Página 396 da Caderno Jurisdicional do Tribunal de Justiça do Diário de Justiça do Estado de Santa Catarina (DJSC) de 9 de Fevereiro de 2020

resta comprovado, ao menos sob minha óptica, que há chance de sobrevida ao feto. Ouvidos os médicos, afirmaram que o feto é portador de diversas malformações, que tais anomalias resultam em comprometimentos severos, que trazem risco, alto, de não prosseguimento da vida, inclusive intra-útero. E aqui, sob a óptica do juízo, está o nó górdio, já que, do que dos autos consta, há risco severo de não prosseguimento da vida do feto, o que significa dizer, por via contrária, que há, sim, chance de vida, mesmo que sob risco severo. Ao mencionarem, os médicos ouvidos, que não “há como prever”, que “não existe um exame que diga, este feto vai morrer”, acabam afirmando, a contrario sensu, que há chance de vida, repito, embora limitada pelas malformações, ao bebê gestado. Apenas em uma passagem o médico Vanio Favaro menciona que as malformações impedem chance de vida extrauterina do feto, contudo, pelo contexto do depoimento, percebe-se que não afirma isso de modo assertivo, já que, instantes após, afirma que não há como prever quanto tempo o feto sobreviverá. Novamente com a venia devida ao Ministério Público, não há como aplicar-se ao caso presente os precedente do E. STF quanto à anencefalia. Isto, porque a premissa básica do acórdão citado é a de que sem cérebro, não há vida após o parto. Não é este o caso dos autos. Embora tenha limitações motoras e cognitivas, é possível que o feto gestado tenha vida extrauterina, sendo, inclusive, segundo a versão dos médicos ouvidos, impossível dizer por quanto tempo pode viver. Não há permissão legal para interromper gravidez por ser o feto portador de problemas que o tornem portador de necessidades especiais, mesmo que severas. Aqui, ressalvo, não se faz juízo moral, mas legal, e sob o aspecto legal, não há tal permissivo diante do contexto jurídico-constitucional-legal atual. Colocado este quadro, torna-se descabido confrontar a dignidade da pessoa humana ligada à gestante com o direito à vida do feto. Limitações físicas, embora tragam preocupações naturais à família, não podem servir de fundamento à interrupção de gravidez potencialmente viável. A chance de vida extrauterina do feto há que prevalecer. A legislação pátria, tanto no viés constitucional (art. 5.º, caput CF/88) como infralegal (art. 2.º, Código Civil) protege a vida, estendendo a proteção ao nascituro desde a concepção. Não desconheço direção oposta já tomada pelo E. TJSC, em especial, no Habeas Corpus n. 000XXXX-37.2016.8.24.0000, de Blumenau, Relator: Des. Carlos Alberto Civinski, cujo teor trago: [...] A inviabilidade de vida extrauterina ou ínfima de sobrevida após o nascimento, atestada por minuciosos exames e laudos médicos, permite a interrupção da gravidez de feto portador da Síndrome de Edwards e anomalias correlatas, por força do princípio da analogia ao caso concreto apreciado pelo STF na ADPF 54/2004. O risco de vida à gestante amolda-se ao disposto no art. 128, I, do Código Penal, de forma que é permitido o aberto terapêutico ou necessário sem que a conduta possa ser considerada formalmente típica. Os futuros danos psicológicos à gestante e a toda a família na continuidade de uma gravidez infrutífera devem ser evitados quando forcertificada a inviabilidade de vida do feto fora do útero e riscos de vida para a mãe. A decisão supra, ao aplicar analogicamente o decidido pelo STF na ADPF 54 ao caso que foi apresentado, firmou a inviabilidade ou chance ínfima de sobrevida após o nascimento, como fundamentos da decisão. Neste ponto, diverge, novamente,d o quadro apresentado nos autos. O que há nestes autos é imprecisão. O relato médico, de ambos os prof issionais ouvidos, é sobre a imprevisibilidade da sobrevida, bem como do nível de comprometimento. Ao ser ouvido, o médico Dr. Vanio Favaro, inclusive, com total lealdade à ética médica, faz questão de ressaltar que “acha” que o feto não sobrevive, mas ressalta, “isso não é medicina”, mas sim, sua opinião. Portanto, não há nos autos prova plena da impossibilidade de vida extrauterina do feto, mesmo que eventualmente acometido da síndrome de edwards ou anomalias outras, motivo pelo qual seria temerária a interrupção forçada da gravidez. Sem adentrar no mérito, me utilizo das declarações médicas já analisadas pelo juízo de origem para afastar o periculum in mora, observando a idade gestacional da paciente e a celeridade desta corte. Assim, verificando que não há flagrante constrangimento ilegal ou nulidade e que inexistem elementos capazes de estabelecer risco da demora na prestação jurisdicional a fim de justificar a concessão de liminar, entendo que o deferimento da liminar requerida se confunde com o próprio mérito da impetração, devendo ser obstado neste momento, pois implicaria em antecipação da prestação jurisdicional de competência do Órgão Colegiado. Ante o exposto, indefiro a liminar. Dispenso as informações da Autoridade apontada como coatora, vez que os autos originários são digitais. Encaminhemse à Procuradoria-Geral de Justiça. Intimem-se.

7.Habeas Corpus (criminal) - 402XXXX-05.2019.8.24.0000 - São José

Impetrante : Carlos Eduardo Cunha

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