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2 de Maio de 2024

Existe um novo paradigma processual eletrônico no novo CPC?

Extrato da palestra ministrada no 1º Colóquio de Direito Processual Civil realizado na UNIJORGE - BA em 26/08/2015 pelos formandos de 2015.1

Publicado por Renato Dantas
há 9 anos

Olá jusbrasileiros!

Hoje vou compartilhar mais que um byte, mas o extrato da palestra que tive a honra de realizar para o evento organizado pelos formandos em direito da unijorge - ba (2015.1).

Antes de mais nada, quero cumprimentar a turma de formandos da unijorge 2015.1 e o coordenador aqui presente, prof. Frederico pinho pela iniciativa e suma importância da matéria, pois como vocês bem sabem, existe processo civil e as outras; pela seleção dos palestrantes, os quais aqui presentes, saúdo, meus colegas prof. Francisco bertino, prof. Rodrigo salazar e prof. Vitor zimer.

Bem, feito esse breve introito, confesso que fui honradamente convidado para palestrar, mas, depois dos colegas, me digno apenas a compartilhar uma inquietação minha com vocês: estamos na iminência de uma nova codificação processual, mas será que com ela existirá um novo paradigma processual? Será criado agora um paradigma processual eletrônico? Vou além, será preciso que tenhamos agora uma teoria geral do processo eletrônico, munida de novos princípios, de novos fundamentos...

Só que para vocês me acompanharem nessas indagações, convido-os a cozinhar. É, isso mesmo, vamos cozinhar. E para cozinhar, precisamos de uma panela, salvo na preparação de um tamal ou tamale, comida da mesoamerica, costa rica, cuba, que devemos cozinhar em folha de bananeira. Daí, quando vamos procurar a panela encontramos panelas de barro, metal, cobre, vidro. Qual você escolhe? Posso adivinhar? Aquela que você via sua mãe, sua avó fazer. Por que? Simples, segurança. “se minha mãe fazia assim, e dava certo... Vou fazer também e vai dar certo”.

Consequentemente, por causa desse pensamento, pararam de vender panelas de vidro. Ah! Mas também têm outros detalhes, o tempo de cozimento do alimento em meio a vidro ou barro é diferente de metal... Se você faz um arroz em 10 minutos em metal... Quando tentou e se tentou fazer em vidro, queimou... Se queimou. “ah! Isso dá muito trabalho”. Além disso, existem ainda outros atributos, o vidro quebra, o barro é pesado.

E é aqui, nesta cozinha, chamada de jurisdição, que estamos tentando, ou melhor, que vamos, trocar simultaneamente o fogão (cpc) e as panelas (o processo).

E para começarmos a utilizar essa panela e o fogão novo, imprescindível a fala do prof. Mario sergio cortella em uma de suas brilhantes explicações: a de que existem diferenças entre ancoras e raízes. Onde raízes são boas, vão buscar lá no fundo um alimento para o alto, ou seja, não podemos nos esquecer dos clássicos, os nossos sustentáculos. Porém, ancoras, são produzidas para segurar, dificultar um movimento e trancam o desenvolvimento. Estas, pelo contrário, devem ser imediatamente elevadas porque vivemos novos tempos, novas atitudes.

Meus amigos, se a vida não é mais a mesma, se os conflitos não são mais os mesmos, como fazer igual? Como cozinhar na mesma panela ou no mesmo fogão? Como é que, lá fora, os estudantes, os novos advogados, geração z ou y, já na era do 4g, não vou dizer nem da internet, porque a internet em casa, já foi ultrapassada pelo número de pessoas que possuem internet nos smartphones, de acordo a ultima pesquisa da revista infoexame, e o judiciário ainda vai ficar limitado e vinculado a um prejuízo ambiental e quando falo ambiental, pense em árvore na produção do papel e no estoque dos autos, no peso, no arquivamento, no número de pessoas para movimentar, na saúde, na insalubridade...

Só que, não nascemos prontos. Existe uma história do advogado, historiador, antropólogo e jornalista câmara cascudo, que um dia, seu orientando que estava na casa de cascudo, foi a cozinha beber agua e comentou com a cozinheira que já trabalhava com ele há mais de 40 anos: “taí um homem inteligente, você não acha?”. Ela imediatamente respondeu, “eu não, ele estuda todo dia”.

E é isso que está acontecendo. Toda essa mudança está desabrochando a todos a humildade. Por que, ninguém pode dizer já sei. Não temos mais a segurança do ontem. Jovens, idosos, somos todos iguais. Temos que estudar tudo, nos alimentar com experiências do passado sim, pois são nossas raízes, mas erguer a cabeça, pois mudou a panela e o fogão, mudou a forma e as normas para se buscar uma pretensão e assim chegar a resolução do conflito.

E é isso que estamos aqui, fazendo testes, colocando nosso percentual cerebral para pensar, porque, como afirmamillôr fernandes, se você não tem dúvidas, é porque você está mal informado.

Mas, não vamos nos perder, então qual é a grande dúvida? Lembrem-se que no início falei das minhas inquietações, mas por trás de tudo isso existe uma grande dúvida, qual seja: será que vai dar certo? Será que a comida produzida dessa junção (nova norma e novos autos), será que vai ser boa? A minha resposta é: vamos ter que cozinhar, de qualquer maneira, não tem volta, aquele fogão e aquela panela, já serve mais. Não tem conserto. Vamos ter que fazer, errando e experimentando, simulando, porque o erro é a tentativa do acerto e quanto mais praticamos, mais fácil se torna. Ora, quem aqui não teve dificuldade para dirigir no inicio.

Só que nesta simulação de manejo dessa panela e desse fogão, a qual daremos inicio agora vou indicar que esse novo cozimento está sendo feito em nova condição normal de temperatura e pressão (cntp). Vejam só, o termo paradigma, tem origem no grego, e significa algo que mostro ao lado, ou seja, um modelo. No entanto o modelo que as cntp que se esta preparando esta nova comida, são outras. No entanto, o grande paradigma processual hoje, para mim, não é nem o processo, nem o CPC... É a informação, ou melhor, a velocidade, a facilidade, o tratamento e a origem da informação com que se tem acesso, que seja dentro ou fora dos autos.

Sem adjetivações se é bom ou ruim, acabou essa história de que “o que não está nos autos não está no mundo”, os autos já estão no mundo – estão na internet. Basta abrir uma nova aba no firefox que ao lado está o google, google maps, stret view, julgados do dia, jusbrasil, até mesmo, facebook.

Devemos abrir nossa mente, pois o novo paradigma não foi criado porque os autos são eletrônicos, porque mesmo se fossem em papel, o assessor do juiz, que é geração z, vai pegar ser smartphone com google e vai verificar aquilo que não está nos autos. E me diz, porque ele não pode usar... Claro que pode! E no novo cpc traduz isso, como contraditório efetivo em seu art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício.

Se você ler sem as negativas, encontrará o resultado que o juiz pode decidir com base em fundamento a respeito do qual tenha dado às partes oportunidade de se manifestar!

Logo a liberdade origem e o tratamento dado a informação, quer seja em autos eletrônicos ou não, cria um novo paradigma, um novo modelo, pois o juiz possui a liberdade de trazer aos autos aquilo que ele está disposto a usar para decidir, apenas dando as partes o respeito ao contraditório. Se já se falava em inspeção judicial indireta, aquela em que o juiz mandava o oficial, vamos ter agora a inspeção judicial eletrônica... Via google stret view ou vamos mandar o oficial levar o celular com 4g e transmitir ao vivo para o juiz... Big brother jurídico!

Por outro lado, a velocidade e a facilidade da informação também cria um novo modelo. Só que aqui, velocidade da informação não pode ser confundida com pressa. O novo cpc não tem pressa para resolver um conflito, vide incidente de resolução de demandas repetitivas (irdr), os negócios jurídicos processuais, o ingresso de amicus curiae em qualquer fase do processo, a nova forma de contar os prazos processuais.

Por falar em prazo, vamos aqui aprender a nova contagem... Nas raízes aprendemos que para contar prazo, tínhamos duas regras... 1ª exclui o dia do inicio e inclui o fim e a 2ª só começa em dia útil e só termina em dia útil... Com o novo cpc basta incluir mais uma 3ª só conta dia útil. Muito bem, taí exclui o dia do inicio e inclui o final, só começa e só conta dia útil.

Por conseguinte, os prazos, unidos ao processo eletrônico traduzem um exemplo de novo paradigma, pois a facilidade da informação contida nos autos, uma vez nos autos inserida, faz com que a parte possa se manifestar, recorrer sem nem sequer ter sido intimada. (art. 218 § 4o será considerado tempestivo o ato praticado antes do termo inicial do prazo.).

E mais, vai acabar o diário oficial ou diário da justiça eletronico. Não que me importe com o diário, mas me importo com o conteúdo histórico. Espero que o judiciário dê acesso aos futuros pesquisadores as sentenças e peças inseridas nos autos, posto que são fontes históricas reais para retratar a realidade atual no futuro. E sim, isso também justifica a facilidade de acesso a informação, pois não se consulta mais na internet o movimento dos processo, mas se consulta os próprios autos.

No entanto é necessário se preparar para mudança. No modo de pensar, de fazer e de agir. Para isso, existe uma história interessante. Taxista, de maneira geral, é uma pessoa que simpática, que normalmente quando você entra no táxi, ele começa a falar. Em um belo dia, uma mulher entrou em um taxi, sentou-se no banco de trás, e achou muito estranho que o motorista mal lhe deu bom dia. Então, muito suavemente, colocou sua mão no ombro do taxista e lhe perguntou “o sr. Está bem?” O motorista se assustou, imediatamente encostou o carro, saíu do veículo, colocou a mão no peito, parecia que tinha sofrido um ataque cardíaco. Após se recompor, explicou para moça. “desculpe, mas hoje é meu primeiro dia como taxista, até ontem era motorista de carro fúnebre”.

Dessa forma, apesar de reconhecer que todos devem se preparar para o uso dessa nova panela e esse novo fogão, afirmo, reafirmo e confirmo, a mudança do paradigma processual não vem da lei ou da forma eletrônica dos autos, mas sim das variáveis aplicadas a informação, porque vivemos em uma sociedade de informação que tramita velozmente, também tenho que reconhecer que existem pessoasque, com perdão da palavra, “estão viajando na maionese”.

Em nossos encontros aqui na faculdade na disciplina juscibernética discutia e afirmava para meus alunos que, muito embora os autos fossem eletrônicos, o raciocínio processual não mudava. Com o novo cpc, superado críticas pessoas que faço a essa ideia de mediação ser utilizada como forma de harmonia coerciva, o raciocínio processual não mudou, pois ainda contamos com exordial, (mediação), citação, resposta do réu, produção de prova, sentença.

Só que existem doutrinadores, que estão criando uma verdadeira “teoria processual eletrônica” eivada, inclusive, de novos princípios. Apesar de sutilezas pessoais com o ponto de vista do prof. Lênio streck, sua matéria no conjur intitulada, graças ao princípio da conexão, encomendarei um kit de (tecno) verdade, reflete muito do meu pensamento sobre a inexistência de uma nova teoria só porque o cpc é novo ou os autos são eletrônicos.

O livro “comentários a lei do processo eletrônico – 11419/2006 elenca o que chama de princípios específicos do processo eletrônico, são 7: principio da imaterialidade, princípio da conexão, este ainda subdividido em conexão reticular e conexão inquisitiva, princípio da intermidialidade; principio da hiper-realidade; principio da interação; principio da instantaneidade; e principio da desterritorialização.

Aí realmente vou concordar com prof. Lênio quando afirma que:

Princípios não nascem de um grau zero de sentido [...]. Os princípios possuem profundo enraizamento fenomenológico, porquanto têm a aptidão de atribuir à regra o alcance do seu real significado. Os princípios contém, em si, uma carga histórica, uma razão de ser e servir. É por meio dos princípios que se torna possível obter respostas mais adequadas, ligadas ao mundo da compreensão e não da mera argumentação-fundamentação.

Por essa explicação, que confesso a vocês que, como afirmou millôr fernandes, ainda possuo sérias dúvidas sobre se estes são princípios, bem como, se a cooperação sinalizada por muitos no novo cpc é ou não princípio. Mas o que sei é que realmente temos que ter cooperação no processo eletrônico, sabem por quê? Eu conto.

Em dezembro de 2013, o cnj instituiu, por meio da resolução n.º 185 o pje como sistema padrão de processo eletrônico e trouxe uma situação prática para que exista cooperação entre os operadores do direito. A questão da indisponibilidade no sistema! Sabemos que nos autos eletrônicos o protocolo pode ser feito até a 23:59hs do dia do vencimento do prazo, porem haverá prorrogação de prazo, os seja, só será considerado indisponível o sistema se for constatado pela auditoria do cnj que o sistema ficou fora do ar superior a 60 min ininterruptos ou não entre as 6 as 23, das zero as 6 não existe indisponibilidade, e se ocorrer entre as 23 as 23:59 hs, em qualquer minuto.

O problema é: como confirmar que é do sistema e não é da minha máquina? Resposta: cooperação – ligue para vários amigos. Passe um substabelecimento para ele e peça para que ele tente também. Melhor ter 3 peças de recurso nos autos protocoladas tempestivamente, do que perder o prazo. Isso para mim é cooperar e algo que já existe na internet há muitos anos, pois na verdade, o novo conceito de internet é cooperação.

E já chegando ao fim, por mais que seja um apaixonado por tecnologia, tenho e busco como raízes o prof. J. J. Calmon de passos, que com a sapiência que lhe era familiar, escreveu um de seus últimos textos no ano de seu ingresso na espiritualidade, denominado “considerações de um troglodita ao processo eletrônico”. Lá, calmon destacou que o mal do judiciário brasileiro não é o excesso de centralização do poder, excesso de injustiça social, excesso de burocratização, não é tampouco a existência um processo escrito, enxundioso, sem nenhuma oralidade, presidido por magistrados alçados à condição de divindades e vendido como remédio barato para cura de todas as injustiças sociais.

Na verdade, afirmou calmon, que o grande problema do acesso e da celeridade da justiça é de não termos ainda utilizado os miraculosos recursos da informática, pois é a informática que suprirá a banalização e mediocrização do ensino do direito, a arcaica forma de recrutamento de nossos profissionais para suas atividades privada ou públicas, uma supervalorização das carreiras jurídicas. O problema é tão somente a deficiência do número de computadores de que dispõe o judiciário e da quase nenhuma habilitação de profissionais do direito na ciência da informática.

Assim, me perdoem, não que o ncpc e os autos eletrônicos não contribuam para formação de uma nova filosofia processual, mas enquanto não existir um paradigma de justiça, ou seja, enquanto a cozinha não for reformada, um novo fogão e nova panela não vão funcionar.

Pois não existe celeridade sem que haja uma real redução de 56 milhões de processos pendentes apenas na justiça estadual. Segundo o relatório do cnj 2014, para que o judiciário brasileiro zerasse seu estoque era necessário não distribuir um único processo em 4 anos e ainda baixar por ano 23 milhões de processos.

Além disso, como cozinhar em panela nova se só existem 6 juízes para cada 100 mil habitantes. Vamos para uma realidade mais próxima. Pergunto: quando na capital soteropolitana, vão cumprir efetivamente a lei de organização do judiciário estadual (loj) que é de 2007 e instituírem as prometidas 24 (vinte e quatro) varas de família; 10 (dez) varas de sucessões, órfãos e interditos e acabarem com as 14 varas de família, sucessões, órfãos, interditos e ausentes. É isso mesmo, em salvador, 4ª maior capital do país, só existem 14 juízes que julgam família e sucessões.

Logo, espero que para os futuros formandos, justiça não signifique, nem seja uma panaceia extraída da união entre tecnologia e a novas tecnologias e parafraseando o pensador britânico bêda, desejam que nunca se tornem fracassados e para tanto, sempre ensinem o que sabe, pratiquem o que ensinam e sempre, sempre pergunte aquilo que ignora. Obrigado!

  • Sobre o autorAdvogado e Professor Universitário.
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