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16 de Junho de 2024
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    DPU fala em favor dos direitos das mulheres em audiência pública no STF

    há 6 anos

    Brasília – O Supremo Tribunal Federal (STF) promoveu, nesta segunda-feira (6), a segunda rodada de debates da audiência pública convocada pela Corte para discutir a descriminalização do aborto até a 12ª semana de gestação. Os trabalhos tiveram início na sexta-feira (3).

    A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 442, em discussão na audiência, foi proposta pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) com a finalidade de questionar os artigos 124 e 126 do Código Penal, que criminalizam a prática do aborto.

    Falando em nome do Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH), a defensora pública federal Fabiana Galera Severo, que também atua como defensora regional de direitos humanos em São Paulo, defendeu a inconstitucionalidade da tipificação penal da interrupção voluntária da gravidez. Segundo a defensora, “a incriminação do aborto voluntário (...) é incompatível com os direitos fundamentais à vida e à saúde das mulheres, à dignidade humana, à liberdade sexual e reprodutiva, à privacidade, à igualdade, e aos princípios da não-discriminação e da proporcionalidade”.

    Severo também argumentou que as maiores vítimas são as mulheres de baixa renda, e que a ilegalidade ajuda a movimentar as máfias que controlam as clínicas clandestinas de aborto, bem como o tráfico ilícito de substâncias e medicamentos. “A incriminação do aborto promove, portanto, uma discriminação interseccional e estrutural de determinados grupos sociais, fundada em sexo, gênero, origem, classe social e com inevitável recorte racial, desencadeando danos à saúde das mulheres e até mesmo mortes, que são plenamente evitáveis com a descriminalização. (...) E do ponto de vista da efetividade, a criminalização não evita que abortos sejam realizados: ela apenas impede que abortos sejam prevenidos ou feitos de modo seguro. Isso porque a incriminação impede a implementação de políticas públicas de saúde para prevenir o aborto inseguro, com protocolos de acesso universal à saúde e à informação para o planejamento familiar adequado”, disse.

    Ainda segundo a defensora, o reconhecimento do direito constitucional à interrupção voluntária da gravidez é a única forma de garantir a realização do aborto seguro. “Não é o direito penal que vai prevenir uma gravidez ou promover o necessário debate sobre a sexualidade e o planejamento familiar adequado. Essa é uma questão que não se resolve com o processo penal, nem com a ameaça do encarceramento, mas sim com saúde pública e educação sexual”. Severo citou também decisões e precedentes de outros países no sentido da descriminalização.

    Representando a Defensoria Pública da União (DPU), a defensora pública federal e coordenadora do Grupo de Trabalho Mulheres, Charlene da Silva Borges, afirmou que a criminalização do aborto evidencia desigualdades de natureza racial, socioeconômica e de gênero da sociedade brasileira. Segundo Borges, que é negra, a temática “tem correlação direta com o status de invisibilidade conferido à mulher negra, historicamente relegada a condição de vulnerabilidade social, por conta de práticas hegemônicas colonialistas”.

    De acordo com a defensora, que embasou sua fala em diversas pesquisas sobre o tema, os efeitos práticos da criminalização do aborto atingem mais gravemente as mulheres negras, de baixa escolaridade e renda, que não têm acesso fácil e direto a serviços de planejamento familiar e nem a educação sexual. Dados da pesquisa “Mulheres negras e a mortalidade materna no Brasil”, do Instituto de Medicina Social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, apontam que a taxa de mortalidade materna em relação, especificamente, à gravidez que termina em aborto, é de 13,6 para mulheres negras, em contraste com 5,3 para brancas e 7,9 para pardas, o que evidencia, para Borges, o viés racial da questão. “Considerando os dados estatísticos relacionados ao perfil das mulheres que são atendidas por esse tipo de serviço, deflui-se a ocorrência de racismo institucionalizado nessa prática”, afirmou.

    A defensora destacou ainda que, ao longo da história, o direito penal foi construído por homens e para homens, que se utilizaram das leis para controle social da mulher. “Os mecanismos seletivos de definição da conduta delitiva prevista nos art. 124 e 126 do Código Penal Brasileiro envolvem uma questão clara de gênero, na medida em que objetivam o controle sobre o exercício da sexualidade feminina, bem como do papel social da maternidade, o que não encontra similar coercitividade em face do homem e da paternidade, não raro circunstantes ou motivadores indiretos da conduta”, afirmou.

    Para Borges, é necessário fazer uma reflexão sobre quem pratica o aborto clandestino inseguro no Brasil e quais os fatores que levam essas mulheres a submeterem-se a essas práticas arriscadas. “Elas escolheram? Como e em que contexto se deu essa escolha? É possível realizar essa escolha a partir da omissão do estado na implementação de políticas públicas de saúde reprodutiva?”, questionou a defensora. “A Constituição de 1988 indica um novo caminho a ser construído, de respeito à mulher enquanto sujeito autônomo de direitos. Tal caminho passa pelo dever estatal de fornecer os recursos para que tais direitos sejam exercidos: não só a promoção de políticas públicas que tratem de maneira séria e sob o prisma do princípio da laicidade temas como a educação sexual, mas também recursos administrativos ligados ao planejamento familiar”, completou.

    Charlene Borges terminou sua fala afirmando que a questão deve ser tratada como um problema da mulher, relativo a sua esfera de intimidade e privacidade e tema de saúde pública, a fim de evitar mortes em vão. “A vida importa. As vidas das mulheres importam. As vidas das mulheres negras importam!”, exortou. Por fim, a defensora propôs uma pergunta: “É proporcional a criminalização dessa conduta considerando toda a essência, considerando o aspecto ontológico dos preceitos fundamentais constantes da constituição em cotejo com as consequências práticas da criminalização?”.

    Posicionamentos opostos

    Ao longo dos dois dias de audiência, foram ouvidos representantes de instituições a favor e contra a descriminalização do aborto. Ainda não há previsão para que o STF julgue o caso.
    Confira a lista completa dos habilitados a falar.

    Confira a íntegra da audiência pública:
    Dia 03/08/2018
    Dia 06/08/2018


























    Leia também:
    DPU participa de audiência no STF que discute descriminalização do aborto

    KNM
    Assessoria de Comunicação Social
    Defensoria Pública da União

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    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/dpu-fala-em-favor-dos-direitos-das-mulheres-em-audiencia-publica-no-stf/608989528

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