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8 de Maio de 2024
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    Decisão na Argentina reconhece caso de multiparentalidade

    A juíza Mariana Josefina Rey Galindo, da Argentina, reconheceu a existência de três progenitores legais, dois pais e uma mãe, no registro de uma menina de 9 anos. A criança mora de segunda a sexta-feira com o homem que a reconheceu como filha ao nascer, mas passa os fins de semana com o pai biológico. A comunicação com a mãe é constante, bem como com os outros filhos dela, mas sem coabitação.

    Meses antes, o pai biológico iniciou um processo legal para impugnar a paternidade socioafetiva. A menina chegou a ser convocada perante a juíza, mas pediu que a magistrada não a fizesse escolher com qual dos pais gostaria de ficar. Seu desejo, de continuar vivendo com ambos, foi acatado.

    Galindo determinou o registro do pai biológico na certidão de nascimento da menina, sem exclusão do nome do pai socioafetivo. Os dois, assim como a mãe, terão igual responsabilidade no cuidado e proteção da filha. A decisão amplia a interpretação da lei, já que o Código Civil e Comercial da Argentina, em seu artigo 558, expressa que “nenhuma pessoa pode ter mais de dois vínculos filiais, qualquer que seja a natureza da filiação”.

    Regra de parentesco engessada

    Presidente da Comissão de Notários e Registradores do Instituto Brasileiro de Direito de Família IBDFAM, a oficiala de registro civil Márcia Fidelis atenta que a multiparentalidade ocorre não só com a descoberta de vínculos biológicos, mas também com o desenvolvimento de uma relação socioafetiva com madrastas ou padrastos, por exemplo.

    “A notícia da multiparentalidade na Argentina trata da multiparentalidade pelo estabelecimento de dupla paternidade a uma garotinha que suplicou ao juízo que sua vida real não fosse prejudicada por uma regra de parentesco engessada na consanguinidade. Ela tem dois pais. E foi em respeito ao seu pedido que sua realidade foi mantida e reconhecida juridicamente pelo Estado argentino”, afirma Márcia.

    “Nota-se que a exclusão do seu vínculo de filiação com o pai registral, de natureza socioafetiva, para que constasse como seu pai apenas o consanguíneo, traria consequências muito negativas para a filha, ainda criança”, observa Márcia. “A realidade da menina é a da multiparentalidade, espelhada pela concomitância de duas paternidades, além da maternidade.”

    Brasil está um passo à frente na matéria

    No Brasil, a multiparentalidade é reconhecida na esfera judicial desde 2012. Em 2017, com o Provimento 63, do Conselho Nacional de Justiça – CNJ, baseado em entendimento do Supremo Tribunal Federal – STF, a inclusão no registro de nascimento de vínculos de filiação de natureza socioafetiva passou a dispensar a intervenção judicial e manifestação do Ministério Público.

    “A formalização de paternidade e maternidade dessa natureza passou a depender de ato declaratório, com a possibilidade de tramitar exclusivamente na esfera administrativa, diretamente nos serviços de registro civil e cartórios. Esse ato normativo foi alterado em agosto de 2019, mas manteve a possibilidade da dispensa da intervenção judicial”, explica Márcia Fidelis.

    “Dessa forma, o Brasil se mostra à frente na evolução do Direito das Famílias em relação à sua vizinha Argentina, apresentando um ordenamento jurídico mais desburocratizado para a formalização da filiação”, compara a oficiala.

    Multiparentalidade vai além do registro de nascimento

    Segundo ela, a matéria perpassa diversos fatores além do registro civil. “Partindo de uma abordagem focada na atual visão pluralista da natureza jurídica das origens de filiação, o que se entende por multiparentalidade vai muito além de se ter no registro de nascimento dois pais e/ou duas mães.”

    “O reconhecimento jurídico da existência de parentesco também em relações em que não está presente o vínculo biológico tira do contexto da filiação a exclusividade da dicotomia pai/mãe. Caminha-se muito rapidamente para a hegemonia de entendimentos no sentido de que reprodução humana não necessariamente implica em filiação. Quando ocorre esse desvínculo conceitual, a necessidade de se ter como paradigma de pai e mãe como sendo duas pessoas e de sexos opostos perde a razão de ser”, observa Márcia.

    Além disso, outros parâmetros serão analisados para que seja estabelecido o estado de filiação, a fim de assegurar o reconhecimento das relações de afeto entre os sujeitos. Possibilidade ainda desconhecida por boa parte dos brasileiros, o registro civil de três ou mais vínculos de maternidade/paternidade deve ser pleiteado pela população progressivamente, na opinião da oficiala.

    “O que hoje é chamado de multiparentalidade, muito possivelmente, poderá ser um lugar mais comum na sociedade do que é hoje. Isso porque as relações filiais de natureza afetiva vão muito além da existência de vínculo biológico e de conjugalidade. Hoje é chamado de ‘multi’ porque parentalidade ainda é, grosso modo, sinônimo de filiação biológica”, assinala.

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