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Direito Constitucional Brasileiro: Teoria da Constituição e Direitos Fundamentais

Direito Constitucional Brasileiro: Teoria da Constituição e Direitos Fundamentais

29. Justiça Constitucional, Sanção Penal e Sistema Prisional

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Helena Schiessl Cardoso

A aplicação de penas, para quem e por quê, contém uma lista infindável de questões morais profundas. Se há especialistas nesta área, são os filósofos. Eles também são frequentemente especialistas em dizer que os problemas são tão complexos que não podemos atuar sobre eles. Precisamos pensar. Essa pode não ser a pior alternativa, quando a outra é a distribuição da dor. 1

(Nils Christie)

1. Introdução

Após anos de autoritarismo e em meio a um processo conturbado de abertura política, é promulgada a Constituição da Republica Federativa do Brasil de 1988 que, apesar das controvérsias acerca da “Assembleia Nacional Constituinte”, 2 certamente representa um avanço significativo para o constitucionalismo brasileiro.

No âmbito do direito penal e processual penal, a nova Lei Fundamental assegurou diversos direitos e garantias fundamentais à construção de um Estado Democrático de Direito. Não obstante, é necessário investigar se – após mais de três décadas de sua inauguração – o paradigma constitucional é concretizado na prática.

Sob esse viés, o presente capítulo busca problematizar a “sanção penal” e o “sistema prisional” no interior de um modelo de justiça que possa ser qualificado como “constitucional”. Para tanto, iniciaremos com o delineamento daquilo que seria um sistema de justiça criminal democrático e em conformidade com a Constituição de 1988. Na sequência, procederemos à confrontação dos mandamentos constitucionais do nosso Estado Democrático de Direito e a realidade do sistema de justiça criminal brasileiro, com o intuito de averiguar o efetivo grau de comprometimento político de nossa nação com o projeto democrático.

2. Desenho constitucional de um sistema de justiça criminal democrático

A Constituição da Republica Federativa do Brasil de 1988 ( CR), no título referente aos direitos e às garantias fundamentais, impõe um desenho democrático do sistema de justiça criminal por força de inúmeros princípios constitucionais garantidores do cidadão em face do poder punitivo do Estado. 3

2.1. Os princípios da legalidade e da culpabilidade como pressupostos do crime e da sanção penal

Os princípios da legalidade e da culpabilidade representam inegavelmente os instrumentos constitucionais mais importantes de proteção individual no Estado Democrático de Direito, 4 pois são pressupostos para a existência de um “crime” e a possibilidade de aplicação e execução de uma “sanção penal”.

O princípio da legalidade, conhecido sob a fórmula nullum crimen, nulla poena sine lege, insculpido no art. 1.º do CP (CP) 5 e consagrado no art. 5.º, inciso XXXIX, da CR, 6 define o objeto de reprovação jurídico-penal e marca o primeiro limite ao poder estatal de punir, pois “não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal.” Desse modo, a criminalização primária e secundária 7 do cidadão está condicionada a uma lei penal que deve ser (i) prévia – sendo vedada a retroatividade da lei penal, com exceção da lei penal mais benéfica (lex praevia); (ii) escrita – não sendo possível a utilização do costume, a não ser para beneficiar o réu (lex scripta), (iii) estrita – ou seja, não se admite o uso da analogia em malefício do acusado (lex stricta), e, por fim, (iv) determinada – sendo inadmissível a formulação vaga ou duvidosa de um preceito penal (lex certa).

Definido em lei o objeto de reprovação jurídico-penal através do tipo de injusto, 8 o princípio da culpabilidade, sintetizado na fórmula nulla poena sina culpa e derivado da presunção de inocência (art. 5.º, inciso LVII, da CR), 9 sustenta que “não há pena sem culpabilidade”. A reprovação do sujeito que realizou uma ação típica e antijurídica requer então a constatação da presença simultânea dos requisitos da (i) imputabilidade, (ii) consciência (real ou possível) do tipo de injusto e (iii) exigibilidade de comportamento diverso. Significa que o sujeito deve possuir capacidade penal, saber que a sua conduta é contrária ao ordenamento jurídico e, por fim, ter o poder de não realizar o tipo de injusto. 10

2.2. A necessidade do processo penal constitucional em relação à pena

No Estado Democrático de Direito, no qual a autotutela é vedada e o monopólio da “justiça” é estatal, a comprovação da configuração do tipo de injusto culpável (“crime”) e a consequente aplicação de uma sanção penal (“pena”) necessitam da existência de um processo criminal, pois o “processo, como instituição estatal, é a única estrutura que se reconhece como legítima para a imposição da pena (...) porque o Direito Penal é despido de coerção direta e (...) não tem atuação nem realidade concreta fora do processo correspondente”. 11

Salienta-se que este processo penal, necessário à aplicação do direito material, deve ser igualmente democrático e se estruturar em conformidade com os mandamentos constitucionais. Nas palavras de Lopes Jr., o processo penal:

“Está legitimado enquanto instrumento a serviço do projeto constitucional. Trata-se de limitação do poder e da tutela do débil a ele submetido (réu, por evidente) cuja debilidade é estrutural (e estruturante do seu lugar). Essa debilidade sempre existirá e não tem absolutamente nenhuma relação com as condições econômicas ou sociopolíticas do imputado, senão que decorre do lugar em que ele é chamado a ocupar nas relações de poder estabelecidas no ritual judiciário (pois é ele o sujeito passivo, ou seja, aquele sobre quem recaem os diferentes constrangimentos e limitações impostos pelo poder estatal). Esta é a …

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jusbrasil.com.br
23 de Maio de 2024
Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/doutrina/secao/29-justica-constitucional-sancao-penal-e-sistema-prisional-secao-iv-direitos-fundamentais-e-direito-penal/1440746806