O novo CPC aplica-se supletivamente à Lei dos Juizados Especiais
Recentemente surgiu a polêmica sobre se o novo Código de Processo Civil (CPC) tem aplicabilidade supletiva à Lei 9.099/1995 (Lei dos Juizados Especiais) nos processos cíveis.
A ministra Nancy Andrighi, com toda a autoridade do cargo que ocupa, se não encabeça, aderiu à vertente dos que preconizam a inaplicabilidade do novo CPC aos processos perante o Juizado Especial Cível.
Segundo noticiado pela ConJur, a ministra entende que “as regras do Código de Processo Civil, tanto do anterior como do que entrou em vigor no último dia 18 de março, não se coadunam com o sistema dos juizados especiais”. Ainda conforme seu entendimento, “isso tem um motivo: dar aos juízes liberdade para, com base nos princípios da informalidade e simplicidade que regem essas instâncias, adotarem o procedimento mais adequado à resolução dos conflitos”.
Preocupante deparar com entendimento dessa natureza, ainda mais exarado por uma alta autoridade judiciária.
Isto porque a primeira coisa que salta aos olhos é o viés de defender uma liberdade aos juízes do Juizado Especial Cível que nenhum outro possui, qualquer que seja a instância: a liberdade e fazer o que bem quiser no processo sob sua superintendência.
Ora, tal concepção interpretativa não tem a menor possibilidade de medrar em nosso sistema jurídico porque é a Constituição Federal que estabelece que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.
O que exatamente quer dizer esse preceito constitucional? Será que alguém, inclusive uma autoridade constituída, consultando sua própria vontade discricionária, mundivisão ou entendimento sobre o que acha certo ou errado pode obrigar outra pessoa a fazer ou deixar de fazer alguma coisa?
Penso que não. Ou há lei que obrigue a pessoa a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, com base na qual o juiz ou qualquer outra autoridade constituída deve fundamentar a decisão a constranger alguém a fazer ou deixar de fazer algo, ou não se pode obrigar ninguém a fazer aquilo que se deseja que faça. Essa é a única interpretação possível, lógica, racional que não subestima a inteligência dos destinatários do preceito constitucional, concebido como uma garantia constitucional que deve ser evocada principalmente em face das autoridades constituídas como defesa do indivíduo em contraposição a alguma ordem para que faça ou deixe de fazer alguma coisa. Aliás, a definição de abuso de autoridade e de poder finca sua definição nessa garantia constitucional. Será sempre abusiva a ordem promanada de uma autoridade constituída para que alguém faça ou deixe de fazer alguma coisa sem que haja lei obrigando-a a tanto.
Portanto, a ideia de que os juízes do Juizado Especial Cível possam ter uma liberdade quase que absoluta para conduzir o processo perante eles da forma como quiserem, sem qualquer parâmetro legal em que possam abeberar as partes (o jurisdicionado) a fim de conhecerem previamente as regras do jogo, as condutas que devem observar, definitivamente não encontra guarida no nosso ordenamento jurídico. O processo seria kafkiano; as regras poderiam não ser mais objetivas e o que vale para uma das partes, não valeria para a outra, ou, em processos congêneres perante juízes diferentes, o que vale para uns jurisdicionados não valeria para outros, o que é, para dizer o mínimo, inaceitável porque fere de morte além da garantia constitucional prevista no inciso II do artigo 5º da Constituição Federal, as garantias prometidas nos incisos LIV e LV do mesmo artigo 5º, consistentes das cláusulas do devido processo legal e da ampla defesa.
Sobe o devido processo legal é suficiente dizer que não basta ser devido, é preciso ser legal, o que significa que é necessário que siga as normas que o disciplinam, as quais devem ser portadoras de certeza e segurança jurídica, isto é, de previsibilidade sobre como o processo irá desenvolver-se ao longo de sua marcha no tempo e que atos podem, como e quando, ser praticados.
O fato de o artigo 2º da Lei 9.099/1995 estabelecer diretivas principiológicas orientadoras do processo perante o Juizado Especial Cível que privilegiam os "critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celerida...
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