Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
16 de Junho de 2024
    Adicione tópicos

    TJ/DF reconhece a possibilidade de renúncia à impenhorabilidade do bem de família

    há 16 anos

    A NOTÍCIA (fonte: http://www.tjdft.jus.br )

    TURMA DECIDE QUE IMPENHORABILIDADE DE BEM DE FAMÍLIA É DIREITO DISPONÍVEL

    A 1ª Turma Cível do TJDFT negou provimento ao recurso de uma aposentada que pedia a nulidade de uma cláusula contratual firmada com a Interline Turismo, na qual renunciava à impenhorabilidade do único imóvel familiar. A decisão manteve o entendimento do juiz da 1ª instância, autorizando, portanto, a penhora do bem.

    Segundo os autos, a servidora pública aposentada protocolou ação de desconstituição de penhora pedindo a nulidade desta, uma vez que o imóvel questionado constitui bem de família, sendo o único que possui. Assevera que o direito à moradia é garantido pela Constituição Federal , e que o imóvel estaria protegido pela Lei 8.009 /90 (que dispõe sobre a impenhorabilidade do bem de família). Sustenta que a mesma não pode ser desconsiderada, sob pena de prejuízo aos demais familiares, e pondera que a dívida questionada não se enquadra nas hipóteses previstas na Lei, autorizadoras da penhora do bem de família.

    Na decisão interlocutória de 1ª Instância, o juiz verifica que a devedora, na qualidade de fiadora, renunciou expressamente ao direito de impenhorabilidade do imóvel que reside com a família. Assim, para o magistrado, a alegação de que a cláusula seria nula de pleno direito não se sustenta, até porque a devedora é pessoa com instrução suficiente para entender o que estava assinando, não podendo alegar em seu proveito a nulidade da cláusula para se esquivar do cumprimento de suas obrigações. Além do mais, prossegue o juiz, não há nos autos qualquer prova de que a devedora tenha sigo coagida ou forçada a assinar tal contrato, presumindo-se que o fez de livre e espontânea vontade.

    Ao proferir seu voto, a relatora da 1ª Turma Cível registra que a Lei 8.009 /90 não constitui norma de ordem pública - natureza atribuída apenas ao direito social de moradia, assegurado pela Constituição . Ela ensina que a legislação se trata, portanto, de direito disponível da parte, no qual é válido o exercício do direito de renúncia à impenhorabilidade, inexistindo óbice à penhora efetivada sobre o imóvel.

    A magistrada confirma a posição do julgador da 1ª instância, ainda, ao registrar que "No momento da formação do negócio jurídico, o contratante, de acordo com seus interesses ou necessidades para efetivação do contrato, renuncia à impenhorabilidade, atribuindo ao outro contratante a garantia para a negociação. No entanto, a desconstituição da cláusula, após a formação do contrato, e, principalmente, em momento de inadimplência contratual, viola os princípios da obrigatoriedade e da boa-fé, uma vez que alegar invalidade da sua própria declaração de vontade, em momento crítico do contrato, é, de certa forma, agir de modo torpe".

    A decisão foi unânime

    NOTAS DA REDAÇÃO

    De plano, cumpre-nos tecer alguns comentários sobre as principais características do bem de família.

    No que se refere à sua natureza jurídica, nada obstante as divergências doutrinárias, o entendimento adotado por Caio Mário é o mais aceito atualmente. O professor afirma que o instituto é "uma forma de afetação de bens a um destino especial, que é ser a residência da família, e, enquanto for, de impostos devidos pelo próprio prédio" (PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil: introdução ao Direito Civil - teoria geral de Direito Civil. v.1. 12ed. Rio de Janeiro: Forense, 1991. p.311).

    Ademais, Marcione Pereira dos Santos afirma que é norma de direito de família patrimonial, oponível erga omnes. (SANTOS, Marcione Pereira dos. bem de família: voluntário e legal. São Paulo: Saraiva, 2003. p.79). Em outras palavras, trata-se de instituto de direito público (cogente) que, sob a ótica processual, deve ser acolhido independentemente de "cânones procedimentais" por sua própria função e natureza, cabendo, inclusive, conhecimento de ofício pelo magistrado (CREDIE, Ricardo Arcoverde. bem de Família: teoria e prática. 2ªed. São Paulo: Saraiva, 2004. p.96).

    Feitas as considerações necessárias, passaremos ao caso em comento, em que se analisou a natureza desse direito, se se trata de direito disponível ou indisponível. Em outras palavras, se o beneficiário da impenhorabilidade do bem de família, pode a ela renunciar.

    A doutrina se divide em relação ao tema. A discussão nasceu do fato de, comumente, proprietários de bens de família, os oferecer em garantia em negociações e dívidas. De um lado, encontramos autores de renome, e, tribunais, como é o caso do TJ/DF, que defendem a tese de que, uma vez renunciado, pelo próprio beneficiário, o direito que lhe é outorgado pela Lei 8.009 /90, esse não mais poderá alegá-lo em sua defesa, o que autoriza, automaticamente, a penhora do bem.

    Em contrapartida, parcela da doutrina entende não ser possível a renúncia ao benefício impenhorabilidade do bem de família, em razão, principalmente, da natureza da norma que a prevê -de ordem pública - o que, por si só, já revelaria a indisponibilidade do direito.

    Note-se que os Tribunais de Justiça filiam-se à primeira posição. Não são raras as decisões em que, em razão da oferta, pelo devedor, do bem de família como garantia, os Tribunais entendem ter se concretizado a renúncia ao benefício. Esse é o entendimento, conforme visto, do TJ/DF, e, do TJ/RS.

    No entanto, não é essa a posição firmada pelos nossos tribunais superiores.

    Em consonância com a jurisprudência do STJ "a indicação do bem de família à penhora não implica em renúncia ao benefício conferido pela Lei 8.009 /90, máxime por tratar-se de norma cogente que contém princípio de ordem pública. Dessarte, a indicação do bem à penhora não produz efeito capaz de elidir o benefício assegurado pelo diploma legal".

    Há de se compreender que, para o STJ, as exceções à impenhorabilidade prevista na Lei 8.099 /90 devem decorrer de expressa previsão legal.

    Ressalta-se que toda discussão tem como objeto a impenhorabilidade trazida pela Lei 8.099 /90, e que, em momento algum, discutiu-se o instituto do bem de família previsto no Código Civil .

    Vale lembrar que, no ordenamento jurídico hoje vigente no Brasil, contamos com duas espécies de bem de família: o voluntário e o legal. O primeiro que é regulamentado pelo Código Civil (Art. 1.711 e ss), decorre da vontade dos interessados, ao passo que o segundo, como o próprio nome nos revela, é involuntário, caracterizando-se como furto de imposição legal, de norma de ordem pública, independentemente da manifestação de vontade do instituidor.

    Art. 1.711 - Código Civil podem os cônjuges, ou a entidade familiar, mediante escritura pública ou testamento, destinar parte de seu patrimônio para instituir bem de família, desde que não ultrapasse um terço do patrimônio líquido existente ao tempo da instituição, mantidas as regras sobre a impenhorabilidade do imóvel residencial estabelecida em lei especial .

    Art. 1º - Lei 8.099 /90 - o imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei .

    Da leitura dos dispositivos supracitados é possível extrair as principais diferenças entre essas duas espécies de bem de famílias. Ao tratar do bem de família voluntário, o Código Civil evidencia a faculdade atribuída aos respectivos proprietários, no que concerne à sua instituição. Por outro lado, a Lei 8.099 /90, independentemente de qualquer ato de vontade, considera bem de família um determinado bem, que atenda aos requisitos legais.

    Sendo assim, se, para a instituição do bem de família legal não se exige qualquer ato de vontade dos proprietários, não há como admitir a concretização da renúncia desse direito, também por ato de vontade. A norma que o reconhece é de ordem pública, cogente, o que não abre espaço para qualquer disposição de vontade.

    Nessa linha de raciocínio, duas situações distintas devem ser consideradas. A impenhorabilidade oriunda da Lei 8.009 /90 e a resultante do Código Civil . A primeira, em razão da sua natureza - ordem pública - é indisponível. Todavia, se a impenhorabilidade resultar de ato de vontade do instituidor, ou seja, tiver como fundamento o Código Civil , abre-se espaço para a disponibilidade, e, via de conseqüência, para a renúncia.

    No caso em comento, o TJ/DF reconheceu a renúncia à impenhorabilidade fundada na Lei 8.099 /90, o que, a nosso ver, contraria a essência do instituto.

    • Sobre o autorTradição em cursos para OAB, concursos e atualização e prática profissional
    • Publicações15363
    • Seguidores876049
    Detalhes da publicação
    • Tipo do documentoNotícia
    • Visualizações3890
    De onde vêm as informações do Jusbrasil?
    Este conteúdo foi produzido e/ou disponibilizado por pessoas da Comunidade, que são responsáveis pelas respectivas opiniões. O Jusbrasil realiza a moderação do conteúdo de nossa Comunidade. Mesmo assim, caso entenda que o conteúdo deste artigo viole as Regras de Publicação, clique na opção "reportar" que o nosso time irá avaliar o relato e tomar as medidas cabíveis, se necessário. Conheça nossos Termos de uso e Regras de Publicação.
    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/tj-df-reconhece-a-possibilidade-de-renuncia-a-impenhorabilidade-do-bem-de-familia/79771

    Informações relacionadas

    Juarez de Jesus Filho, Advogado
    Notíciashá 7 anos

    Dispensa da Emissão de Nota Fiscal na Locação de Bens

    Marcello Benevides, Advogado
    Artigosano passado

    O que é juntada de ofício? (expedição de ofício)

    Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes
    Notíciashá 16 anos

    O que significa a irrenunciabilidade dos direitos fundamentais? - Ariane Fucci Wady

    Hugo Pires, Advogado
    Artigoshá 9 anos

    A irrenunciabilidade aos direitos fundamentais como negação à liberdade da pessoa

    Canal Ciências Criminais, Estudante de Direito
    Artigoshá 8 anos

    Indisponibilidade dos direitos fundamentais: análise a partir das garantias

    0 Comentários

    Faça um comentário construtivo para esse documento.

    Não use muitas letras maiúsculas, isso denota "GRITAR" ;)