Superior Tribunal Militar concede liberdade a militar preso por considerar que prisão preventiva de militar poderia pôr em risco a presunção de inocência
O Superior Tribunal Militar (STM) decidiu revogar prisão privativa de militar da Marinha por considerar que a medida carecia de razoabilidade. O militar estava preso há 70 dias e entrou com um habeas corpus no tribunal alegando falta de fundamentação legal que justificassem a manutenção da prisão.
De acordo a hipótese apresentada nos autos do HC, o militar foi preso em virtude de ter, em tese, abandonado o posto em que servia e levado consigo todos os equipamentos que lhe foram confiados, inclusive o Fuzil FAL, com o intuito de vendê-lo no mercado paralelo. Ele estava de serviço na Praia de Inema (BA), no dia dos fatos, em 7 de julho deste ano.
No habeas corpus impetrado no STM, a defesa sustentava, no entanto, que o intento do militar não chegou a se concretizar porque ele teria se arrependido e por isso se apresentou a uma guarnição da Polícia Militar que o levou ao local em que o Fuzil estava escondido, e, posteriormente, foi conduzido à sua Organização Militar de origem, momento em que lhe foi dada voz de prisão.
O paciente alega que, ao chegar à Base Naval, foi preso, o que configuraria flagrante ilegalidade, porquanto o Paciente teria se apresentado espontaneamente. Informa também que em audiência de custódia realizada no dia 9 de julho o Juízo da Auditoria de Salvador converteu a prisão em flagrante em prisão preventiva. No dia 29 de julho foi concedida a liberdade provisória ao paciente e no dia do recebimento da denúncia (15 de agosto) o Conselho Permanente de Justiça para a Marinha decretou nova prisão preventiva.
Diante dos fatos narrados no HC, a defesa requeria, entre outras coisas, a concessão de liminar para determinar o trancamento da Ação Penal Militar nº 7000127-73.2019.7.06.0006, a anulação do Auto de Prisão em Flagrante que serviu de subsídio para a Ação Penal, e que fosse revogada a prisão preventiva do paciente.
Plenário concede liberdade ao paciente
Ao apreciar o pedido, o ministro Carlos Augusto de Sousa avaliou não ser possível concluir, pela via do HC, que a prisão em flagrante foi ilegal com base apenas no fato de o militar ter em tese se apresentado voluntariamente. “A norma que estabelece a impossibilidade de se prender em flagrante aquele que se apresenta voluntariamente não se transmuta em regra rígida matemática, devendo a autoridade avaliar caso a caso o evento, de modo que, em não se tratando de ilegalidade chapada, ou seja, aquela que salta aos olhos do julgador, descura-se tratar nesta via estreita.”
O ministro ressaltou que a prisão preventiva dos militares pode ser decretada com fundamento na “exigência da manutenção das normas ou princípios de hierarquia e disciplina militares, quando ficarem ameaçados ou atingidos com a liberdade do indiciado ou acusado” (Art. 255, alínea e, do Código de Processo Penal Militar). Esse de fato foi o motivo para a decretação da prisão preventiva do paciente, como lembrou o magistrado.
Segundo o ministro, a manutenção da prisão preventiva se justificaria pela exigência da preservação de normas e princípios de hierarquia e de disciplina militares, como na hipótese de o acusado ou indiciado evidenciar “um comportamento acintoso, desafiador, desrespeitoso, em relação aos seus superiores e subordinados, desde que relacionado ao fato delituoso em apuração, e esses eventos, ao menos prima facie, não ocorrem nos autos”.
“Malgrado meu entendimento de que a conduta, em tese, praticada pelo Paciente, foi assaz perniciosa para os preceitos fundantes da hierarquia e da disciplina militar, faz-se premente salientar que a prisão perdura por 70 (setenta) dias, tempo suficiente para, no presente caso, garantir a manutenção das normas ou princípios de hierarquia e disciplina militares”, afirmou o ministro Carlos Augusto, lembrando que “o efeito pedagógico intramuros já ocorreu”.
O ministro afirmou ainda em seu voto que seria prematuro basear a manutenção da prisão pela prática dos crimes de abandono de posto (art. 195 do CPM) e peculato (art. 303 do CPM), consubstanciado, em tese, na finalidade mercantil de repassar a arma ao mercado paralelo. “Seria demasiadamente pernicioso ao primado da presunção da inocência fazer qualquer antecipação de análise de mérito para o presente momento processual”, afirmou.
Por fim, o relator reforçou que a decisão atacada pelo habeas corpus carece de fundamentação para demonstrar a real necessidade da custódia ou a existência de outros fatos que impeçam o militar de aguardar o julgamento em liberdade.
“Na hipótese dos autos, não há notícia de outros fatos que impeçam o Paciente de aguardar o julgamento em liberdade, ou mesmo de que sua colocação em liberdade causará perturbação à marcha processual ou impedirá a produção probatória. Extrai-se dos autos que o Paciente é réu primário, não possui antecedentes criminais, possui endereço fixo, e não há informação que aponte que o Paciente continue afrontando a disciplina e a hierarquia”, concluiu.
Habeas Corpus 7000973-76.2019.7.00.0000
A sessão de julgamento foi transmitida ao vivo
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