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Embargos de Declaração: Como se Motiva Uma Decisão Judicial?

Embargos de Declaração: Como se Motiva Uma Decisão Judicial?

1. Raízes Constitucionais

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Os embargos de declaração têm raízes constitucionais. 1 Prestam-se a garantir de forma plena o direito que tem o jurisdicionado a ver seus conflitos (lato sensu) apreciados pelo Poder Judiciário. As tendências contemporaneamente predominantes só permitem entender que este direito está realmente satisfeito sendo efetivamente garantida ao jurisdicionado a prestação jurisdicional feita por meio de decisões claras, completas, e coerentes interna corporis. 2 Nesse sentido, ensina Eduardo J. Couture que tudo o que se diz a respeito da sentença se diz a respeito da jurisdição. “El contenido y la función de la sentencia son el contenido y la función de la jurisdicción”, diz este autor. 3

Ensina José Roberto dos Santos Bedaque: “A Constituição procura estabelecer, pois, o processo justo, ou seja, o instrumento que a sociedade politicamente organizada entende necessário para assegurar adequada via de acesso à solução jurisdicional dos litígios (...). Foi o tempo em que o processo era concebido como fenômeno puramente técnico, caracterizado pelo formalismo estéril. Os institutos processuais são construídos sob a profunda determinante de valores éticos, exatamente aqueles que norteiam a própria Constituição. Cada país tem seu modelo processual-constitucional, idealizado em conformidade com as opções ideológicas dominantes. Exatamente por isso, o sistema processual deve ser elaborado a partir das regras constitucionais em que estão consubstanciados seus princípios fundamentais. Constitui método equivocado de interpretação das regras instrumentais considerá-las independentemente do modelo processual-constitucional e somente depois verificar a existência de compatibilidade”. 4

É imprescindível compreender-se o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional em conjunto com uma série de outros princípios que, engrenados, dão sentido à garantia do devido processo legal. 5

O princípio do devido processo legal já teve diversos sentidos ao longo da história. 6 Ligados a esse princípio maior, estão, como se disse, o da inafastabilidade do controle da jurisdição, do contraditório, da ampla defesa e da necessidade de motivação das decisões judiciais. 7

Como se verá oportunamente, a ideia da proibição das decisões surpresa, complementando a noção tradicional e mais restrita do princípio do contraditório 8 , foi encampada pelo CPC nos arts. 10 e 933.

O CPC dá ainda mais relevância à inserção do processo civil num ambiente fortemente “constitucionalizado”. Serão, oportunamente, analisados dispositivos interessantes destinados a disciplinar como deve ser a motivação da decisão judicial, sob pena de esta ser considerada como não motivada (Cap. 4, especialmente item 4.4.). De fato, uma das características marcantes do CPC é deixar evidente a subordinação do Código de Processo Civil, como lei ordinária que é, aos princípios constitucionais.

Marcos Afonso Borges 9 observa que a falibilidade humana tende a se tornar ainda mais intensa, no contexto da vida atribulada das sociedades contemporâneas, e da sobrecarga dos tribunais, o que faz com que os recursos, de modo geral, tornem-se ainda mais importantes, inclusive os embargos de declaração. Portanto, a indisposição que, muitas vezes, se percebe por parte do Judiciário, em relação aos embargos de declaração, tendendo os juízes a considerá-los como um “meio de procrastinar o feito”, é injustificável, em grande escala. 10 Os embargos de declaração têm potencialidade de ser uma contribuição das partes a que se dê real e plena aplicação ao princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional. 11 - 12 O que há, por vezes, são abusos.

A palavra abuso vem de abusus e significa o mau uso, o uso injustificado ou o excesso de uso. Desde a época dos romanos, falava-se em abuso de direito, o que aparece, por exemplo, na fórmula summum jus, summa injuria (do “excesso” do direito resulta a suprema injustiça). 13

A proibição do abuso, como princípio regulador do exercício do direito, realmente se cogitou, em primeiro lugar, na França, no âmbito do direito privado, como decorrência dos excessos do laissez faire, laissez passer, corroborados pelo abstencionismo do Estado. 14 Disseminou-se nos sistemas a adoção da boa-fé como parâmetro de valoração do modo de exercício do direito, penetrando, de forma evidente, elementos de ordem moral na esfera jurídica, apesar de haver, também, parte da doutrina, tendência dita “objetivista”, a considerar ser dispensável saber-se da intenção do autor do ato para poder-se qualificá-lo de abusivo. 15

Neste ambiente, foi construído o CPC, prestigiando princípios como os da boa-fé e da cooperação. 16

No âmbito do processo, a mais séria objeção que se faz quanto à construção de uma teoria do abuso é a necessidade de que o contraditório e a ampla defesa sejam exercidos em sua plenitude. Isto significa que, se a parte tem direito de se defender plenamente, nem sempre é fácil discernir onde está a linha divisória entre a defesa plena e o abuso. Talvez o discrimen seja a existência do dano, para outra parte e para o Estado.

Certamente, o abuso dos advogados 17 fez com que se tratasse expressamente na lei da possibilidade de os embargos de declaração terem intuito meramente protelatório. Haverá multa para o embargante, a ser revertida em favor do embargado, caso o recurso seja desprovido de fundamentação minimamente razoável (art. 1.026, § 2.º).

No caso de reiteração dos embargos de declaração manifestamente protelatórios, a recorribilidade fica condicionada ao pagamento da multa (art. 1.026, § 3.º).

Discute-se, é evidente, sobre a constitucionalidade da exigência do depósito como condição para a interposição de outro recurso. Voltaremos a esse ponto, mais adiante.

Compreende-se porque a preocupação do legislador tenha sido mais intensa no que diz respeito aos embargos de declaração protelatórios e não aos outros recursos. É que, embora se trate de um recurso de fundamentação vinculada, as possíveis razões que levam à interposição dos embargos de declaração – omissão, contradição, obscuridade e correção de erro material – podem significar, para o litigante malicioso, uma porta aberta para malabarismos verbais em que se pretende, por exemplo, demonstrar a existência de obscuridade, onde não há sequer suave e insignificante traço de falta de clareza. 18

A circunstância de ser voz corrente na doutrina que os embargos à luz do CPC/73, teriam efeito suspensivo, i.e., teriam o condão de obstar que a decisão objeto do recurso produzisse desde logo (desde que proferida) efeitos, certamente tendia a favorecer a ocorrência de abusos por parte dos litigantes. 19

O CPC, no art. 1.026, caput, põe fim a esta discussão.

Paulo Roberto de Gouvêa Medina sustenta que, de acordo com o sistema brasileiro, se pode, sim, falar em abuso do direito de recorrer. O recorrente, além de deixar de preencher um (ou mais) dos requisitos de admissibilidade …

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23 de Maio de 2024
Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/doutrina/secao/1-raizes-constitucionais-embargos-de-declaracao-como-se-motiva-uma-decisao-judicial/1188256911