Aplicação de teoria de domínio do fato a Boulos é criticada por professores de Direito Penal
A teoria do domínio do fato tem uma histórica aplicação controversa no Brasil.Em 2012, o Supremo Tribunal Federal, sob a relatoria do ex ministro Joaquim Barbosa, aplicou-a para condenar políticos do PT, fato que gerou críticas do próprio criador da teoria, o alemão Claus Roxin. Nesta semana, foi a vez do Delegado de Polícia do 49º Distrito Policial de São Paulo aplicá-la o coordenador do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MTST), Guilherme Boulos, para acusá-lo de uma série de crimes.
A narrativa adota pela autoridade policial foi integralmente disponibilizada nas redes sociais. Segundo o delegado José Francisco Rodrigues Filho, “por possuir toda esta representatividade, poderia sim Guilherme, caso fosse realmente de seu interesse, senão impedido, ao menos minorado a reação dos manifestantes contra os agentes do Estado”.
Rodrigues Filho continua: “a este tipo de comportamento por parte de Guilherme adotado, modernamente a doutrina o tem inserido na chamada TEORIA DO DOMÍNIO DO FATO, segundo a qual o agente responde não por ter participado diretamente do comportamento delitivo, mas sim porque com sua conduta, emana ordens aos demais, ou até mesmo muito embora o pudesse fazer, não impede que o resultado criminoso se verificasse”.
Ou seja, para o delegado de polícia, a teoria do domínio do fato desenvolvida por Roxin consistiria na possibilidade de acusar Boulos por conta da sua “representatividade” junto a outras pessoas, sendo que ele responderia por supostos crimes praticados por elas.
Em entrevista ao Justificando, o Professor de Direito Penal da Universidade Federal Fluminense (UFF), João Paulo Martinelli, critica o entendimento do delegado sobre a teoria – “A teoria do domínio do fato de forma alguma amplia a culpabilidade de acusados. É uma teoria que faz a distinção entre autores e partícipes quando os acusados, comprovadamente, colaboram para a prática do crime. Nada mais que isso”.
Martinelli explica que a teoria é utilizada para diferenciar quem é autor e partícipe quando ambos estão diretamente envolvidos no ato criminoso – “A grande novidade em relação às teorias anteriores, especialmente a teoria objetivo-formal e teoria subjetiva, é a utilização simultânea de elementos de natureza objetiva e subjetiva. Autor é quem tem o domínio do fato, partícipe é o colaborador que não tem o domínio do fato”.
No caso concreto, Martinelli também repudiou a aplicação da teoria para quem é chamado para intermediar a situação – “Quem possui o domínio do fato é aquele que tem o poder de prosseguir na conduta típica ou interrompê-la. No caso concreto, a própria autoridade policial reconhece que não houve incitação ou qualquer conduta tipificada. Boulos estava ali porque foi chamado para negociar. A mera presença de uma figura com notoriedade e liderança não é capaz de atribuir a autoria de um crime”.
Nas redes sociais, o Professor de Direito Penal da Universidade de São Paulo, Maurício Stegemann Dieter também criticou a aplicação da teoria – “Se o que está escrito nesse documento público fosse escrito em uma prova de Direito Penal para “explicar o que é a teoria do domínio do fato”, a nota seria zero (0,0)”.
Quem tem olhos, algum intelecto e um pouquinho de disposição, pode aprender em menos de 8 minutos e diretamente, na própria fonte ou suas reproduções honestas, que a teoria do domínio do fato veio para restringir e diferenciar as hipóteses de autoria e participação, não para ampliá-las! – indignou-se 0 professor.
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