagem dos valores ou mesmo obstaculizar a ação da Justiça. Essa intenção, como veremos adiante, não está relacionada com o dolo propriamente dito, mas com elemento subjetivo constitutivo do tipo que aparece sob a forma de intenções ou de tendências especiais ou ainda de atitudes pessoais necessárias para delinear a figura do crime [4]. A análise do elemento subjetivo constitutivo do tipo de injusto da lavagem é fundamental para a efetiva caracterização e demonstração do crime que se pretende imputar. Afinal, o conceito de tipo de injusto está diretamente ligado ao conceito de tipicidade, sem este, aquele não existe.

    Aspecto subjetivo

    Na prática penal temos nos deparado com algumas questões interpretativas do tipo de injusto da lavagem, no que diz respeito à modalidade de ocultar o produto de crime antecedente, que comumente têm gerado imprecisões, especialmente quanto à sua efetiva caracterização e demonstração.

    Primeiramente, cumpre observar que a utilização excessiva de conceitos indeterminados na descrição típica de um comportamento tem gerado diversos problemas relativos ao princípio da legalidade, como nota Greco Filho [5]. A descrição de um comportamento criminoso se faz através do tipo legal, que é o ponto de referência obrigatório para a apreciação jurídica do fato, não só na sua realização objetiva, mas ainda no seu aspecto subjetivo [6]. Na atualidade, considera-se que o ilícito está co-definido por fatores subjetivos [7]. O tipo tem ainda por objetivo descrever elementos que informem adequadamente quando e de que forma determinado comportamento gera lesão ou risco de lesão ao bem jurídico e cujo desconhecimento desses dados pelo agente fica excluído o dolo.

    Dadas essas premissas, cumpre agora analisar o tipo de injusto da lavagem em seu as...

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    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/ocultacao-e-lavagem-so-quando-ha-intencao-do-agente/100119731

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