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4 de Maio de 2024

Afinal, o processo tributário é individualista ou socialista?

As demandas constitucionais ao processo tributário.

Publicado por Paulo Victor Pantoja
há 7 anos

O escopo do Direito Tributário, ramo de direito público, é justamente regular, por meio de suas leis e princípios, a arrecadação feita pelo Estado dos tributos do particular. Nesta seara, percebe-se que o Direito Tributário nasce como um mecanismo de contrapeso formulado pelo próprio Estado para se conter em sua necessidade de arrecadar e gerar receita aos cofres públicos em detrimento da mitigação exagerada do patrimônio do cidadão.

É neste âmbito que se perfaz a nítida interação entre Direito Tributário e Estado Democrático de Direito. Em outros termos, pode-se dizer que o Direito Tributário, enquanto um conjunto tecnicamente composto de leis e princípios, está imerso como um dos elementos que compõem o Estado Democrático de Direito, considerando-se que este, conceitualmente, pode ser definido como um Estado regido por leis -incluindo-se, por óbvio, as leis tributárias- democraticamente formuladas.

Em todo Estado de Direito, é indispensável a eleição de direitos tidos pelo respectivo ordenamento jurídico como fundamentais. Assim, todo lógica jurídica imanente a este ordenamento, perpassa pela consideração tácita de reverência a estes direitos. Em se tratando de matéria tributária brasileira, é evidente no espírito das leis e princípios a reverência aos direitos constitucionais e fundamentais consagrados pelo nosso ordenamento, quais sejam, o direito à propriedade e à dignidade da pessoa humana.

No entanto, ainda na perspectiva do ordenamento jurídico brasileiro, é de se notar que há um emergente Estado de Bem Estar Social. Nesta órbita, por conseguinte, tem-se a eleição de outros direitos fundamentais a serem preservados pelo Estado, e não somente isso, a serem promovidos por ele. Ademais, verifica-se, na Constituição da República, um claro espírito dirigente às políticas públicas a serem executadas pelo ente estatal.

Não é de se espantar que o sistema tributário brasileiro, hodiernamente, esteja um caos. É claro o confronto desenhado entre duas classes de direitos fundamentais originadas em momentos históricos distintos temporalmente e ideologicamente. A hipertrofia do Estado brasileiro propositalmente projetada para tornar exequíveis os anseios da Constituição, torna a vontade de gerar receitas ainda mais forte por parte do Estado; de modo a revertê-la eficientemente na prestação de serviços públicos à população.

Deste modo, nos meandros do princípios tributários que primam pela limitação ao poder do Estado de onerar o particular por meio de tributos, os supraprincípios constitucionais estimulam a máquina estatal a encontrar fontes de receitas por variadas formas, além das atividades de monopólio, atividades público-privadas dos entes públicos e de empréstimos; há a mais utilizada, a arrecadação de tributos.

A escolha entre a mitigação de direitos primariamente individualistas ou a mitigação de direitos de natureza coletivista é a sinuca-de-bico que cerca governo e estudiosos. Naturalmente, o Brasil, sendo um pretenso welfare state, segue pelo caminho que lhe é mais lógico, isto é, onerar mais o particular por meio de tributos em contrapartida de lhe prestar serviços públicos de qualidade. No entanto, a execução se torna falha à medida que os serviços prestados pelo Estado são precários, obrigando o cidadão a destituir-se ainda mais de seu patrimônio optando por serviços privados, inaugurando um poder paralelo ao estatal.

Neste sentido é que urge o necessário discernimento quanto às demandas constitucionais ao processo tributário. Se se entender pela proteção aos direitos eminentemente individualistas, é perspicaz que se faça uma desconstrução do Estado de Bem Estar Social e opte-se por políticas de um genuíno Estado Liberal em que as demandas por serviços públicos são mínimas e, consequentemente, o processo tributário é menos intervencionista, optando-se, por conseguinte, a uma natural mitigação dos direitos sociais e por um estado mínimo. Se, por outro lado, optar-se pela hipertrofia do Estado cuja finalidade é a prestação de serviços públicos de qualidade altamente demandantes de receita, é mais legítimo que se enverede pelo caminho da exaltação dos direitos sociais em detrimento da mitigação dos direitos individualistas, isto é, sob a perspectiva de uma tributação mais incisiva.

Por fim, é importante notar que, a nosso ver, os direitos sociais realizam-se independentemente da prestação estatal, isto é, na perspectiva de um Estado Liberal, os cidadãos, menos onerados pelos tributos, têm a capacidade aquisitiva de encontrar meios de verem seus direitos sociais realizados. Àqueles que falta tal capacidade, espera-se, a minoria, o Estado pode e deve operar como um Estado assistencialista, assistindo-os em suas necessidades com os tributos recolhidos. Noutra via, em matéria de direitos individuais, é indispensável a proteção estatal de modo que a sua tutela precária não alternativa o particular a encontrar outras opções de proteção, haja vista o seu caráter último de monopólio da violência legítima.

  • Sobre o autorPaulo Victor Vieira, acadêmico e pesquisador
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2 Comentários

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Estou querendo escrever algumas linhas sobre a teoria do fato gerador. Acredito que não se deve tributar toda e qualquer transação financeira. continuar lendo

Muito bom, Elisangela!
O Direito Tributário merece ser mais debatido! continuar lendo