Livre manifestação do pensamento de Magistrados e Membros do Ministério Público.
Questão complexa que deve ser analisada com cautela de modo a não se criar duas espécies de cidadãos
A cidadania é atributo de todos os brasileiros. E o mesmo pode ser dito da liberdade de expressão e da manifestação do pensamento.
O fato de alguém eventualmente usar uma toga ou uma beca e integrar a Magistratura ou o Ministério Público não faz desta pessoa um cidadão de segunda classe, detentor de menos direitos do que a pessoa comum, que não ocupa determinado cargo público.
Não se pode calar o cidadão, impedindo-o de exercer um direito constitucional, pelo simples fato de integrar determinada carreira pública, seja ela qual for.
Limitar o membro da Magistratura e do Ministério Público de livremente se expressar atenta contra esses direitos fundamentais inerentes à própria personalidade de todo ser humano. Uns não podem ser mais cidadãos do que outros.
Não afronta a dignidade do exercício do cargo e nem constitui conduta incompatível com o exercício de suas funções, externar sua ideologia e preferência eleitoral, desde que não exerça atividade política partidária, esta sim vedada pela Constituição Federal.
Publicizar a preferência por um ou outro candidato, por ser de direita ou de esquerda, conservador ou progressista, ficha limpa ou suja, conduta ilibada ou deturpada, sem participar abertamente de campanha eleitoral, com o devido respeito aos que pensam diferente, não se trata de atividade política partidária, mas de mero exercício de um direito constitucional típico de todo país democrático, que é o de dizer o que pensa sobre algo ou alguém, sua preferência ou desprezo, ou outras condutas análogas, dentro dos limites da proporcionalidade.
O mesmo pode ser dito em relação a outros temas em que o cidadão comum, aquele que não ocupa nenhum cargo público, pode se manifestar livremente, observados os limites legais exigíveis a fim de não ferir indevidamente direitos de outrem.
Decerto devem ser observadas as regras processuais pertinentes à suspeição e impedimento, de modo a não ferir a imparcialidade, tanto de Magistrado quanto de Membro do Ministério Público. Assim, aquele que já manifestou seu entendimento sobre determinado tema ou sua preferência em relação a algo ou alguém, não detém a necessária imparcialidade para atuar em processo ou procedimento a respeito destas mesmas questões.
Calar o cidadão, pelo simples fato de ocupar cargo público, privando-o de direitos constitucionais ou reduzindo-lhes sensivelmente, não é conduta amparada pelo sistema constitucional vigente, que privilegia o princípio da isonomia, de modo que o exercício de uma função pública reduz alguns direitos indispensáveis para seu correto desempenho, mas não a ponto de praticamente suprimi-los, criando duas espécies de pessoas, uma com todos os direitos e outra sem alguns deles.
Autor: César Dario Mariano da Silva - Procurador de Justiça – MPSP. Mestre em Direito das Relações Sociais – PUC/SP. Especialista em Direito Penal – ESMP/SP. Professor e palestrante. Autor de diversas obras jurídicas, dentre elas: Comentários à Lei de Execução Penal, Manual de Direito Penal, Lei de Drogas Comentada, Estatuto do Desarmamento, Provas Ilícitas e Tutela Penal da Intimidade, publicadas pela Editora Juruá.
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