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31 de Maio de 2024

Teoria Geral do Estado - A construção da sociabilidade

A sociedade escravista - Hierarquia

Publicado por Andre Candido Almeida
há 3 anos

As características da sociedade portuguesa extremamente apegada à aristocracia que utilizava o estado para promover a criação e a manutenção dos privilégios da fidalguia, desde a sua origem promovia o crescimento de uns e a exclusão de muitos. As chamadas "manchas de sangue" eram um critério antigo para excluir da partilha da riqueza setores da sociedade que se mantiveram excluídos por séculos, sejam eles judeus, mouros ou pretos. Tudo isto influenciou a construção do status quo sociedade escravista, seja ele social ou econômico. 350 anos de escravidão, aliado ao sistema de sesmarias determinaram quais seriam os vencedores por várias décadas e séculos. Enquanto aqui a massa outrora escravizada era substituída pelos imigrantes e largada a própria sorte, muito em virtude de uma suposta cientificidade quanto a predominância de uma determinada raça superior a outra, a concentração de poder, terras e riquezas solapou a fermentação de uma regular sociedade capitalista. A manutenção de uma estrutura arcaica sobre um emaranhado de privilégios entre o setor público e privado motivou ainda mais a exclusão social e a perpetuação de um sistema econômico primário exportador. As consequências foram muito perniciosas para o desenvolvimento do capital humano via educação, a concentração de renda e a manutenção de privilégios privados sustentados pelo estado gestor ineficiente.

Cabe salientar que os primeiros descobridores/conquistadores que aqui estiveram foram designados fora do círculo social da nobreza de sangue e cortesã, pois nos primórdios do descobrimento havia um desinteresse geral pelas terras brasilis. No entanto, a formação da nobreza principal da terra obedeceu estas características fundantes de modo que a descendência dos primeiros capitães donatários se arrogou no direito de perpetuar o seu dom de guerreiro descobridor/conquistador e o contra dom da coroa de atender os seus anseios e perspectivas quanto ao futuro através de uma economia de mercês.

Clamorosamente, um ambiente de negócios no qual prevaleceu valores não capitalistas de acumulação primitiva do excedente de produção. Este ambiente levou a neutralização de toda renda enviada pela colônia à metrópole. As características da sociedade lusitana do antigo regime contribuíram para este desfecho em que a colônia brasileira serviu de um modelo de colonização ineficiente que não propiciou a reprodução interna do modo de produção capitalista em ambos os lados do Atlântico.

A discussão historiográfica que busca estabelecer se o modelo de sociedade colonial portuguesa na América se fundou num sistema servil feudal ou senhorial buscou a identificação de uma característica jurídico e política que poderia advir da legislação romana, principalmente pelo fato de que as concessões de sesmarias eram realizadas pela prestação de serviços militares pela nobreza de sangue à coroa portuguesa em Portugal. Entretanto, a concessão de capitanias hereditárias no Brasil não obedeceu esta característica primordial. Porém, deve-se centrar nas características da formação histórica tanto em Portugal como na colônia para marcar o ritmo da evolução da sociedade escravista na América portuguesa.

A adoção de mecanismos antieconômicos contrários ao desenvolvimento de um mercado interno na metrópole, excluindo a participação de uma burguesia atuante para favorecer a aristocracia, se deveu a permanência do arcaísmo econômico como projeto que promoveu a manutenção e a reprodução de uma estrutura parasitária. A metrópole dependia da colônia, de modo que não se desenvolveu uma agricultura para abastecimento interno, muito menos um sistema fabril que possibilitasse a substituição de importações. Predominou os elementos como a hipertrofia do estado e a hegemonia do fidalgo-mercador e de sua contrapartida, o mercador fidalgo. Portanto, a acumulação primitiva do excedente de produção colonial foi neutralizado em favor da manutenção e produção do sistema aristocrático português.

Portanto, toda a estrutura de sociedade com as suas características prevalecentes da metrópole foi replicado na colônia brasileira, inviabilizando assim a formação econômica brasileira fundada nos princípios capitalistas que propiciariam o seu desenvolvimento interno.

Após a partida dos holandeses para as Antilhas em 1654, após 24 anos de dominação no nordeste brasileiro, Portugal tentou negociar a divisão do Brasil com a Holanda, temendo que os holandeses viessem a reivindicar o nordeste, porém sem sucesso. Posteriormente, Portugal firmou um acordo com a Holanda cedendo possessões do Império português no Brasil, na África e na Ásia, além de pagar uma indenização equivalente a mais ou menos 700 milhões de dólares em valores atuais, porém não foi paga integralmente. Entretanto, Portugal recebeu de volta dos holandeses Angola, que seria o principal entreposto de fornecimento de mão de obra escrava para o Brasil, principalmente para o Rio de Janeiro a partir do século XVIII. O pequeno reino de Portugal sabia que teria de negociar a manutenção do seu império colonial se alinhando a um país com poderio militar naval.

Os holandeses detinham um grande desenvolvimento sobre a produção do açúcar, dominando técnicas e produzindo manufaturas utilizadas na fabricação do açúcar, além de possuir o controle do sistema bancário e creditício da época. De modo que a realização da indústria açucareira seria desenvolvida na Antilhas, sem interferência do monopólio português no Brasil. Estes fatos mudariam a trajetória da economia açucareira do Brasil, pois introduziu a concorrência entre o açúcar brasileiro e o açúcar das Antilhas, fazendo com que houvesse a redução dos preços e a redução da margem de lucro da produção brasileira.

Com o crescente déficit da balança comercial devido à ausência de um sistema de manufaturas que pudesse substituir as importações inglesas, inclusive de alimentos, Portugal passou a depender financeiramente da Inglaterra. Diante do crescente déficit da balança comercial, a dívida com a Inglaterra aumentava de forma vertiginosa. Portugal somente encontrou solução após a descoberta de ouro nas Minas Gerais, de modo que Portugal apenas manteve uma aparência de riqueza, pois até os escravos nas Minas eram vestidos pelos ingleses, servindo apenas de entreposto da passagem da maior parte da extração do ouro que foi direcionado para Inglaterra, para amortizar a sua dívida. Ao Brasil, a extração do ouro rendeu apenas uma explosão demográfica com o aumento da população europeia e a diminuição da população de escravos de forma proporcional.

Diante de exposto, a sociedade escravista colonial foi assentada de forma hierarquizada, estamental que transformou homens brancos livres comuns em aspirantes a membros da corte portuguesa em que o principal objetivo foi extrair as forças da colônia (economia do bem comum) para satisfazer os seus interesses e privilégios. Características tais como paternalismo, compadrio, grau de parentesco, sistema de proteção dos apaniguados e agregados, inclusive escravos, moldou a formação da sociedade escravista principalmente no Rio de Janeiro no século XVIII. Cabe salientar que tais características que ressaltavam as qualidades sociais da nobreza da terra foram baseadas no sistema social português, de forma que as características da sociedade portuguesa contribuíram para a formação da sociedade escravista fluminense. Portanto, presente esteve um padrão de sociabilidade fundado num sistema de mando e obediência social (senhorial) fortemente hierarquizado em que prevalecia um sistema de graduação baseado na cor, além de sistemas de proteção baseados no compadrio e no paternalismo, além da piedade. Diante da ascensão dos mercadores/comerciantes no Rio de Janeiro, principalmente com o crescimento do tráfico negreiro entre o RJ e Angola, a nobreza da terra procurava estabelecer laços de poder e de riqueza pela via do casamento com os descendentes dos comerciantes/mercadores. Ademais, o forte traço paternalista desta sociedade tem uma forte conotação religiosa fundada na caridade e na piedade cristã católica. Tudo isto marcará profundamente a formação social da sociedade escravista, inclusive a formação incipiente de um grupo de homens e mulheres de cor livres com base na manumissão, principalmente pelo fato da Igreja aceitar nos seus quadros homens de cor livres, inclusive em suas confrarias, sob o argumento de que todos eram filhos de Deus e iguais.

Diante de tais pressupostos, a maior ou menor quantidade de manumissões no século XVIII obedeceu a aplicação de conceitos de mercado em que o maior número de manumissões estava relacionado com o aumento da oferta de cativos na colônia e a maior circulação de moeda/ouro que propiciava o acúmulo de moeda/ouro por parte dos escravos para comprar a sua liberdade. A maior oferta de escravo estava ligada ao maior preço do açúcar na Europa e a descoberta de ouro nas Gerais. Porém, a descoberta de ouro nas Gerais atraiu um grande contingente de portugueses para a colônia, interferindo de forma direta no padrão das manumissões que poderiam ser gratuitas em razão de grau de parentesco não declarado ou piedade, principalmente crianças, mulheres, as quais na maioria comprava a sua liberdade, e homens velhos que eram substituídos por escravos novos. Na maioria dos casos, após a alforria, os recém-libertos ficavam ligados aos seus antigos proprietários ressaltando o grau de dependência para conseguir alguma ascensão social. Ademais, algumas escravas conseguiam se relacionar com homens livres aumentado a rede de sociabilidade e uma possível inserção na sociedade escravista como livres, principalmente para seus filhos em muitos casos.

SCHWARTZ, Stuart B. “Uma sociedade escravista colonial”. In: Segredos Internos. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. p. 209-223.

SAMPAIO, Antônio Carlos Jucá de. “A produção da liberdade: padrões gerais das manumissões no Rio de Janeiro colonial, 1650-1750”; in: FLORENTINO, Manolo (org.). Tráfico, cativeiro e liberdade. Rio de Janeiro, séculos XVII-XIX. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003, p. 287-330.

Fragoso, João; Florentino, Manolo – O arcaísmo como projeto.

Formação econômica do Brasil - Furtado, Celso

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