Príncipio da proibição da insuficiência deve ser aplicado aos direitos sociais
No presente artigo, pretendo analisar a possibilidade de utilização do princípio da proibição da insuficiência como fórmula que pode contribuir para a concretização racional dos direitos fundamentais sociais. Para tanto, em primeiro lugar, investigo as principais dificuldades jurídicas — formais e materiais — que envolvem o Poder Judiciário no momento em que se defronta com demandas de natureza social. Num segundo passo, analiso os aspectos que compõem o princípio da proibição da insuficiência, articulando-os com os direitos sociais. Vamos a isso.
Desde a sua inserção nos textos constitucionais, os direitos fundamentais sociais (saúde, educação, trabalho e moradia, para ficar nos exemplos mais conhecidos) têm sido alvo de sérias e numerosas objeções, que têm origem nos mais variados territórios da teoria e da prática jurídica.
Essas objeções, segundo a pedagógica sistematização levada a cabo por Robert Alexy, podem ser classificadas em duas ordens de argumentos complexos: um de natureza formal, outro de natureza material[1].
I. Colisão de ordem formalDo ponto de vista formal, as objeções aos direitos fundamentais sociais, segundo correta advertência de R. Alexy, acabam por nos conduzir a um verdadeiro dilema, hoje bastante óbvio, para ser negado (explico) : ou se afirma, por um lado, que os direitos sociais são, à semelhança de qualquer outro direito fundamental, juridicamente vinculantes, e admite-se deslocar a competência (política) do legislador de implementá-los para a esfera da jurisdição (especialmente a jurisdição constitucional); ou, de forma diversa, se nega o caráter vinculante dos direitos fundamentais sociais, no sentido de que aplicáveis diretamente pelo Poder Judiciário, com a incômoda consequência de que os direitos fundamentais sociais representariam assim - negada a sua concretização direta pelos tribunais - uma clara violação ao princípio geral de que os direitos fundamentais são vinculantes e aplicáveis imediatamente (art. 5º, § 1º, da Constituição Federal), o que implica, obviamente, o direito de os indivíduos, quando necessário, demandarem a intervenção do Poder Judiciário (art. 5º, XXXV, da Constituição Federal).
Por maior que seja a importância dos direitos sociais e por mais relevante que seja o papel que se reserva ao Poder Judiciário na sua implementação, não se deveria – sem mais – desconsiderar a relevância dessa objeção de natureza formal. De fato, não obstante a expressa dicção constitucional[2], também no Brasil, a objeção formal ao caráter juridicamente vinculante dos direitos fundamentais, ao acentuar o papel preponderante do Poder Legislativo e da Administração, funda-se num argumento nada desprezível, ao sustentar que os direitos fundamentais sociais - por sua própria estrutura - não são “justiciáveis”, ou o são apenas em medida muito pequena, tudo por conta do seu conteúdo, que, não se pode negar, se mostra, na maior parte das vezes, acentuadamente indeterminado[3].
De fato, perguntam com alguma razão os críticos, concretamente, qual o conteúdo, por exemplo, de um direito fundamental à moradia, à educação, ou à saúde? Entre o nada e o tudo da concretização do direito à saúde, por exemplo, que pode ir da ausência completa da mais simples assistência à saúde do indivíduo ao mais caro tratamento que se possa fornecer - no Brasil e, como entendem alguns juízes, mesmo no exterior –, não se pode negar, prepondera uma indiscutível sombra de indeterminação.
Referindo-se especificamente ao direito social ao trabalho, Robert Alexy nos dá a exata medida da dificuldade de se determinar a extensão e a essência de seu âmbito de proteção. Pergunta-se o célebre pensador alemão:
O que é, p. ex., o conteúdo de um direito fundamental ao trabalho? A escala de interpretações imagináveis estende-se de um direito utópico de qualquer indivíduo a qualquer trabalho que ele queira, em qualquer lugar e a qualquer tempo, até a um direito compensatório a um auxílio-desemprego. Mas qual valor isso deve ter? Os problemas para os outros direitos fundamentais sociais não se apresentam de forma muito diferente. Mesmo para o mais simples direito fundamental social, o direito a um mínimo existencial (ein Existenzminimum), a determinação do exato conteúdo prepara algumas dificuldades[4].
Portanto, a objeção de ordem formal à “judiciabilidade” dos direitos fundamentais sociais baseia-se, em primeiro lugar, em u...
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