A violação do princípio da intimidade e privacidade
Por Isabella Menta Braga,
advogada (OAB-SP nº 216.198)
Atualmente é grande - e notável - o desenvolvimento de tecnologias que permitem a captura de imagens e vídeos de forma totalmente discreta e imperceptível. A incorporação desses instrumentos em nossa sociedade faz com que surjam situações típicas dos tempos modernos e novas para o nosso sistema jurídico, já que é crescente o uso e divulgação de imagens de forma indevida fato que, muitas vezes somada à velocidade atroz da internet, acabam por expor os envolvidos.
Recentemente foi divulgada - inclusive aqui no Espaço Vital - a notícia de que o Tribunal de Justiça de Minas Gerais condenou dois rapazes ao pagamento de indenização a título de danos morais no valor de R$ 50 mil a uma moça com quem praticaram relação sexual a três. O ato foi gravado e divulgado.
O fato ocorreu em outubro de 2004 e a vítima afirmou que o vídeo foi gravado sem o seu consentimento, sendo que, alguns meses depois, foi surpreendida com a notícia que o material estava sendo comercializado. Em contrapartida, os rapazes alegaram que o ato foi filmado com o conhecimento de todos os envolvidos e ainda informaram que "gravaram o ato sexual para provarem a outros dois amigos a existência do fato.
Em sua decisão, o tribunal mineiro destacou os seguintes pontos, que merecem transcrição: a existência do consentimento da moça para a gravação do vídeo é irrelevante para a melhor solução do litígio, pois o direito que teria sido violado não é o da liberdade sexual, mas o da intimidade e da privacidade da moça".
E julgado ponderou: "ela concordou em fazer o ménage à trois. (...) Logo, a mera gravação do ato sexual em vídeo não lhe causaria dano algum se a fita ficasse restrita ao âmbito de conhecimento das partes envolvidas".
Dito de outro modo, o entendimento daquele tribunal foi no sentido de que o fato dos rapazes terem gravado o ato sexual, ainda que sem o consentimento da moça, não geraria o dever de indenizar, uma vez que as imagens ficariam restritas às partes envolvidas que, ao participarem do ato, com ele concordaram.
Porém, e é nesse sentido a decisão, o dever de indenizar surge no momento em que foi dada divulgação ao vídeo, pois violado o direito de intimidade e privacidade da moça.
A questão que se pretende suscitar no presente texto - e que submeto à discussão - é a seguinte: será que a moça envolvida no vídeo não teria direito à indenização, mesmo sem a divulgação do vídeo, pelo simples fato de ter sido filmada sem seu conhecimento?
Apesar de respeitarmos o entendimento do tribunal mineiro - de que a mera gravação não caracterizaria dano algum - defendo a tese de que a ausência de conhecimento por parte da moça da filmagem, por si só, já geraria direito a indenização, visto que houve violação de direito personalíssimo, da liberdade sexual e da intimidade.
isabella.braga@bragabalaban.com.br
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