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16 de Junho de 2024
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    Tribunal absolve motorista processado por capotamento de viatura e entende que o militar evitou um mal maior

    há 5 anos

    A maioria dos ministros do Superior Tribunal Militar (STM) decidiu absolver um cabo do Exército que se envolveu em acidente de carro que resultou na lesão de sete militares. O motorista havia sido condenado na primeira instância a nove meses de detenção por dano em material de utilidade militar e lesão culposa. No entanto, os ministros entenderam que não havia provas suficientes para a condenação, com base no voto da ministra revisora, Maria Elizabeth Rocha.

    O acidente ocorreu em outubro de 2014, em uma das duas viaturas do Exército que seguiam de Belém para Marabá, no estado do Pará. Enquanto realizava uma curva para a esquerda, logo após um declive, o motorista de uma Agrale Marruá perdeu o controle do veículo, que capotou, causando lesões corporais em sete dos dez passageiros.

    O Conselho de Justiça da Auditoria de Belém, responsável pelo julgamento em primeira instância, concluiu que ao realizar uma curva para a esquerda, a qual estava devidamente sinalizada, permitiu que o veículo passasse a trafegar pelo acostamento do lado direito. Ao retornar para a pista de rolamento, invadiu a faixa em sentido contrário e, ao tentar corrigir a trajetória do veículo, realizou uma manobra brusca para a direita, o que teria causado o capotamento.

    A sentença que condenou o militar a nove meses de detenção apontou, ainda, a ausência de cuidado objetivo por parte do acusado como nexo causal entre a forma imprudente de dirigir o veículo e os resultados: lesões corporais e um prejuízo avaliado em cerca de R$ 34 mil. Os juízes militares que compunham o Conselho consideraram que, apesar da velocidade ser compatível com a via (70 km/h), o acusado confessou ter ido para o acostamento por ter calculado que a curva era mais aberta do que seria de fato.

    Recurso da defesa

    No recurso remetido ao STM, a defesa do cabo alegou, essencialmente, a existência da excludente de crime com base no estado de necessidade. Alegou ter o apelante empregado a manobra brusca para sair do acostamento e voltar à pista de rolamento em virtude da existência de um barranco à frente, atitude essa que evitou consequências mais graves em relação ao contido na denúncia.

    Sustentou também que o capotamento da viatura decorreu do estouro nos pneus traseiros no momento da manobra. Ressaltou a ausência de comprovação de ter o apelante agido com imprudência, imperícia ou negligência, pois, ao contrário do contido na sentença, atentou-se ao dever de cuidado objetivo, evitando resultado mais gravoso caso viesse a cair no barranco.

    O relator do caso, ministro William de Oliveira Barros, e mais um ministro votaram pela manutenção da condenação do acusado. Segundo o relator, as alegações da defesa, por si só, não são “hábeis para elidir a responsabilidade penal do apelante". Segundo o ministro, não é possível nesse caso haver excludente de crime com base no estado de necessidade, “se o próprio apelante se colocou em situação de perigo ao conduzir o veículo de forma inadequada”.

    “Conforme se extrai de suas declarações, o apelante imaginou ser a curva mais aberta do que seria, daí a razão pela qual não empregou a cautela necessária para evitar que a viatura passasse a trafegar pelo acostamento, em evidente descumprimento das regras de trânsito. Conclui-se assim que o alegado risco de o veículo cair em um barranco foi provado pelo próprio condutor”, concluiu o relator.

    O ministro também descartou a tese de que o capotamento foi provocado pelo estouro dos pneus, pois, se isso ocorreu, foi decorrência de decisões prévias do próprio condutor. “A imprudência restou apurada no momento em que o motorista adentrou a curva e derrapou para o acostamento, além de exercer manobras bruscas, tanto para sair do acostamento quanto para retornar ao sentido regular da rodovia após adentrar na contramão.”

    Entre os elementos constitutivos do tipo culposo, segundo o relator, destaca-se a inobservância do dever de cuidado objetivo por parte do agente ao ter entrado na curva com uma velocidade superior àquela requerida para fazer a manobra com segurança. Quanto ao nexo causal, ele se verificaria, para o magistrado, por meio da conduta imprudente e negligente, tendo como resultado as avarias causadas na viatura e as lesões em sete passageiros.

    Tese divergente

    A revisora do caso, ministra Maria Elizabeth Rocha, liderou a corrente divergente, que votou pela absolvição do réu. Inicialmente, a magistrada afirmou que não resta dúvida de que o triplo capotamento da viatura foi causador das lesões e em seguida passou a fazer a distinção entre a conduta culposa e a dolosa.

    Para a caracterização da culpa, afirmou a ministra, é necessário a presença dos seguintes elementos: conduta humana voluntária, comissiva ou omissiva; inobservância de um dever objetivo de cuidado, sob as modalidades de negligência, imprudência ou imperícia; resultado lesivo não querido, tampouco assumido; nexo causal entre a conduta desmazelada ou resultado lesivo; previsibilidade da ocorrência do resultado naturalístico; e, por fim, tipicidade a fim de que a conduta encontre respaldo típico no ordenamento.

    A revisora trouxe como dado inicial a ser avaliado a ausência de um laudo conclusivo por parte da perícia que definisse a velocidade da viatura no momento da manobra que causou o acidente, nem que constatasse que o sistema de sinalização e freios da viatura funcionavam a contento. Também, segundo ela, não se conseguiu precisar o momento em que os pneus estouraram e o tempo entre o acionamento do sistema de frenagem e a efetiva parada do veículo. O chefe da perícia justificou o laudo inconclusivo sobre esses aspectos, entre outras coisas, pelo fato de as marcas dos pneus terem se apagado com o tempo.

    Segundo a ministra, o sargento que era um dos passageiros e chefe da viatura afirmou categoricamente que o motorista trafegava com velocidade abaixo da requerida pela via e que o acostamento não se encontrava em perfeitas condições, pois este apresentava um desnível de cerca de 30 centímetros em relação à pista. De acordo com o mesmo sargento, a manobra brusca à esquerda realizada pelo cabo evitou que o veículo caísse em um “abismo”. Ela afirmou também que, embora a maioria dos passageiros estivesse dormindo no momento do ocorrido, algumas testemunhas afirmaram que o motorista dirigia sem nenhum excesso.

    A partir da análise do manual do veículo Agrale Marruá para fins militares, a ministra declarou que, a partir das especificações do fabricante, pode-se concluir que ele está apto para ultrapassar um obstáculo lateral de 30 centímetros, como o do caso em questão, “em velocidade média sem grandes esforços, inclusive sem estourar os pneus”, o que não ocorreu. Segundo a magistrada, isso faz presumir falha técnica do automóvel e não humana.

    “Caso os pneus da viatura não tivessem estourado, e a perícia não soube detectar o momento exato em que eles estrugiram, o veículo teria adentrado a pista de rolamento sem problemas, uma vez que possui suspensão mais do que resistente para movimentos abruptos e inclusive em combate”, concluiu a ministra, afirmando que por isso a viatura revelou “fragilidade incomum à sua natureza militar”.

    A ministra acrescentou que, embora o motorista tenha recebido treinamento em direção defensiva, “mesmo os mais astutos condutores cometem deslizes em condições desfavoráveis”. O fato ainda teria sido agravado pelas más condições da pista e do acostamento, havendo relatos da polícia rodoviária federal e de testemunhas de que o trecho possui um conhecido histórico de acidentes.

    Outro dado considerado bastante relevante pela revisora é que, apesar de o fabricante declarar que estão disponíveis cintos de segurança na caçamba do veículo para oito pessoas, eles eram inexistentes. Por essa razão, apenas o condutor e o chefe da viatura, que dispunham de cintos, restaram ilesos. Maria Elizabeth salientou também que, embora não seja exigido o uso dos cintos em veículos militares, o Ministério Público Federal e a Advocacia Geral da União (AGU) já ajuizaram ação civil pública contra a União para que a prática se torne obrigatória em contexto bélico e quando estiverem em caçambas.

    A ministra concluiu o seu voto, sendo acompanhada pela maioria do Plenário, declarando que o motorista agiu de acordo as normas de condutas esperadas objetivamente. “Para além, agiu com a perícia apropriada, uma vez que a manobra evitou acidente ainda mais gravoso, salvando possivelmente as vidas dos demais militares que não estavam com cinto de segurança”, concluiu o voto de absolvição, com base na insuficiência de provas para a condenação.

    Apelação 0000010-83.2015.7.08.0008

    A sessão de julgamento foi transmitida ao vivo

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