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16 de Junho de 2024
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    Propostas para aprimorar a democratização do Judiciário

    Publicado por Consultor Jurídico
    há 11 anos

    A evolução histórica da humanidade revela uma aparente ampliação do debate acerca da legitimidade do Estado e das instituições sociais que detém e exercem o poder [1]. As pressões sociais pela participação na tomada de decisões levam, cada vez mais, a uma consolidação do exercício da democracia como elemento de regulação dos embates políticos. Neste caminho, influenciado pelas contínuas transformações da sociedade, o Constitucionalismo [2] sofreu diversas alterações no tempo, especialmente no que se refere à ampliação da esfera de atuação do Poder Judiciário bem como à necessidade de observância do princípio democrático.

    Por outro lado, muito embora cresça o consenso quanto à necessidade de estabelecimento e perenidade da democracia, não há, ainda, um discurso claro sobre o que significa este regime e nem tampouco como este discurso teórico deve se concretizar na prática, especialmente no âmbito das instituições que compõem o Estado.

    Neste processo é possível apontar algumas direções, ainda que elas possam trazer contradições entre si e não formem um todo sistemático. A questão não é achar uma resposta definitiva (objetivo que seria no mínimo ingênuo e, no limite, arbitrário [3]), mas sim a possibilidade de formação de um discurso que tenha possibilidade de aplicação no mundo da vida e, mais particularmente, no cotidiano do Poder Judiciário.

    O fio condutor do presente trabalho é a de que a democracia é um processo e não uma simples instituição, e que ela permeia tanto a sociedade quanto pequenos grupos sociais, em qualquer aspecto em que o poder é exercido.

    Para isso, após uma breve exposição das características principais do conceito de Democracia no plano da Filosofia Política e do Direito Constitucional Positivo e do papel do Judiciário, buscar-se-á apresentar algumas possibilidades para implementação de uma gestão democrática do Judiciário, tanto no plano de sua atividade-fim, quanto a aspectos de suas atividades-meio.

    A ideia e a prática da democracia

    A democracia é um termo utilizado tanto para designar um tipo de regime político quanto uma teoria política. Ambos partem do pressuposto de que os governos são legítimos quando as pessoas afetadas pelas decisões coletivas participam do processo de sua formulação [4]. Em função da competição política nos regimes democráticos, a existência de oposição representa um mecanismo de controle que obriga a prestação de contas pelos detentores do poder político [5]. Essa democracia competitiva facilita a discussão sobre os argumentos utilizados pelos políticos, obrigando-os a justificar as suas decisões [6].

    O princípio fundamental da democracia é o de que, nas questões que afetam a vida e os interesses coletivos, o povo sabe se governar [7]. Ou seja, a legitimação do Estado decorre da soberania popular, que seria, em última instância, o verdadeiro detentor do poder [8]. Contra esse princípio, argumenta-se que, em certos assuntos, o povo não saberia decidir adequadamente (argumento do comandante do navio) [9]. Este argumento contrário a uma democracia total foi inicialmente desenvolvido por Platão na sua obra A República. Segundo ele, por analogia, o povo seria como tripulantes de um navio que, por não terem ideia de que existe uma ciência da navegação, em vez de estudarem os astros, as estações do ano e os ventos para guiar o barco, discutem, entre si, para ver quem comandará o navio, embora todos se achem mais aptos do que os demais [10]. Para Platão, o bem supremo é o conhecimento e a democracia acaba sendo regida pelo princípio da bajulação das massas, geralmente incapazes de aceitar ou ver a verdade [11].

    Decorre do princípio da democracia a regra da maioria, isto é, as decisões são feitas a partir da vontade da maior parte dos votantes. Para os antigos, o regime democrático implicava que as decisões fossem tomadas em assembléias com a participação de todos; o que não seria possível em estados com grande extensão territorial. Porém, a partir da experiência norte-americana, foi iniciada, com os escritos dos Federalistas, uma distinção entre democracia e República. Esta permitiria a representação. Mais tarde, passa-se a admitir que a forma representativa também é democracia [12].

    Um argumento que se opõe à regra da maioria é o da tirania da maioria, isto é, o fato de que as minorias ficariam sujeitas à vontade das maiorias. Por isso, alega-se que a democracia seria, em certa medida, inimiga dos direitos individuais [13]. Esse perigo pode ser reduzido por alguns instrumentos antimajoritários, tais como a previsão de mecanismos de veto institucionais entre os poderes (freios e contrapesos), constitucionalização de direitos individuais cuja alteração seja possível somente por um quorum qualificado e atribuição para um órgão independente (tribunal constitucional) da tarefa de manter estes limites [14]. Este argumento é utilizado por Dworkin para atacar a concepção de direito que, em nome de um tipo de democracia, limita as decisões políticas e morais aos órgãos responsabilizáveis. Para ele, porém, diante da equidade, as decisões que digam respeito a direitos contra a maioria não podem ser deixados para a própria maioria [15].

    Dworkin sugere uma dupla classificação de concepções de democracia. Uma concepção dependente de democracia é a que tenha a maior probabilidade de produzir decisões substantivas que tratem com igual consideração os membros da comunidade, exigindo, portanto, sufrágio universal, liberdade de expressão e outros direitos inerentes [16]. Uma concepção separada de democracia julga o processo político apenas pelas suas próprias características, e não pelo resultado que dele pode surgir [17]. Assim, enquanto a concepção separada avalia a partir de um teste inicial, a dependente avalia por um teste de chegada, ou seja, a democracia é um conjunto de dispositivos para produção de resultados do tipo certo [18]. Por conta dessas diferenças, a concepção separada é mais popular e a concepção dependente gera mais controvérsias [19]. Essa distinção de Dworkin corresponde à distinção entre democracia formal e democracia substancial. Numa discussão sobre os fins e valores que movem um grupo político, o discurso sobre democracia distingue a democracia formal que trata da forma de governar (como se governa) e a substancial, que diz quais os fins para que se governa (o conteúdo da forma de governo) [20].

    Como se vê, muito embora a expressão Democracia tenha uma carga valorativa positiva, gerando um consenso sobre a sua importância, o seu detalhamento contém diversos aspectos sobre os quais há divergência.

    No plano do Direito positivo, notadamente no Constitucional, a democracia foi uma opção política explícita tomada pelos constituintes em 1988, tanto que assim a expressam no Preâmbulo da Constituição da Republica Federativa do Brasil (CR). De fato, o texto constitucional é aberto com a menção de que a República constitui-se num Estado Democrático de Direito (art. 1º) e que os entes federados deverão zelar pela Constituição e pelas instituições democráticas (art. 23, I). Aliás, se os Estados atuarem contra o regime democrático, poderão ser alvos de intervenção Federal (art. 34, VII, a).

    A democracia, enquanto regime político valorizado pelo constituinte, foi alçado à proteção especial, seja pela hipótese de previsão de inafiançabilidade e imprescritibilidade da ação de grupos armados contra o Estado democrático (art. 5º, XLIV), seja pela vedação de partidos políticos que não resguardem o regime democrático (art. 17) ou que não haja norma tendente a abolir o voto direto, secreto, universal e periódico (art. 60, § 4º, II) [21].

    É importante notar que a ideia democrática não está restrita ao exercício do direito de votar e ser votado, mas também na ordem constitucional para que certas instituições sejam geridas com a participação dos interessados. Com efeito, a seguridade social, como conjunto de ações de iniciativa do Estado e da sociedade, deve ser administrado de forma democrática, mediante gestão quadripartite (art. 194, p. único, VII). Também deve ser gerido democraticamente o ensino público (art. 206, VI) e o acesso aos bens culturais (art. 215, § 3º, IV). Além disso, a participação popular também se dá na forma de consultas (iniciativa popular, referendo e plebiscito), previstas na Constituição (art. 14) e regulamentadas pela Lei 9.709/1998.

    Por fim, como um dos mais importantes instrumentos de salvaguarda das minorias ou dos indivíduos em face da regra da maioria, a Constituição de 1988 prevê a impossibilidade de edição de norma para certos assuntos, ainda que a ofensa seja potencial (= tendente a abolir). Por isso, são previstas as chamadas cláusula pétreas, ou seja, normas constitucionais imunes a alterações futuras, constitucionais ou legais, que abrangem a forma federativa de Estado, o voto direto, secreto, universal e periódico, a separação dos Poderes e os direitos e garantias individuais (art. 60, § 4º) [22].

    O Judiciário no Estado Contemporâneo

    O Poder Judiciário sempre foi caracterizado como o conjunto de atribuições do Estado destinado a compor litígios concretos, ou seja, órgão estatal cuja função jurídica e social é de individualizar as normas gerais e abstratas emanadas do Poder Legislativo para dizer a solução de um conflito específico que lhe foi trazido.

    Porém, um novo papel foi exigido do Poder Judiciário nas sociedades contemporâneas [23]. Houve uma invasão da política pelo Direito em função evolução do Estado de bem-estar. A profusão de direitos sociais e o ideal de um Estado regido por uma Constituição dirigente produziram novas exigências por parte da sociedade e uma transformação do Estado legal para um Estado Constitucional.

    Nele, o Executivo e Legislativo buscam regrar os processos econômicos de forma simultânea ao seu acontecimento. Orientam-se, para essa regulação, não pelo tempo passado, mas pelo tempo futuro. Com isso, surgem as leis experimentais de caráter temporário e a utilização cada vez maior de conceitos jurídicos indeterminados.

    Cada vez mais é exigido o cumprimento das promessas da Jurisdição de pacificação, da qual surgem os chamados escopos do processo, isto é, (1) o escopo social, pelo qual o processo se torna elemento para educação dos direitos próprios e alheios; (2) os escopos políticos, caracterizados tanto pela preservação da liberdade individual de cada um, quanto de participação de todos nos destinos da nação, e, ainda, (3) o escopo jurídico do processo, pelo qual este atua a fim de fazer valer a vontade concreta do direito.

    Como consequência, aumentam os litígios trazidos pela sociedade civil ao Judiciário, deslocando o poder de decisão política para este, já que ele dará a palavra final. Aliados a este fenômeno que tornou o juiz um legislador implícito, surgem, também, (1) a positivação de princípios jurídicos e direitos fundamentais nas constituições modernas, ampliando os limites de interpretação jurídica direcionada a um imaginário do ético e do justo, e (2) a massificação da tutela jurídica nos conflitos coletivos, transformando o Judiciário em uma alternativa para o exercício do jogo político.

    Neste sentido, enquanto face do Estado (art. , CR), o Poder Judiciário está orientado não só pelos ditames que regem toda a administração pública (art. 37, CR) legalidade, moralidade, impessoalidade, finalidad...

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