Página 958 da Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte I do Diário de Justiça do Estado de São Paulo (DJSP) de 26 de Janeiro de 2015

Processo 101XXXX-22.2014.8.26.0071 - Procedimento Ordinário - Custeio de Assistência Médica - MITIYO BEPPU DIAS e outros - CAIXA BENEFICENTE DA POLICIA MILITAR DE SÃO PAULO - Vistos. Mitiyo Beppu Dias, por si e representando seus filhos menores Pedro Henrique Beppu Dias e Gabriel Augusto Beppu Dias propuseram ação contra a Caixa Beneficente da Polícia Militar do Estado de São Paulo - CBPM. Alegam, em resumo, que suportam descontos compulsórios de 2% (dois por cento) da pensão que percebem em favor da Requerida para custear o sistema de saúde da Polícia Militar do Estado de São Paulo. Afirmam que não fazem uso da assistência médica odontológica disponibilizada pela Requerida e que têm o direito de escolher livremente o plano de saúde que mais atenda às suas necessidades, nos termos de regra constitucional. Pediram a antecipação dos efeitos da tutela para a cessação da contribuição de assistência médica CBPM, bem como a procedência da ação para a mesma finalidade, bem assim para condenar a ré a devolver os valores indevidamente descontados a partir da citação, acrescidos de atualização monetária e juros (fls. 01/12). Juntaram documentos (fls. 13/19). Decisão de fls. 26/27 deferiu a antecipação dos efeitos da tutela. Devidamente citada, a requerida apresentou contestação sustentando a impossibilidade de devolução dos valores pagos antes da citação porque as contribuições pretéritas recolhidas já foram utilizadas para cobrir necessidades médicas, hospitalares ou odontológicas dos beneficiários do sistema, inclusive de dependentes dos próprios Requerentes. Alegou ainda que a contribuição discutida atende a exigência legal da Lei Estadual nº 452/74 e que a Cruz Azul não se trata de uma entidade privada de prestação de serviços médicos, mas de uma instituição oficial, cujo vínculo se dá em razão de regime jurídico próprio. Afirmou que não há qualquer desrespeito aos princípios da legalidade, moralidade e impessoalidade vez que se trata de ato legítimo e legal da Administração e, por fim, que a restituição e cessação dos descontos afetariam o equilíbrio de todo um sistema de saúde. Requereu a improcedência do pedido (fls. 31/34). Réplica a fls. 41/45. Manifestando-se nos autos, opina o Ministério Público pela procedência do pedido inicial (fls. 50/54 e 63). É o relatório. FUNDAMENTO E DECIDO. Julgo a lide no estado em que se encontra, vez que se trata de matéria exclusivamente de direito. A requerida alegou na contestação que a cobrança deve ser mantida, pois é feita com base na Lei Estadual nº 452/74. Não obstante, adoto como razão de decidir os fundamentos do acórdão proferido no julgamento da Apelação nº 000XXXX-63.2009.8.26.0032, em 31 de janeiro de 2011, da relatoria do Des. TORRES DE CARVALHO, da 10ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo: “A LE nº 452/74 instituiu, mediante fusão das autarquias congêneres da Força Pública e da Guarda Civil, a Caixa Beneficente da Polícia Militar - CBPM, autarquia estadual ‘como instituição essencialmente de previdência e de assistência médico-hospitalar e odontológica da Polícia Militar do Estado de São Paulo...’ (art. 1º e seu § 1º). A CBPM se responsabiliza pelo pagamento de pensão aos beneficiários de oficiais e praças PM (Título II - ‘Do Regime Previdenciário’) e presta assistência médico-hospitalar e odontológica aos beneficiários dos contribuintes da CBPM (Título III -‘Do Regime de Assistência Médico-Hospitalar e Odontológica’). A lei paulista instituiu, em favor dos oficiais e praças, policiais militares e seus dependentes, um sistema previdenciário e um sistema de assistência médica-odontológica. Analisei o tema em maior extensão em CBPM vs Rodrigo Ulcles Bernardo, AInt nº 891.345.5/8-01, desta Câmara, 2009, voto AI-1147; concluímos que por força da LE nº 452/74 os oficiais e praças ativos e inativos da Polícia Militar são contribuintes obrigatórios da CBPM, arcando com descontos de 6% (regime previdenciário) e de 3% (hoje 2%) (regime de assistência médico-hospitalar e odontológica).A CBPM presta assistência previdenciária e assistência médico-hospitalar aos dependentes e beneficiários, uma vez que os oficiais e praças fazem jus a ambos por outro fundamento. Tal lei e tal regime eram válidos por ocasião de sua edição; não havia proibição na legislação constitucional anterior e era facultado ao Estado instituir regime previdenciário próprio para seus servidores; ocorre que a Constituição Federal permitiu no art. 149 § 1º que “os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir contribuição, cobrada de seus servidores, para o custeio, em benefício deste, de sistemas de previdência e assistência social” (o parágrafo, antes único, foi renumerado, sem modificação da redação, pela EC nº 43/2001); não permitiu a instituição de contribuição compulsória, portanto, para o sistema de saúde. Em outras palavras, o regime constitucional atual não permite ao Estado instituir contribuição social de seus servidores visando o custeio de sistema de saúde. O art. 32 da LE nº 452/74, ao cuidar de contribuintes obrigatórios de seu sistema de saúde, não foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988. A contribuição (que a lei intitula de ‘taxa’) para o ‘regime de assistência médico-hospitalar e odontológica’ não pode ser compulsória - deve ser tida como facultativa, inscrevendo-se em tal regime os contribuintes que o desejarem. Fique certo, para que a decisão não cause dúvida: pode a CBPM oferecer um sistema de assistência médicoodontológico para os dependentes de seus segurados, como vem fazendo, recebendo dos interessados a contribuição prevista em lei. Não pode, no entanto, obrigá-los a participar de tal sistema - a compulsoriedade da contribuição, não a existência do sistema em si, ofende a Constituição Federal atual. (...) A posição que vinha adotando é agora confortada pela decisão monocrática do Min. Gilmar Mendes no RE nº 395.263-SP, STF, 1-9- 2005, segundo o qual a Constituição Federal não recepcionou a LCE nº 452/74 na parte referente à contribuição compulsória para manutenção da assistência médica, por desacordo com o art. 149, § único da Constituição. Ainda, o Pleno do Supremo Tribunal Federal também já se manifestou sobre a inconstitucionalidade de instituição de contribuição para o custeio dos serviços de assistência médica pelos Estados-membros, conforme ementa a seguir reproduzida: EMENTA: CONTRIBUIÇÃO PARA O CUSTEIO DOS SERVIÇOS DE ASSISTÊNCIA MÉDICA, HOSPITALAR, ODONTOLÓGICA E FARMACEÚTICA. ART. 85 DA LEI COMPLEMENTAR Nº 62/2002, DO ESTADO DE MINAS GERAIS. NATUREZA TRIBUTÁRIA. COMPULSORIEDADE. DISTRIBUIÇÃO DE COMPETÊNCIAS TRIBUTÁRIAS. ROL TAXATIVO. INCOMPETÊNCIA DO ESTADO-MEMBRO. INCONSTITUCIONALIDADE. RECURSO EXTRAORDINÁRIO NÃO PROVIDO. I - E nítida a natureza tributária da contribuição instituída pelo art. 85 da Lei Complementar nº 64/2002, do Estado de Minas Gerais, haja vista a compulsoriedade de sua cobrança. II - O art. 149, caput, da Constituição atribui à União a competência exclusiva para a instituição de contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais e econômicas. Essa regra contempla duas exceções, contidas no arts. 149, § 1º, e 149-A da Constituição. À exceção desses dois casos, aos Estados-membros não foi atribuída competência para a instituição de contribuição, seja qual for a sua finalidade. III - A competência, privativa ou concorrente, para legislar sobre determinada matéria não implica automaticamente a competência para a instituição de tributos. Os entes federativos somente podem instituir os impostos e as contribuições que lhes foram expressamente outorgados pela Constituição. IV - Os Estados-membros podem instituir apenas contribuição que tenha por finalidade o custeio do regime de previdência de seus servidores. A expressão “regime previdenciário” não abrange a prestação de serviços médicos, hospitalares, odontológicos e farmacêuticos. (RE 573540, Relator (a): Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 14/04/2010, DJe-105 DIVULG 10-06-2010 PUBLIC 11-06-2010 EMENT VOL-02405-04 PP-00866 RTJ VOL-00217- PP-00568 RT v. 99, n. 900, 2010, p. 175-184).”. Ante o exposto, ratifico a antecipação da tutela concedida e JULGO PROCEDENTE o pedido, determinando que a requerida cesse o desconto de 2%, previsto no artigo 31 da Lei 452/74, com relação aos autores e condenando-a a devolver os valores descontados desde a citação, com correção monetária e juros de mora, nos termos do artigo F da Lei 9.494/97. Sucumbente, condeno, ainda, a vencida nas custas e honorários advocatícios que fixo em R$ 1.000,00. Nos termos do artigo 475, § 3º, do CPC, como a sentença está fundada em jurisprudência do plenário do Supremo Tribunal Federal, não cabe o reexame necessário previsto no inciso I do referido artigo. P. R. e I. - ADV: WASHINGTON LUIZ JANIS JUNIOR (OAB 228263/SP), MARIA ELIDA SMANIOTO (OAB 100428/SP)

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