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18 de Maio de 2024
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    O dano moral por atraso e cancelamento de voo

    Publicado por Rogério Tadeu Romano
    há 2 anos

    O DANO MORAL POR ATRASO E CANCELAMENTO DE VOO

    Rogério Tadeu Romano

    Passageiros de mais de 500 voos da ITA, companhia aérea do Grupo Itapemirim, — programados entre o dia 17 e o dia 31 de dezembro — foram pegos de surpresa, após anúncio da empresa sobre a suspensão “temporária” das operações.

    A aérea deverá comunicar a todos os passageiros, individualmente, sobre cancelamentos de voos, reacomodações e também garantir o reembolso das passagens aéreas comercializadas.

    Fala-se ainda que, segundo o UOL, que “cerca de 100 passageiros da Itapemirim que estavam no Aeroporto de Guarulhos (SP) na noite de ontem, revoltados com a determinação da empresa de suspender por tempo indeterminado seus voos, tentaram impedir o embarque de clientes de outras companhias aéreas.”

    Certamente essa situação irá gerar a cobrança de danos morais para os consumidores prejudicados em face do cancelamento desses voos.

    O atraso ou cancelamento de voo não configura dano moral presumido (in re ipsa) e, por isso, a indenização somente será devida se comprovado algum fato extraordinário que tenha trazido abalo psicológico ao consumidor.

    A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou esse entendimento ao analisar o recurso de um passageiro que enfrentou atraso de pouco mais de quatro horas em um voo – sem apresentar, contudo, provas do dano moral alegado. Para o caso o STJ entendeu que não houve a configuração de dano moral em face do cancelamento do voo.

    A matéria foi objeto de discussão no REsp 1796716.

    Na matéria aplica-se o artigo 14 do CDC:

    Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

    § 1º O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:

    I - o modo de seu fornecimento;

    II - o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam;

    III - a época em que foi fornecido.

    § 2º O serviço não é considerado defeituoso pela adoção de novas técnicas.

    § 3º O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:

    I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;

    II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

    § 4º A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa.

    Como disse Rizzatto Nunes (Curso de Direito do Consumidor, 3ª edição, pág. 181) “o defeito é o vício acrescido de um problema extra, alguma coisa extrínseca ao produto ou serviço, que causa um dano maior que simplesmente o mau funcionamento, o não funcionamento, a quantidade errada, a perda do valor pago – já que o produto ou serviço não cumpriram o fim ao qual se destinavam. O defeito causa, além desse dano do vício, outro ou outros danos ao patrimônio jurídico material e/ou moral e/ou estético e/ou a imagem do consumidor.

    Consoante noticiado pelo site de notícias do STJ, em 23 de setembro de 2019, segundo a, ministra Nancy Andrighi, em tais casos é preciso verificar o tempo que a companhia aérea levou para solucionar o problema; se ela ofereceu alternativas para melhor atender os passageiros; se foram prestadas informações claras e precisas, a fim de amenizar os desconfortos inerentes à situação; se foi oferecido suporte material, como alimentação e hospedagem; e se o passageiro, devido ao atraso, perdeu compromisso inadiável no destino.

    A ministra Nancy Andrighi apontou julgados do STJ nos quais houve a comprovação do dano sofrido e, consequentemente, a procedência do pedido de indenização. Entretanto, ela destacou que, no caso analisado, não foram juntados elementos que demonstrassem os possíveis danos de ordem moral causados ao consumidor.

    "Na hipótese, não foi invocado nenhum fato extraordinário que tenha ofendido o âmago da personalidade do recorrente. Via de consequência, não há como se falar em abalo moral indenizável", concluiu.

    A ministra ressaltou que não se discute que a responsabilidade pelo atraso, nos termos do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, seja da companhia aérea, mas tal constatação não significa o reconhecimento automático do dano moral indenizável.

    Ela mencionou decisões do STJ de 2009 a 2014 nas quais o dano moral, na hipótese de atraso de voos, foi considerado in re ipsa. Entretanto, em 2018, ao julgar o REsp 1.584.465, a ministra promoveu nova interpretação sobre o tema, levando o processo ao julgamento colegiado da Terceira Turma.

    A relatora explicou que a alegação de dano moral presumido exige ponderações, "notadamente porque a construção de referida premissa induz à conclusão de que uma situação corriqueira na maioria – se não na totalidade – dos aeroportos brasileiros ensejaria, de plano, dano moral a ser compensado, independentemente da comprovação de qualquer abalo psicológico eventualmente suportado".

    Segundo a ministra, a caracterização do dano presumido não pode ser elastecida a ponto de afastar a necessidade de sua efetiva demonstração em qualquer situação, como se destacou naquele noticiário do STJ.

    Na matéria assim entende o STJ: “O dano moral decorrente de atraso de voo prescinde de prova, sendo que a responsabilidade de seu causador opera-se, in re ipsa, por força do simples fato da sua violação em virtude do desconforto, da aflição e dos transtornos suportados pelo passageiro” (REsp 299.532/SP, 4ª Turma, DJe 23/11/2009).

    No mesmo sentido, considerando que é presumido (in re ipsa) o dano moral decorrente de atraso de voo, citam-se: REsp 1.280.732/SP, 3ª Turma, DJe

    10/10/2014; AgRg no Ag 1.410.645/BA, 3ª Turma, DJe 07/11/2011; AgRg no Ag “O dano moral decorrente de atraso de voo prescinde de prova, sendo que a responsabilidade de seu causador opera-se, in re ipsa, por força do simples fato da sua violação em virtude do desconforto, da aflição e dos transtornos suportados pelo passageiro” (REsp 299.532/SP, 4ª Turma, DJe 23/11/2009).

    A matéria, no entanto, sofreu outro entendimento do STJ no julgamento do REsp 1.584.465/MG (3ª Turma, DJe 21/11/2018).

    Para Carlos Alberto Bittar, o dano existe no próprio fato violador, impondo a necessidade de resposta, que se efetiva, justamente, com a sua reparação. Não cabe ao lesado, pois, fazer demonstração de que sofreu, realmente, o dano moral alegado. A título exemplificativo, não precisa a mãe comprovar que sentiu a morte do filho; ou o agravado em sua honra demonstrar em Juízo que sentiu a lesão; ou o autor provar que ficou vexado com a não inserção de seu nome no uso pública da obra. Há, assim, fatos sabidamente hábeis a produzir danos de ordem moral, que à sensibilidade do juiz se evidenciam (Reparação civil por danos morais. 3 ed. rev., atual. e ampl. 2. tir. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1999, pp. 216-217).

    É nesse cenário que a jurisprudência do STJ, em casos específicos, concluiu pela possibilidade, em determinadas hipóteses, de compensação de danos morais independentemente da demonstração de dor, traduzindo-se, pois, em consequência in re ipsa , intrínseca à própria conduta que injustamente atinja a dignidade do ser humano. Contudo, a caracterização do dano moral in re ipsa não pode ser elastecida a ponto de afastar a necessidade de sua efetiva demonstração em qualquer situação. Isso porque ao assim proceder se estaria a percorrer o caminho diametralmente oposto ao sentido da despatrimonialização do direito civil, transformando em caráter meramente patrimonial os danos extrapatrimoniais e fomentando a já bastante conhecida “indústria do dano moral” (REsp 1.653.413⁄RJ, 3ª Turma , DJe 08⁄06⁄2018).

    Para o Min. Marco Aurélio Bellizze, relator do retrocitado recurso especial, o perigo reside em elastecer, de forma indiscriminada, a própria configuração do dano moral presumido, passando-se a exigir somente a mera comprovação da prática da conduta ilícita, e dispensando a demonstração de prejuízos concretos ou a comprovação do efetivo abalo moral.

    No julgamento daquele Resp 1.584.465/MG disse a ministra Nancy Andrighi:

    “Por oportuno, convém citar precedente desta 3ª Turma que julgou procedente o pleito de compensação de danos morais formulados por passageiro que vivenciou atraso de voo superior a 8 (oito) horas, por falha na prestação de serviço por parte da companhia aérea. Na oportunidade, o Min. Relator reconheceu, expressamente, que a reparação do dano extrapatrimonial sofrido deveu-se à ausência de assistência material e informacional ao consumidor lesado, que, inclusive, permaneceu a noite em claro no saguão do aeroporto (REsp 1.280.372⁄SP, 3ª Turma , DJe 10⁄10⁄2014).

    Já em outra situação, a 4ª Turma deste STJ negou provimento a recurso especial de passageiro que sofreu atraso em voo doméstico de aproximadamente 8 (oito) horas, sob o fundamento de que “ não ficou demonstrado qualquer prejuízo daí decorrente, sendo que a empresa não deixou os passageiros à própria sorte e ofereceu duas alternativas para o problema, quais sejam, a estadia em hotel custeado pela companhia aérea, com a ida em outro voo para a capital gaúcha no início da tarde do dia seguinte, ou a realização de parte do trajeto de ônibus até Florianópolis, de onde partiria um voo para Porto Alegre pela manhã. Não há, pois, nenhuma prova efetiva, como consignado pelo acórdão, de ofensa à dignidade da pessoa humana do autor ” (AgRg no REsp 1.269.246⁄RS, 4ª Turma , DJe 27⁄05⁄2014).

    Imperioso citar também julgado desta Corte que reconheceu a configuração de dano moral – inclusive, tido por gravíssimo – por atraso de voo de 9 (nove) horas, que impediu a chegada do passageiro a tempo de presenciar as últimas horas de vida de seu pai (AgRg no AgRg no REsp 689.257⁄PR, 4ª Turma , DJe 05⁄09⁄2012).

    Destarte, caminhando no sentido de entender que, na hipótese de atraso de voo, não há como se admitir a configuração do dano moral presumido ( in re ipsa ), devendo ser comprovada pelo passageiro a sua ocorrência, passa-se a analisar o caso concreto versado nos presentes autos.”

    Para a ministra Nancy Andrighi dizer que é presumido o dano moral nas hipóteses de atraso ou cancelamento de voo é dizer, inevitavelmente, que o passageiro, necessariamente, sofreu abalo que maculou a sua honra e dignidade pelo fato de a aeronave não ter partido na exata hora constante do bilhete – frisa-se, abalo este que não precisa sequer ser comprovado, porque decorreria do próprio atraso ou cancelamento na saída da aeronave em si.

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