Arma de fogo não encontrada para exame não desclassifica sua potencialidade lesiva para a prática delituosa.
DECISÃO (Fonte:www.tj.mt.gov.br)
Aumento de pena não é descaracterizado por falta de apreensão de arma
A falta de apreensão da arma de fogo e, por conseqüência, a falta de exame pericial, não descaracteriza a causa de aumento de pena quando há elementos de provas capazes de comprovar o poderio lesivo. Com essa argumentação, a Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso negou recurso interposto por dois condenados à pena de cinco anos e sete meses e seis dias de reclusão, em regime inicial fechado, por roubo com arma de fogo, que pleitearam a desconsideração do aumento da pena pelo emprego da arma pela não apreensão da mesma.
Na apelação os acusados também requereram a atenuante da confissão espontânea, que não teria sido considerada pelo Juízo. Contudo, no entendimento do relator do recurso, desembargador Juvenal Pereira da Silva, apesar de estar presente a atenuante da confissão espontânea, sua aplicação é incabível por razões de política criminal, ante a vedação da Súmula 231 , do Superior Tribunal de Justiça. De acordo com essa súmula, a incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal.
Quanto ao aumento da pena, pela utilização da arma de fogo, o magistrado explicou que o fato de não ter sido encontrada, não desclassifica a potencialidade lesiva da arma para a prática delituosa. Ele acrescentou que as vítimas afirmaram a utilização da arma, fato que também foi confirmado por um dos condenados em depoimento prestado à autoridade judiciária. O voto do magistrado foi acompanhado pelo desembargador Rui Ramos Ribeiro (vogal) e pela juíza substituta de Segundo Grau Graciema Ribeiro de Caravellas (revisora).
O crime - De acordo com a acusação, os dois, em concurso de pessoa e mediante grave ameaça exercida com emprego de arma de fogo, subtraíram de uma empresa vários objetos, como 380 aparelhos de celular, diversos talões de cheque, chips e notebook. No momento do assalto, um dos assaltantes efetuou o disparo da arma dentro da empresa. Para fugir do local, eles utilizaram um veículo de propriedade da empresa da vítima. Os dois foram presos e confessaram o crime.
NOTAS DA REDAÇÃO
A notícia em comento relata o pedido de apelação ajuizado por condenados a prática de roubo, com a pretensão de que o TJ/MT reformasse a decisão no sentido de não incidir a causa de aumento de pena por emprego de arma.
Sendo assim, vale tecer breves considerações a respeito do crime de roubo, tipificado no artigo 157 , do Código Penal , que assim dispõe:
Art. 157 - Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência:
Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa.
Trata-se de crime complexo, pois advém da junção do furto com o constrangimento ilegal, protegendo assim dois bem jurídicos, quais sejam, o patrimônio e a liberdade individual. No estudo da sua topografia tem-se a seguinte disposição:
Artigo 157, caput : roubo próprio
Artigo 157, § 1º: roubo impróprio
Artigo 157, § 2º: majorantes
Artigo 157, § 3º: qualificadoras
A majorante em questão refere-se à prevista no inciso I do § 2º do artigo 157 que aumenta a pena de um terço até a metade se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma. Assim, se para o cometimento do crime de roubo o agente faz uso de arma poderá ter sua pena aumentada de até metade.
Majoritariamente entende-se que "arma" deve ser tomada no sentido impróprio, ou seja, arma para a finalidade posta no inciso Ido § 2º do artigo 157 do Código Penal é instrumento com ou sem finalidade bélica, servindo ao ataque e defesa, como uma faca de cozinha, por exemplo. Ressalte-se que não basta o seu porte ostensivo, mas é indispensável, para a configuração da causa de aumento de pena, que haja o uso efetivo da arma, isso em razão da redação do inciso que menciona "emprego de arma".
Outra questão interessante que pairava sobre a majorante sob análise era se o uso de arma de brinquedo fazia incidir a causa de aumento e, de acordo com as lições de Rogério Sanches, até 2001 aceitava-se a tese de que mesmo em se tratando de um brinquedo a vítima se sentia constrangida, pelo que havia aumento na pena. Neste sentido, dispunha a súmula 174 , do STJ:
No crime de roubo, intimidação feita com arma de brinquedo autoriza o aumenta da pena.
Ocorre que julgando o RESP 213.054-SP , na sessão de 24/10/2001, a Terceira Seção deliberou pelo cancelamento da Súmula 174 e, de acordo com a doutrina, isso se deve a duas razões: pela incidência do princípio da ofensividade e pela imputação objetiva.
De acordo com Luiz Flávio Gomes, "por força do princípio da ofensividade não se pode conceber a existência de qualquer crime sem ofensa ao bem jurídico ( nullum crimen sine iniuria )" - (GOMES, Luiz Flávio. Direito Penal, volume 1: introdução e princípios fundamentais. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. Sendo assim, uma arma de brinquedo não seria capaz de gerar risco proibido previsto pela norma.
A idéia da imputação objetiva, nos dizeres do Professor Robaldo, é de que "só há falar em conduta típica para o ordenamento penal quando ela ensejar um risco juridicamente proibido ou incrementar (aumentar) o risco tolerado e, assim mesmo, desde que, em face desse contexto, cause um resultado jurídico (lesão ou ameaça de lesão ao bem jurídico protegido, isto é, que se encontre no âmbito de proteção do tipo penal). Com efeito, a ação só será imputada objetivamente ao agente na medida em que seu comportamento for socialmente intolerável " (ROBALDO, José Carlos de Oliveira. Rápidas pinceladas sobre a relevância da imputação objetiva para o Direito Penal. Disponível em http://www.iuspedia.com.br 22 abril. 2008.). Contextualizando, uma arma de brinquedo não é capaz de gerar o risco proibido previsto pela norma.
No presente caso, pretendia-se afastar a incidência da majorante pela impossibilidade de se realizar perícia na arma que teria sido utilizada para a prática do roubo, pois a mesma não foi encontrada. Mas de acordo com entendimento do Tribunal de Justiça de Mato Grosso o fato de não ter sido encontrada, não desclassifica a potencialidade lesiva da arma para a prática delituosa, logo, incidente a majorante ao caso.
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