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4 de Maio de 2024
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    Portar droga para o consumo pessoal e o instituto da descriminalização.

    há 9 meses

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    Estamos acompanhando, nos últimos dias, o retorno do julgamento que analisa a natureza criminosa do art. 28 da Lei de Drogas (11.343/06). Em suma, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidirá se a conduta de portar droga para o consumo pessoal continuará ou não sendo considerada prática criminosa no ordenamento jurídico brasileiro.

    A bem da verdade, o julgamento está suspenso após um pedido do relator, o Ministro Gilmar Mendes, a fim de verificar os votos já apresentados. Porém, segue sem previsão de retorno.

    O último a votar foi do Ministro Alexandre de Moraes que, por sua vez, defendeu pela descriminalização do porte de maconha para o uso próprio. No seu voto, argumentou sobre a necessidade de fixar uma quantidade mínima para diferenciar o usuário do traficante.

    Dito isto, vale ressaltar que o STF não analisará a natureza criminosa do tráfico de drogas, que continuará sendo punido sem sofrer qualquer tipo de influência com o presente julgamento, independente da decisão.

    Além do mais, e não menos importante, segundo dados levantados pelo DEPEN, em um artigo publicado pelo Blog LFG, crimes relacionados ao tráfico de drogas são os que mais levam pessoas às prisões no Brasil, com 28% da população carcerária total”.

    Isso demonstra que, apesar da Suprema Corte não está analisando a prática do tráfico em si, decidir acerca da natureza criminosa do art. 28 supra, irá refletir, ainda que indiretamente, naquele tipo penal, uma vez que o porte para consumo pessoal está ligeiramente associado ao tráfico – sendo um, cadeira desencadeadora do outro.

    Pois bem. Mas por que o STF está a analisar esse artigo?

    O dispositivo mencionado está inserido no capítulo III da Lei 11.343/06 (DOS CRIMES E DAS PENAS), e diz o seguinte, em suma:

    Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas:
    I - advertência sobre os efeitos das drogas;
    II - prestação de serviços à comunidade;
    III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.

    Primeiramente, e como já sabemos, esse artigo não possui pena privativa de liberdade, tampouco pena de multa a ser aplicada como sanção a quem comete essa ação. E por isso, ele é considerado, pela doutrina e jurisprudência, como sendo um instituto “despenalizado”.

    Mas por qual motivo, então, é crime..., vez que não possui as penas acima mencionadas?

    É crime pelo motivo de, como visto, está inserido no rol específico da referida lei. Além de acusado, eventualmente, perder o seu réu primário.

    Como funciona: a pessoa detida, ao ser flagranteada portando droga para o consumo pessoal, será conduzida à delegacia, lá, lavrado um Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO) e, ato contínuo, liberada. Como não há se falar em pena privativa de liberdade (prisão), a pessoa não poderá ser recolhida. Porém, o seu réu primário poderá ser perdido, uma vez que poderá haver abertura de um processo penal sobre esse fato.

    Dito isto, passemos à análise da Lei de Introdução ao Código Penal, Decreto-Lei nº 3.914 de 1941. Em seu art. 1º, diz:

    Art 1º Considera-se crime a infração penal que a lei comina pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa; contravenção, a infração penal a que a lei comina, isoladamente, pena de prisão simples ou de multa, ou ambas, alternativa ou cumulativamente.

    Ora, observa-se que o trecho acima mencionado traz os “requisitos” para que uma conduta seja considerada crime. Dentre as condições, a lei deve “cominar pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa”.

    Retomando o art. 28 da Lei de Drogas, no seu rol de sanções não há a previsão das referidas penas presentes no Decreto-Lei. Daí extrai-se, portanto, o argumento de que a prática de portar droga para o consumo pessoal não ser considerada conduta criminosa.

    Ok, batida essa parte, questiona-se: se o STF entender pela descriminalização desse dispositivo, como ficarão os processos em curso e aqueles já decididos sobre esses mesmos fatos?

    No que diz respeito às ações ainda em andamento, haverá uma clara mudança na estratégia defensiva, utilizando, sobremaneira, o julgamento da Corte, no intuito de embasar o alegado e robustecendo os argumentos.

    Por outro lado, sobre os processos já finalizados, notadamente teremos uma forte repercussão e, quiçá, beneficiando alguns réus com a nova interpretação mais benéfica, como já prevê a própria Constituição Federal de 1988:

    Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
    XL - a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu;

    É válido deixar claro que o julgamento em pauta pelo STF está a analisar a natureza criminosa do porte de maconha. No entanto, é cuidadoso alertar que essa decisão poderá se estender a todos os tipos de drogas ilícitas passíveis de levar a pessoa a responder (atualmente) ao delito do art. 28. Em outras palavras: julgando pela descriminalização da maconha, o entendimento poderá servir para descriminalizar os demais entorpecentes proibidos.

    Há Tribunais, inclusive, que há muito tempo já vêm desclassificando a prática do tráfico para o porte, usando como argumento a quantidade. Vide:

    APELAÇÃO. RECURSO DEFENSIVO. TRÁFICO DE DROGAS. SENTENÇA CONDENATÓRIA REFORMADA. Abordagem ocasional, oportunidade em que apreendidas 10g de cocaína em poder do réu. A posse restou demonstrada, sendo insuficiente, contudo, as provas acerca da destinação circulatória da substância. Inexistência de investigação ou de abordagem a usuários. Ausência de visualização de qualquer atitude que pudesse caracterizar a mercancia de drogas. Dúvida sobre a destinação da droga, pois a quantidade é compatível com o consumo pessoal ou até compartilhado. Aplicação do princípio do in dubio pro reo, a fim de absolver o acusado. Determinada a expedição de alvará de soltura na origem, para que o réu seja posto em liberdade, se por outro motivo não estiver preso. RECURSO DEFENSIVO PROVIDO.(Apelação Criminal, Nº 70085037885, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Andréia Nebenzahl de Oliveira, Julgado em: 03-07-2023)

    Nota-se, por hora, a necessidade de que haja a inserção objetiva de um dispositivo legal a fim de caracterizar, de maneira individualizada, o que seria considerado porte para consumo pessoal. Isso, claro, a partir do momento (se assim for) que o STF entender que não o art. 28 não deve ser descriminalizado. Caso contrário, o ordenamento pátrio viverá ad eternum em insegurança jurídica.

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