Duas visões: dois dos maiores juristas do País, divergem quanto a gravação de conversa entre Lula e Dilma
Miguel Reale Jr. x Dalmo Dallari
Após a divulgação da gravação telefônica em que a presidente Dilma Rousseff diz ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva que está enviando a ele o termo de posse de seu novo cargo de ministro e que ele poderia usá-lo "em caso de necessidade", renomados juristas consultados pela BBC Brasil deram duas visões sobre os áudios e os impactos que podem ter sobre a crise política.
Para o juiz federal Sérgio Moro, que chefia as investigações da operação Lava Jato e que autorizou a divulgação dos grampos, as conversas sugerem que a nomeação de Lula como ministro-chefe da Casa Civil seria uma forma de obstrução da Justiça, concedendo-lhe foro privilegiado e evitando assim ser alvo da vara comandada por Moro.
Em nota, o Palácio do Planalto criticou a divulgação do áudio como uma "afronta aos direitos e garantias" da Presidência da República e disse que deve entrar na Justiça contra o juiz Sérgio Moro por violações da lei e da Constituição
No documento, o governo apresenta sua versão para o diálogo. "Uma vez que o novo ministro, Luiz Inácio Lula da Silva, não sabia ainda se compareceria à cerimônia de posse coletiva, a Presidenta da República encaminhou para sua assinatura o devido termo de posse. Este só seria utilizado caso confirmada a ausência do ministro".
Questionado pela BBC Brasil, o jurista Dalmo Dallari, professor emérito da USP e autor de pareceres de defesa da presidente Dilma Rousseff sobre o pedido de impeachment, não vê tentativas de obstrução da Justiça na conversa e diz que tanto o grampo telefônico quanto a divulgação das ligações constituem "ilegalidades cometidas pelo juiz federal Sérgio Moro".
Já Miguel Reale Jr., ex-ministro da Justiça no governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) e um dos autores do pedido de impeachment atualmente tramitando no Congresso, acredita que a retirada do sigilo das gravações é "totalmente legal" e que o teor das conversas mostra "claras intenções de obstruir a Justiça".
Veja os principais argumentos dos dois juristas:
Dalmo Dallari, professor emérito da USP
Para Dalmo Dallari, os grampos realizados e divulgados pelo juiz federal Sérgio Moro são ilegais.
"Em se tratando de uma comunicação da presidente da República, o juiz só poderia ter gravado com autorização do Supremo Tribunal Federal. E mesmo assim, jamais poderia tê-las divulgado. Cometeu dupla ilegalidade e deveria ser punido por isso", diz.
Dallari diz que, por ter foro privilegiado, a presidente não pode ter sua privacidade revelada desta forma.
"Ele poderia ter usado dentro dos autos do processo, mediante autorização do STF, mas nunca poderia ter divulgado", acrescenta.
Sobre a suposta tentativa de obstrução da Justiça, o jurista diz não ver base jurídica para a acusação.
"A Justiça poderá continuar investigando. Lula ganha foro privilegiado por tornar-se ministro, mas a investigação não fica impedida, e (quanto à) gravação, a meu ver, os comentários feitos na conversa não evidenciam de forma alguma tentativa de obstruir a Justiça", afirma.
A divulgação das gravações no fim da tarde desta quarta-feira levou a protestos em Brasília, Belo Horizonte, Curitiba, São Paulo e Rio de Janeiro, além de panelaços e buzinaços em diversas capitais, todos contrários à presidente, mas Dallari avalia que as manifestações não devem ter grande impacto sobre o cenário político.
"Não vejo risco maior de impeachment. Esses que estão se mobilizando e aparecendo na grande imprensa não têm uma liderança nacional, não apresentam projetos nem propostas. É puro espetáculo", diz, acrescentando que não vê base jurídica no pedido de impeachment atualmente tramitando no Congresso.
Para ele, há um clima de campanha eleitoral antecipada no país.
"Vejo uma antecipação da campanha pela sucessão da presidente Dilma. Não tem outro significado. São pessoas que não se conformaram com a primeira vitória do Lula e nem com a vitória da Dilma, e nunca se conformaram com a perda de privilégios", avalia.
Miguel Reale Jr., ex-ministro da Justiça no governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), Professor Titular de Direito Penal da Faculdade de Direito da USP
Para Miguel Reale Jr., um dos autores do pedido de impeachment que atualmente tramita no Congresso, não há ilegalidade nas gravações divulgadas pelo juiz Sérgio Moro.
"Quem impôs o sigilo pode muito bem retirar o sigilo. O juiz que decreta o sigilo de uma investigação pode decidir levantá-lo, sem problema ou ilegalidade alguma", afirma.
Questionado sobre o conteúdo das gravações divulgadas, o jurista classificou o diálogo entre Lula e Dilma como um "acinte à República".
"É uma afronta aos princípios republicanos, um ato de imoralidade administrativa e política, passível de impeachment devido à essa tentativa de interferir na Justiça, agora gravada e documentada", diz.
O jurista diz que as conversas demonstram tentativa de obstrução da Justiça.
"Não só fica claro que Lula e Dilma tentaram obstruir as investigações e o trabalho da Justiça, como fica demonstrado que as interferências anteriores, mencionadas por Delcídio do Amaral, eram verdadeiras", diz.
Reale Jr. Acredita que o termo de posse teria sido enviado a Lula para tentar evitar um eventual pedido de prisão pendente, solicitado pelo Ministério Público do Estado de São Paulo.
Sobre os protestos da noite de quarta-feira registrado em ao menos quatro capitais brasileiras, o jurista diz que devem acelerar o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff.
"Quem responde à crise da forma como Dilma respondeu, nomeando Lula ministro, mostra que não tem a menor sensibilidade. As pessoas vão voltar às ruas até que a presidente tire a cera dos ouvidos e ouça o que elas estão dizendo" , diz, acrescentando que, em sua avaliação, os grampos divulgados evidenciam que o país está nas mãos de uma "organização criminosa".
BBC
43 Comentários
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A Opinião do Dr. Miguel Reale Jr. é esta:"Os fins justificam os meios.", que discordo plenamente.
Na minha visão , a tese de que o Judiciário se sobrepôs ao Executivo e ao Legislativo não é real. A realidade é que um grupo de procuradores e juízes-bomba acuou as três instituições da ordem democrática usando a chantagem de se auto explodir, instalando, no ato, o estado natural da desordem e do caos.
Utilizando um sistema estalinista de espionagem pública e doméstica, sem exceção de pessoas, investigadas ou não, conseguiu a adesão de corpos profissionais, agora sem pudor de promover farsas nazistas de julgamentos prévios e sumários.
Sentenças proferidas antes de exame processual, degradação acusatória como substanciação das peças da promotoria, leviandades jornalísticas arroladas como provas irrefutáveis, fatos consumados com apelos à emoção popular, levaram associações profissionais e empresariais a aderir à ilegalidade, tentativa de salvar a face da impotência e medo de seus anéis.
Com técnicas de bombardeio durante vinte e quatro horas por dia, pânico psicológico e duplo discurso afirmando fazer o oposto do que efetivamente faz, o grupo de fanáticos já defende sem disfarce a doutrina tirânica de que os fins justificam os meios, subscrita pelos órgãos de comunicação, crônicos sócios das aventuras ditatoriais do País.
É verdadeira a tese de que parte considerável da sociedade brasileira e das autoridades de que depende a integridade democrática tem se mostrado conivente com medidas de DUVIDOSO fundamento jurídico, buscando apaziguar as bestas, tal como os primeiros ministros europeus diante do nazismo e fascismo ascendentes.
Mas, cada um pensa, e expressasse como bem entende. continuar lendo
Sua posição é equivocada. Pelo menos na direção em que apontam.
TODOS os fatos recentes mostram isso. continuar lendo
A condição do Professor Dalmo de Abreu Dallari como FERRENHO MILITANTE DO PT é nacionalmente conhecida, há décadas e isto evidencia a parcialidade do seu parecer político, nada jurídico. O referido professor trocou a mundo jurídico pelo político partidário, há muito tempo, daí o seu atual apego por opiniões rabulescas as quais desmerecem o seu passado de jurista. Lamentável! continuar lendo
O Homem, em alguma época de sua vida, deve posicionar-se de acordo com suas ideologias, e não, transforma-se em um oscilante ideológico--partidário-político, deve-se respeitar as opiniões colidentes, e mais ainda, pessoas como o Douto Mestre Dalmo de Abreu Dallari, que alicerçou as bases democráticas e constitucionais deste País, com suas obras, artigos e cátedra.
Lamentável é ler um ataque pessoal, e não ideológico, alguém que nasceu "ontem" faltar com tanto respeito, ao mestre de minhas arcadas, cunhando-o de RABULESCO. Ninguém pode ser molestado por suas opiniões, incluindo opiniões religiosas, desde que sua manifestação não perturbe a ordem pública estabelecida pela lei.
Cada um de nós tem o direito de viver, de ser livre, de ter sua casa, de ser respeitado como pessoa, de não ter medo, de não ser discriminado por causa de seu sexo, de sua cor, de sua idade, de seu trabalho, da cidade de onde veio, da situação financeira, ou de sua ideologia.
Artigos e obras do referido Douto:
* O município brasileiro. São Paulo: s.c.p., 1961.
* Da atualização do Estado. São Paulo: s.c.p., 1963.
* Elementos de teoria geral do Estado. 14ª ed. São Paulo: Saraiva, 1989.
* O renascer do direito: direito e vida social; aplicação do direito, direito e política. São Paulo: José Bushatsky, 1976.
* O pequeno exército paulista. São Paulo: Perspectiva, 1977.
* O futuro do Estado. São Paulo: Moderna, 1980.
* Que são direitos da pessoa. São Paulo: Brasiliense, 1981.
* Que é participação política. São Paulo: Brasiliense, 1981.
* Constituição e Constituinte. São Paulo: Saraiva, 1982.
* O direito da criança ao respeito. São Paulo: Summus, 1986.
* O Estado Federal. São Paulo: Ática, 1986.
* Direito ambiental. Revista Politécnica. São Paulo, n. 204-205, jan./jun. 1992. p. 23-24.
* A participação popular e suas conquistas. In: Cidadão constituinte: a saga das emendas populares. Coord. Carlos Michiles et al. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1989. p. 378-388.
* O Poder Judiciário e a filosofia jurídica na nova Constituição. In: Poder Judiciário e a nova Constituição. São Paulo: Lex, 1990. p. 9-23.
* Direitos Humanos e Cidadania (2004)
* O poder dos juízes, ed. Saraiva (2012)
"...apego por opiniões rabulescas as quais desmerecem o seu passado de jurista..."(SIC)
Uma piada! continuar lendo
O ataque se restringe à opinião acusando injustamente magistrado de notória idoneidade, visivelmente eivada de partidarismo político, não à pessoa do professor, isto ficou bem claro e, portanto, não distorça o objetivo do meu comentário. Quanto a ser autor de livros como parâmetro, lembro que Marx e Hitler também os publicaram e, nem por isso suas ideias podem ser chamadas de incontestáveis. continuar lendo
Se houvesse distorção objetiva, sua explicação; agora, repleta de adjetivos abalizados, insignes, notáveis, ínclitos, importantes, conspícuos, louváveis, etc.ao douto, seria desnecessária.
Recomendações. continuar lendo
Da mesma forma o outro jurista. Se avaliar desta forma continuar lendo
E a do Miguel Reale Júnior, ferrenho militante do PSDB e ministro da era FHC, é imparcial? E o juiz Moro, cujo pai é fundador do PSDB do Paraná, cuja esposa é acesso da jurídica do PSDB, é imparcial, também? continuar lendo
Concordo com a parcialidade de ambos. Mas essas informações de ligação partidária do Juiz Moro com o psdb são falsas. Boatos de internet. continuar lendo
Estamos falando do trabalho do Juiz Sergio Moro, não do pai deste, tampouco de determinado jurista, ou qualquer outra pessoa. Com o devido respeito, a ilustre comentarista está em certa confusão de raciocínio, não sei por que razão. continuar lendo
Por que será que toda vez que alguém nesse país quer fazer justiça e colocar na cadeia aqueles que a merecem, aparecem centenas de pessoas questionando os métodos aplicados?Já leram com bastante atenção essa malfadada constituição de 1988? Perceberam que em seus muitos artigos, está implicito que ela (a constituição), foi elaborada exatamente para defender e impedir que os ocupantes dos "três poderes" sejam punidos com severidade?Está ai o maior exemplo do que digo; semana passada finalmente foi trancafiado o condenado Luis Estevão, ex-senador e que juntamente com seus comparsas roubou quase 1 bilhão (em valores corrigidos) durante a construção do Forum de São Paulo.Seus advogados apresentaram nada menos que 34 recursos protelatórios e isso é o fim do mundo.Executivo,Legislativo e Judiciário,se parecem muito com as castas"existentes na India (o país), são protegidos por"foro privilegiado"e outras manobras e o povo...ora o povo que se exploda, não é mesmo?Deixemos de hipocrisia e tomara mesmo que o Juiz Sergio Moro consiga terminar a sua , a nossa"mãos limpas" , para o bem do povo brasileiro; afinal...lugar de ladrão é na cadeia não é mesmo? continuar lendo
Sr . Dimas por favor use seus neurônios, você os tem!!!!! Desde quando o fato de alguém ter um posicionamento político o faz ser tendencioso ou agir contra os princípios da legalidade???? Se, hipotéticamente, o Professor Dalmo Dallari frente a provas robustas e após o devido processo legal visse a culpabilidade de qualquer petista tenho certeza que cumpriria seu papel. Isto é legalidade, isto é respeitar o Estado de Direito. Minha avó que é viva com 102 anos sempre disse que quem pensa algo calunioso de outra pessoa é porque agiria assim .... Espero que tenha entendido... continuar lendo
Em verdade, muitos juristas ávidos de notoriedade tecem comentários acadêmicos sobre assunto cuja seriedade e gravidade parecem ignorar. Apegam-se a picuinhas processuais para tratar de assuntos de extrema relevância para a segurança da Nação como se estivessem lecionando abstratas teorias aos seus alunos, em situação de plena normalidade. Parecem não ter percebido ainda que o Brasil está à beira da concretização de um golpe esquerdista, em adiantado estado de execução, que ameaça arrastar este País ao mundo nefasto do comunismo onde privilegiam-se incompetentes fracassados às custas de gente esforçada que estuda, trabalha e produz, um regime que divide somente os bens alheios (quem pertence à cúpula governamental conserva e amplia o seu próprio patrimônio) e que desvaloriza princípios familiares e morais, degenerando o comportamento social. O Judiciário é a penúltima esperança do povo brasileiro e, se deste forem frustrados os anseios de justiça, liberdade, decência e dignidade, restará somente a última opção das armas, com inevitável derramamento de muito sangue. As instituições precisam continuar funcionando e, muito bem, para que possamos manter a paz social da qual todos necessitamos. Não há no mundo um único povo dominado pelo comunismo que não deseje desesperadamente sair dessa situação, para o que chegam a arriscar a própria vida - muitos acabam morrendo, tentando fugir para países onde realmente impera a democracia. continuar lendo
Interessante!
Miguel Reale ter sido ministro da Justiça no "governo" FHC não tem nada a ver com posição partidária, né? Só coincidência!!! Que coisa... continuar lendo
Me perdoem os doutos, mestres doutrinadores, detentores de sabido saber jurídico, mas, pergunto: Houve falsificação de algum teor de gravação? O que seria mais importante, o ato ou o relato? Vamos questionar o inquestionável? Relembro nosso pai da dialética Rui Barbosa com seu texto "A paixão pela verdade", uma ótima leitura para reflexão em momento tão dúbio. continuar lendo
Ótimo! continuar lendo
As pessoas ainda não entenderam qual é a essência do Direito praticado nesse país. Aqui decide-se de qualquer jeito, aos sabores do vento. Não há uma teoria da decisão. Streck fala isso há anos. Um fato sério desses deveria ser tratado de maneira igualmente séria. Mas não é o que vai ocorrer. Alguns ministros do STF vão sentar, conversar sobre o ocorrido - levando em conta que lula chamou todos de covardes - e dizer que a conduta do juiz curitibano foi legal. O argumento? Bom, isso eles vão criar. O Direito no Brasil é o consenso formado por quem tem o poder de decidir. Seja um consenso com base em lei ou não. continuar lendo