O primeiro retrocesso social
Por Mateus Pereira dos Santos, advogado (OAB/RS nº 53.607).
A Medida Provisória nº 664 de 30 de dezembro de 2014 - que altera algumas regras do Regime Geral de Previdência - de questionável constitucionalidade, em virtude da inexistência de urgência real tanto é que alguns dispositivos somente vão viger a partir de março de 2015 -, representa um verdadeiro retrocesso social e uma afronta ao princípio da igualdade, especificamente no benefício de pensão por morte devido aos dependentes do segurado vinculado ao regime geral de previdência.
A Lei nº. 8.213 de 24 de julho de 1991, que instituiu os planos de benefícios da previdência social, conforme determina o art. 201 da Constituição Federal, no tocante à pensão por morte, inicialmente previa o pagamento da cota familiar em valor equivalente a 80% da aposentadoria que o segurado recebia ou viesse a receber, mais 10% da mesma aposentadoria por dependente limitado a dois.
Somente com a Lei nº. 9.032 de 28 de abril de 1995 foi que o benefício passou a ser pago em valor correspondente a 100% do salário-do-benefício.
Um avanço conquistado há menos de 20 anos, que acabou com o regime antigo, previsto inicialmente na Lei nº. 3.807 de 26 de agosto de 1960, o qual previa uma cota familiar de 50% (valor mínimo) da aposentadoria que o segurado recebia ou teria direito de receber, mais 10% por dependente, limitado a cinco.
A Medida Provisória nº. 664, publicada um dia depois de o governo anunciar um déficit de R$ 18,3 bilhões, propõe, para o fim de se economizar os recursos públicos e se alcançar o superávit, dentre outras medidas, a redução do valor do benefício de pensão por morte para os patamares que eram utilizados na década de 60!
Entretanto, ao legislador, no caso a Presidente da República, não lhe é permitido legislar num verdadeiro retrocesso social, situação já reconhecida pelo STF, como no julgamento no ARE/MG nº 745.745, Rel. Min. Celso de Mello, DJU 02-12-2014.
De outro lado, a novel medida provisória ofende ao princípio da igualdade, porque cria um grupo de dependentes previdenciários privilegiados, porque os benefícios concedidos entre 28 de abril de 1995 e 30 de dezembro de 2014, serão pagos em parcela equivalente a 100% do valor que o segurado recebia ou teria direito de receber, se aposentado fosse, de maneira vitalícia para o cônjuge/companheiro, enquanto, para os novos dependentes, o valor será pago em cotas, por um determinado tempo, conforme a expectativa de sobrevida (5º do art. 77 da Lei nº 8.213/91, inserto pela MP).
Além do mais, não houve alteração na forma de cálculo da pensão para os dependentes dos servidores vinculados ao regime estatutário da União.
É verdade que a pensão por morte se trata de um benefício previdenciário que necessita ser revisto. Mas a revisão almejada, dentre outras medidas, consiste em negá-lo a quem não precisa, em casos como o dependente possui mais recursos que o segurado falecido e, mesmo assim, recebe-o.
Para um governo que se elegeu sob o argumento de que 'não mexeria em direitos sociais nem que a vaca tussa', essa medida provisória se apresenta, apenas, como o primeiro capítulo.
0 Comentários
Faça um comentário construtivo para esse documento.